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A ESSÊNCIA

NA DUALIDADE DA EXISTÊNCIA HUMANA




JOSÉ CARLOS DE ARAÚJO ALMEIDA FILHO




        Rio de Janeiro – 2009
Dedicado a dois anjos que conheci em minha caminhada
Com grande e enorme carinho à pessoa que me fez escrever sobre a essência, porque
                                                    por causa dela, voltei à minha
quot;Se escrevo o que sinto é porque assim diminuo a febre de sentir. O que confesso não
       tem importância, pois nada tem importância. Faço paisagens com o que sinto.quot;

                                                Bernardo Soares (Fernando Pessoa)
A ESSÊNCIA

                        NA DUALIDADE DA EXISTÊNCIA HUMANA

               Os homens sempre tiveram a necessidade de classificar as coisas e as
situações. Sempre tiveram o desejo de materializar. Sempre houve necessidade de
explicação para tudo e para todos. O homem passa o dia explicando-se e tentando
explicar aos outros o que sente, o que pensa, o que existe e o que poderia existir.


               Desde a remota antiguidade, tudo era explicado e teorizado. Os deuses!
Estes deuses que são natureza, como o sol, a lua, o fogo, o trovão. Mais tarde, discute-se
a existência dos quatro elementos e a quintessência. Mas estamos distante de nós
mesmos quando começamos a atribuir aos elementos, ou aos outros, o que
verdadeiramente somos? E o que verdadeiramente somos?


               Somos fogo, água, ar, terra? Ou, na teoria da quintessência, o perfeito?
Somos isto tudo, nada disto, ou algo mais?


               Somos algo mais: somos essência. A água possui a sua essência, assim
como o fogo, a terra e o ar. Tudo na vida depende, única e exclusivamente, da essência.
E a essência não muda. Ela se altera. Ainda que os termos possam parecer semelhantes,
não são idênticos. Mudança significa a passagem de água para fogo e isto é impossível.
Modificação. Contudo, alteração significa passagem de água para vapor. E o vapor, por
sua vez, volta a ser água. Se congelada, a água se transforma em sólido, mas uma vez
derretida a pedra, volta a ser água. Assim, a essência não se modifica, ela se altera. Eu
posso alterar o sentido de uma frase, mas não posso modificar o sentido da mesma.


               Os quatro elementos, por exemplo, podem se transformar. Mas a essência
se modifica? Ou a essência se altera? A resposta parece simples, porque afirmamos
acima a impossibilidade da modificação da essência. Mas ela se transforma. A
mudança, para o que se pretende entender enquanto ser humano, é muito forte. A
transformação, por sua vez, não nos parece algo doloroso. Mesmo assim, na dualidade
da existência humana, podemos conviver com o mudar e o transformar.
Na Bíblia, em Eclesiastes 3:20, observamos a força da palavra, quando se
afirma que o homem veio do pó e ao pó voltará: “Todos vão para um lugar; todos foram
feitos do pó, e todos voltarão ao pó.”


               Forte a concepção de pó, porque admitimos, dentro da análise dos quatro
elementos, que a madeira, após o seu estado sólido, se queimada pelo elemento fogo,
que, por sua vez necessita do elemento ar para existir, transmuta-se ao pó. Há extrema
modificação. A simbologia bíblica é muito forte.


               Mas adotemos o pó como essência. E tentemos modificar a frase bíblica
para: todos vão para um lugar; todos têm sua essência, e todos retornam à sua essência.
A idéia do pó, diante do texto bíblico, está em Gênesis, 2:7: “E formou o SENHOR
Deus o homem do pó da terra, e soprou em suas narinas o fôlego da vida; e o homem foi
feito alma vivente.”


               O que seria, então, este pó, diante do Sopro Divino, senão a própria
essência? Essência se modifica? Transmuta-se? Como entender a nossa essência e o
nosso pensar de acordo com os dias que se passam? A questão se torna intrigante
quando ouvimos de alguém: - Você precisa mudar!


               Mas será que este alguém, que de forma tão categórica, afirma que eu
preciso mudar, também não precisaria? Ou será que ninguém tem o direito de fazer ou
tentar fazer com que o seu semelhante mude?


               Na verdade, a grande sabedoria reside no sentido de descobrirmos a
essência da pessoa e sabermos se é possível conviver com esta parte oculta. Quando
somos essência, não precisamos ser modificados, porque, adotando a teoria dos quatro
elementos, se sou água e me modifico, passo ao estado gasoso.


               Vejamos, por exemplo, a sociedade e os tempos modernos: a sociedade
continua sendo sociedade. Os sociólogos atribuem termos à sociedade e hora é da
informação, hora da informação tecnológica, hora apenas sociedade. Mas é sociedade.
E, se estamos tratando de sociedade tecnológica, pensemos como as relações se
modificam com a informação. Não muda, mas se transforma.
Se há timidez profunda em uma pessoa, porque esta é sua essência, com a
informática e a idéia de Cibercultura, é bem provável que esta pessoa consiga enviar
uma mensagem eletrônica para a pessoa amada, ou para um amigo, a fim de dizer o que
realmente sente. Ele não mudou sua essência de timidez, mas conseguiu, através de uma
ferramenta que lhe deram, dizer algo que não diria.


              Esta pessoa não deixou de ser tímida, mas conseguiu, de alguma forma,
demonstrar seus sentimentos. E precisamos entender a idéia de essência para
alavancarmos o pensamento que nos deixa tão inquietos: a mudança, a necessidade de
mudança, e a mudança que os outros querem ver em nós.


              Precisamos mudar?


              Esta é a questão mais complexa que devemos desenvolver. Qual a
necessidade de mudança? Por que precisamos ser “feitos à imagem e semelhança do
outro?” Não! Em verdade, precisamos descobrir a nossa essência.


              E por que o outro não nos aceita da forma como somos? Esta questão é
de suma importância. Se alguém deseja tanto que nos modifiquemos ou que sejamos
reprimidos em nossos sentimentos mais profundos, em verdade, não nos querem, mas
desejam um espelho. E não podemos ser espelho de ninguém.


              Mirar-se em alguém, seguir-lhe bons exemplos, admirar o próximo pelos
grandes feitos é uma forma saudável de comportamento. Invejar estas qualidades faz
parte de uma essência pouco vigorosa ou que se possa dizer bondosa. Mas, se
desejamos ser como o próximo, estamos abandonando a nossa essência.


              Deixamos, mesmo, de ser como a água e nos esquecemos de voltar ao
nosso estado natural. A beleza da vida consiste em sermos e estarmos em nosso estado
natural.


              Muitos relacionamentos não se desenvolvem ou se desgastam porque nos
tornamos espelhos, ou nos deixamos ser espelhos do companheiro ou da companheira.
Não podemos permitir que as pessoas tenham tanto domínio sobre nós e é por isto que a
separação e os descontroles nos lares se tornou uma coisa extremamente comum no
século XX. Não podemos ser “caramujos” de nossa própria existência e a imagem do
caramujo é porque ele se esconde na concha. Mas a concha se quebra.


              Se adotarmos a simbologia, talvez a mais forte seja a da Idade Média,
muito provavelmente por ter sido o período mais longo da história. E, como cavaleiros
medievais, nos encerramos em armaduras e elmos. Nosso corpo e nossa cabeça se
encontram tão encobertos que não temos a possibilidade de penetrarmos no mais íntimo
pensamento de nosso ser – a essência.


              Como damas da Idade Média, deixamos que nossas costelas sejam
quebradas para nos adaptarmos à moda. E sofremos com a dor, porque todos desejam
uma cintura mais fina.


              Os homens com suas armaduras, as mulheres sem suas costelas. Todos
perdidos em sua mais nobre essência, porque o pensamento do outro nos parece mais
poderoso que o nosso próprio sentir.


              E o sentimento faz parte da essência da mesma forma como a luz é a
fonte de todas as cores. Sem luz, não temos cor.


              A física, a química, a sociologia, enfim, as ciências nos mostram o quão é
importante a essência. Os alquimistas tentaram, por anos a fio, transformar metais em
ouro e não conseguiram. Mas nos deixaram o grande legado que é saber ser possível
transformar, mas jamais modificar. Um metal que nasce impuro, jamais brilhará como o
mais puro ouro.


              Se Alice não tivesse caído no país das maravilhas, talvez não tivesse a
oportunidade de viver em si toda a sua existência. Peter Pan nos mostra a necessidade
de sermos crianças.


              Deixemos de lado as “síndromes” e passemos a enfrentar as personagens
dos clássicos como retorno à essência. Ser uma Alice ou um Peter Pan, e se os dois se
unirem em essência, não se pode conceber problemas. Peter Pan pode crescer e Alice
pode descobrir que em seu mundo real existe algo de mágico.


                 A essência é a magia do ser, que flui de dentro do mais íntimo despudor
da existência humana. Quando Einstein relativizou o tempo chamaram-no de louco.
Despudor ou pudor, relativizados, são o equilíbrio perfeito na magia da grande mágica
que é o viver.


                 Assim como a água, por mais que nos modifiquem ou nos transformem
em espelhos sem qualquer forma de agir, ainda que nos façam Pinóquio, algum dia
enfrentaremos a realidade do mundo dos sonhos e retornaremos à essência. Pinóquio se
transforma em ser humano, Peter Pan cresce e Alice aprende a viver seu mundo mágico.


                 No balanço da vida, quando estamos prestes a não mais entender o seu
sentido, conseguimos força e retornamos à essência. A água nos faz viver, o fogo nos
aquece, o vento nos ameniza e a terra nos faz viver a realidade.


                 Podemos sonhar com o vento, sentir o fogo no breve espaço do amar,
beber da pureza da alma e viver do pó da terra. Podemos ser o que somos. Devemos ser
o que somos.


                 Devemos ser essência. E, enquanto essência, entender o por que de nossa
existência.


                      OS QUATRO ELEMENTOS E A VIVÊNCIA HUMANA
                                         A ÁGUA


                 Ergo logo sun. Bem, se penso, logo existo, existo porque existe uma
razão neste universo que se encontra ao nosso redor. Ao tratar dos quatro elementos,
concebemos a água como a maior fonte de vida. Enquanto fetos, vivemos embanhados
em água. Sem água, não sobrevivemos.


                 E a água nos parece a maior força para tratarmos da existência humana e
da essência. A essência... O que poderia ser a essência?
Assim como a água, podemos admitir a essência como pureza. Não que
não haja pessoas cuja essência seja ruim, mas ainda que se trate de ruim, é pura pela
própria natureza de essência. A pureza, aqui analisada, consiste no fato de ser algo
imanente ao ser humano em seu estágio mais primitivo.


               A essência poderá ser boa ou ruim. Não visualizamos a possibilidade de
modificação da essência, mas de seu aperfeiçoamento. E a água é um exemplo clássico
desta idéia.


               A água, em seu estado puro, é H2O. Já a água transformada em
oxigenada, sem que a fórmula essencial seja perdida, é H2O2. Houve uma transmutação,
mas não houve modificação na essência. A essência continua sendo H2O.


               A essência humana, contudo, apesar de parecer uma unidade, é
dicotômica e podemos concebê-la diante dos mitos e das metáforas. Para os românticos,
a unidade é a união perfeita, o encontro da alma gêmea. Mas não apenas!


               É preciso avançar na teoria da unicidade e entender a dicotomia sob o
símbolo ( ou mito) do duplo. A duplicidade própria de todo o ser humano e não existe
melhor simbologia para a explicação que o símbolo do TAO - ☯ -. Na dualidade
estamos vivenciando a própria unidade do ser. E não é de hoje que este conceito se
apresenta em nossas vidas.


               Retornando à Bíblia, em Gênesis, ainda que o antropomorfismo seja a
base de toda a narrativa bíblica, ou seja, o homem foi feito à imagem e semelhança de
Deus – e, aqui, cabe um hiato, porque se assim o foi o homem seria uno e não dual,
diante da religiosidade empregada na forte concepção da Santíssima Trindade (Pai,
Filho e Espírito Santo) -, também é certo que o homem foi dividido: “E Adão pôs os
nomes a todo o gado, e às aves dos céus, e a todo o animal do campo; mas para o
homem não se achava ajudadora idônea. Então o SENHOR Deus fez cair um sono
pesado sobre Adão, e este adormeceu; e tomou uma das suas costelas, e cerrou a carne
em seu lugar; E da costela que o SENHOR Deus tomou do homem, formou uma
mulher, e trouxe-a a Adão. E disse Adão: Esta é agora osso dos meus ossos, e carne da
minha carne; esta será chamada mulher, porquanto do homem foi tomada1.”


                   Ainda que feito a imagem e semelhança de Deus, o homem foi bipartido
e sua costela transforma-se em mulher. Na psique humana também vivenciamos esta
dualidade tão bem retratada no texto bíblico, porque animus e anima, nos arquétipos
jungianos, se completam, mas são duos. E da dualidade é que se pode conceber a
essência.


                   Conceber a essência e a dualidade é de grande importância, porque os
símbolos e os mitos nos fazem entender a personalidade e como podemos ser felizes se
deixarmos a verdadeira essência transbordar. Se em determinado momento de minha
vida me apaixono, parece que o medo da perda se faz presente. E, em assim agindo,
estou atribuindo ao outro a minha felicidade. O que não quer dizer que o outro, como
ser em essência possa ter elementos próximos ao meu e fazer-me feliz.


                   O que não posso é atribuir minha felicidade a quem quer que seja, a não
ser a mim. A partir do momento em que estou em essência, sou feliz e posso visualizar a
felicidade com a pessoa a quem desejo estar próximo. O medo, contudo, nos faz afastar
esta pessoa.


                   Para os românticos a questão está entre o amor e a morte. E a morte,
aqui, se apresenta como o medo de vivenciar experiências novas e mergulhar dentro de
nossa essência. Ainda que pareça um exercício de lógica, ao atribuir ao outrem a minha
felicidade, trabalho da seguinte forma: estou triste. Conheci Fulana e fiquei feliz. Então,
Fulana me faz feliz.


                   As premissas são tão falsas quanto a conclusão e a lógica não se
apresenta concebível na dualidade do ser. Para os românticos a morte tem o significado
de perda, mas podemos concebê-la como renascimento. Ousar, em determinadas
situações é tão saudável quanto recuar. Se eu temo algo que possa ser bom, com medo




1
    Gênesis, 3:20-23
de que venha a sofrer, estou vivenciando a plenitude da dicotomia humana: viver e
morrer – aqui de forma simbólica, apenas.


               Viver e morrer em determinadas situações não representa nada além do
que vivenciar o momento e deixar que o passado se afaste, de tal maneira que os
pensamentos ruins não nos abale mais.


               O casal que se encontra em núpcias parece começar o dia com juras de
amor e promessas de um sem fim. Mas tudo tem início, meio e fim. E o fim pode ser
concebido como término ou como finalidade, objetivo de se alcançar alguma coisa. Se o
meu fim é a idéia de perda, este medo se faz tão presente que acabo por perdê-lo. Se
tenho medo de vivenciar um grande e novo sentimento e deixo-o escoar pelas mãos,
nada mais estou fazendo do que deixar de sentir o que mais importante existe em mim
que é a essência da vida.


               Assim como a água necessita do oxigênio, todos os serem necessitam,
seja de forma real ou simbólica. Ainda que eu precise ser Alice no país das maravilhas,
ou Peter Pan na Terra do Nunca, eu sei que poderei encontrar um coelho ou uma fada.
Mas é preciso que eu não atribua ao coelho ou à fada a essência de minha felicidade.


               Viver! Sentir! Não se arrepender!


               São difíceis as ações, mas são necessárias.

               Oxigenar as relações... mas, se as relações não se oxigenam, deixamos de
lado a nossa essência e começamos a procurar no outro a fonte de vida que à ele não
pertence, porque somente pertence a nós. Estou feliz ao lado de alguém e não por causa
de alguém. Se assim eu pensar, não restam dúvidas que sou dual, mas não perdi minha
essência.

                     EMOÇÕES E SENSAÇÕES NA DUALIDADE DO SER

               A partir do momento em que percebemos nossa essência, não precisamos
temer o que somos. Não precisamos temer o que sentimos. Mas devemos estar atentos
aos movimentos provocados pelo sentir.
Entre a essência e o sentir existe um liame profundo e não raras às vezes
confunde-se o existir com a impulsividade. Mas o que seria impulsivo quando estamos
tratando de essência, de dual e de sentir?


                 Tentar pegar o telefone, ligar, falar horas? Controlar-se? Até que ponto
tem-se a idéia da impulsividade e distorção do verdadeiro sentir?


                 A essência, dual, por natureza, deve conviver com as idéias que nos
passam pela mente. E não podemos confundir sentimentos com neuroses2. Não afirmo
que exista total discrepância entre os dois, mas as neuroses são sentimentos destrutivos
(nem sempre, porque podem provocar sensações de conquista ou necessidade de
superação), ao passo em que o sentimento puro da essência, dês que boa, não é
destrutivo. E se o sentimento nasce da essência, ou se a essência reclama este
sentimento, então não podemos admitir haver algo de doente.


                 Podemos entender esta dualidade de sentimentos (neuroses não deixam
de serem emoções, e, por sua vez, sentimentos) como a água. Em determinado momento
nos prendem de tal forma que nos sentimos tão duros quanto o gelo. E somos obrigados
a conviver no ambiente transformado de nossa essência. Estou sólido, porque não me
permito. Estou duro, porque não me permito. Estou petrificado, porque não me permito.


                 Mas sinto!


                 Por outro lado, se deixar meu sentimento tomar conta de mim,
transformo-me em vapor e fico tão solto quanto as nuvens. É preciso entender a
essência e o meio termo.




2
  A neurose, na teoria psicanalítica, é uma estratégia ineficaz para lidar com sucesso com algo, o que
Sigmund Freud propôs ser causado por emoções de uma experiência passada causando um forte
sentimento que dificulta reação ou interferindo na experiência presente. Por exemplo: alguém que foi
atacado por um cachorro quando criança pode ter fobia ou um medo intenso de cachorros. Porém, ele
reconheceu que algumas fobias são simbólicas e expressam um medo reprimido.
Na teoria da psicologia analítica, de Carl Jung, a neurose resulta do conflito entre duas partes psíquicas,
das quais uma deve ser inconsciente.
Quando me sinto solto, diante de um sentimento – o amor, por exemplo -,
preciso identificar, em minha essência, se estou solto porque sou solto, ou porque
alguém me soltou. Ora, se alguém me soltou, é certo que esta não é minha essência, mas
um momento etéreo e que se perde se o vapor não retornar ao seu estado natural que é a
água. Por outro lado, se o sentir é petrificante, estou encarcerado.


               A idéia da essência é exatamente olhar para dentro de cada um de nós e
entender o que se passa, sem que possamos admitir tratar-se de impulsividade, neurose,
ou qualquer outro rótulo. Posso, neste momento, sentir-me Peter Pan ou Alice. O preço
devo avaliar e pagar pelo mesmo, mas não conseguirei fugir da minha essência.


               Ouvindo uma música da Shakira, pude perceber a idéia de essência,
quando o coração está à flor da pele e o sentimento não se confunde com impulsividade:


               Para amar-te necessito uma razão, e é difícil crer,
               Que não existe nada mas, que este amor
               Sobra tanto, dentro deste coração,
               Que apesar do que dizem, que os anos são sábios,
               Ainda se sente a dor,
               Porque todo o tempo que passei junto a ti,
               Deixo tecido seu fio dentro de mim


               A poesia permite estas licenças, quando a razão de ser convive na outra
pessoa. E a poesia é um dos maiores fenômenos de vida, de viver, de sentir. Poesis é
criação, e, como tal, deve ser entendida como pura essência. Mas nem sempre a poesia,
com suas licenças, nos deixarão compreender a essência. Se “quando não existe mais
nada que este amor”, a vida deixa de ter sentido e deixamos de lado a nossa essência.


               Sem dúvida, melancólica e bela a poesia, mas não pode ser entendida
como viver a essência.


               Agora, a partir do momento em que somos detentores de fortes emoções,
a impulsividade está presente. Contudo, uma diferença entre sentir e ser impulsivo é
preciso. Se o amor se deixa estar no outro, posso, até, admitir existir impulsividade. Mas
se sinto, porque sou eu quem está sentindo, ou minha essência está sentindo, espero
enviar ao outro este sentimento e que ele sinta sem que a minha emoção interfira na
dele. Não é impulsividade, mas verdadeiro sentir: não dependo dele, mas gosto de estar
com ele.




              Não é preciso ir muito além para tentar imaginar qual foi a sua primeira
sensação ao analisar a foto... Mas não vamos parar por aqui...
QUAIS FORAM SUAS SENSAÇÕES?
VONTADE DE ESTAR NESTE LUGAR?


              Tente, de alguma forma, interpretar as imagens, seus sentimentos, suas
emoções. Tente, de alguma forma, misturar a vontade de estar, com o impulso de estar.
Sinônimos, sem dúvida, mas não termos idênticos. E, quando estamos diante de
essência, não podemos tratar de sinônimos ou assemelhados, mas de essência.


              Mas, mesmo o impulso pode ser produtivo, porque:
IMPULSO = DESEJO = REALIZAÇÃO


              Mas é preciso pensar nas conseqüências e avaliá-las. Eu admito que a
avaliação está na essência. Sim... em um primeiro momento posso estar dominado pelo
impulso, que se transforma, imediatamente, em desejo. Posso reprimir, como o gelo,
posso liberar, como o vapor. Mas se unir impulso, com desejo, na minha essência, o que
tenho é realização. Em outras palavras: medi as conseqüências e optei pelo que me
deixa, realmente, feliz, e não o que me deixa acomodado.




                                       O FOGO


                 PODE ALGUÉM RESGATAR A SUA ESSÊNCIA?


              Sim? Não? Não sei?


              O fogo é elemento de força e vida. Assim como a água e os demais
elementos, o fogo é intenso e vivo.
O fogo, enquanto análise da essência, reporta-nos, de alguma forma, à
Phoenix. E não há um símbolo tão profundo quanto a Phoenix, se estamos tratando de
essência. Às vezes é preciso morrermos, pelo fogo, para voltarmos à essência e darmos
de alimentar aos filhos.
A Phoenix renasce das cinzas!


                   Apocalíptica imagem, a Phoenix reside em cada um de nós enquanto
essência. Quando não deixamos nossa essência ser dominada, ou, ainda que adormecida
por sermos obrigados a escutar verdades que não são nossas, é da imagem do fogo e de
sua transformação em pó que podemos reconstruir o Sopro Divino que reside em nós.


                   Através do mito da Phoenix, descobrimos que ela se reproduz sem
qualquer ato sexual, ainda que o fogo possa ser um grande símbolo da sexualidade,
porque sempre existirá apenas uma ave. E é admissível, porque se ela renasce das
cinzas, somente uma Phoenix pode existir.


                   E qual a grande simbologia entre Phoenix, Fogo e Essência? A unidade.
Ainda que a existência seja dual, por natureza, a essência, envolta nesta dualidade,
necessita, sempre, estar à mostra. Precisa apresentar-se. Encolhida pelo fogo, por
diversas vezes; escondida pela perversidade daqueles que não podem admitir o
crescimento; adormecida sobre o leito perverso da solidão...


                   Mas a essência renasce. E, como pelo fogo foi extirpada, pelo mesmo
fogo, ungida em água, símbolo de purificação, renasce a ave bela, que viaja por tempos
e caminhos longínquos, mas sempre tão perto de nós que não conseguimos visualizar:
esta é a nossa essência.


                   Escondida! Perdida! Adormecida!


                   A Phoenix é uma presença nas religiões. A mitologia e a simbologia,
muitas vezes, são desperdiçadas, porque as pessoas tendem a admitir serem pagãs. Mas
não são. A idéia da Phoenix, por exemplo, pode ser concebida no Cristianismo como a
ressurreição de Cristo, porque cada alma justa é uma Phoenix3.


                   Quando passamos a conceber o mito como análise e alegoria do viver,
temos no fogo a expressão do calor e da vida plena. Phoenix, segundo Brunel, afirma


3
    BRUNEL, Pierre. Dicionário de Mitos Literários. José Olympio, RJ: 1988
que “não fazem parte da história da fênix pecados ou castigos. Nada de provas a serem
vencidas, a não ser uma única que talvez pudesse ser qualificada de glorificante: a morte
que irá resultar em ressurreição. A unicidade da fênix, sua beleza, sua privilegiada
ligação com o Sol, fonte de vida, tudo se congrega para dar-lhe qualidades positivas.”


              E o que esperamos da essência, senão a vivência em unicidade conosco?
Admirar a beleza do Sol? Viver plenamente? Se morrermos, em determinado momento
de nossa vida, morte emocional embotada pelos sentimentos daqueles que em nada nos
acrescentam e até sentem prazer em destruir o que de bom possuímos, será pelo fogo da
vida, pela cinza – porque do pó veio e ao pó retornarás – que seremos sempre nós! E,
quando somos nós, somos essência.


              A essência não se destrói, porque sua força é tão bela e forte com a ave
que sobrevoa mundos distantes, em mito, em sonho, mas que nos traz, sempre, de volta
à nossa bela e imaginável origem.


              Afinal de contas, nascemos para ser felizes!
ENTRE A ÁGUA E O FOGO
           COMO ENTENDERMOS A NECESSIDADE DE MUDAREM A NOSSA ESSÊNCIA?


                Quantas vezes não ouvimos que precisamos mudar? Nossa estima se
perde quando ouvimos esta frase a partir do momento em que a admitimos como
verdadeira, ou seja, que precisamos mudar.


                Estamos entre o fogo e a água quando uma frase desta é proferida. Mas
se admitimos a essência, não precisamos nos modificar. Não precisamos ser feitos à
imagem e semelhança do outro. Mas podemos, sim, respeitar o outro e conviver com
seus defeitos e qualidades.


                Na dualidade do ser, somos a Lua e seu lado negro. Precisamos conceber
nossa dicotomia nesta existência e aprendermos a lidar com nossos lados: o melhor e o
pior de nós. Aceitar que somos fortes e fracos, bons e maus, saudáveis e doentes. Todos
somos um misto de água e fogo, terra e ar. Mas não somos rótulos. Não somos passíveis
de modificação em essência. Não pertencemos ao próximo, mas queremos estar ao lado
de alguém.


                Heidegger, um dos mais complexos filósofos do Séc. XX, admitia esta
essência do ser. Para Heidegger4 o humanismo é a grande chave. E quot;que as mais altas
determinações humanísticas da essência do homem ainda não experimentam a
dignidade propriamente dita do homemquot;5. Neste texto o que se pretende demonstrar é
que a humanidade é dotada de uma essência, sem que haja necessidade de ser rotulada.


                O ser humano, em sua essência, busca a verdade: a sua verdade! E não
nos compete atribuir a este sentir uma denominação ou um rótulo. O preconceito
existente no mundo ocidental moderno, muitas vezes, proporciona um afastamento do
homem de sua essência. Alguns exemplos, que envolvem sentimentos, podem ser bem
explicados:
4
  HEIDEGGER, M. Introdução à Metafísica; trad. Emmanuel C. Leão. - Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, 1987.
____________, _. quot;Sobre o Humanismoquot;, in Conferências e Escritos Filosóficos; trad. Ernildo Stein. -
São Paulo: Abril Cultural, 1983.
5
    Idem
- uma pessoa que casou mais de uma vez não pode ser uma boa pessoa;
- é preciso doar-se, integralmente, para ser feliz;
- no casamento, no namoro, no amor, enfim, é preciso apagar parte de seu ser.


               São frases feitas, verdadeiros clichês, que devem ser analisados, sob pena
do ser humano ficar tão preso a uma falsa essência, que sequer conseguirá livrar-se das
garras de sua própria existência (ou inexistência). A partir do momento em que
deixamos nossa essência passamos a viver na inexistência. E, neste ponto, lembra-me
Nietzsche, que admite a niilidade. Heidegger não fica atrás, já que a idéia é
contemporânea.


               A niilidade de Nietzsche, assim como a de Heidegger, apesar de seu
humanismo, não podem ser concebidas como a perda da essência. Antes de analisarmos
os três nortes de preconceito lançados, porque não se resumem, apenas, a eles, mas que
servem de base para a compreensão da existência da essência, será necessário
entendermos o ponto nodal da filosofia moderna:


                       “Uma filosofia que não tenha em si qualquer princípio passivo; uma
                       filosofia que especula sobre a existência sem tempo, sobre a existência
                       sem duração, sobre a qualidade sem sensação, sobre o ser sem ser, sobre
                       a vida sem vida, sem carne e sangue – uma tal filosofia, como a
                       filosofia do Absoluto em geral, tem necessariamente como seu
                       contrário, na sua unilateralidade plena, a empiria.
                       Espinosa fez da matéria um atributo da Substância, não porém como um
                       princípio de afecção, mas justamente porque ela não sofre, porque é
                       única, indivisível e infinita, porque possui exactamente as mesmas
                       determinações que o seu contrário, o atributo do pensamento, em suma,
                       porque é uma matéria abstracta, uma matéria sem matéria, da mesma
                       maneira que a essência da lógica hegeliana é a essência da natureza e do
                       homem, mas sem essência, sem natureza, sem homem.6
                       (...)
                       A verdadeira relação entre pensamento e ser é apenas esta: o ser é
                       o sujeito, o pensamento o predicado. O pensamento provém do
                       ser, mas não o ser do pensamento. O ser existe a partir de si e por
                       si – o ser é só dado pelo ser. O ser tem o seu fundamento em si
                       mesmo, porque só o ser é sentido, razão, necessidade, verdade,
                       numa palavra, tudo em todas as coisas. – O ser é, porque o não ser
                       é não ser, isto é, nada, não-sentido. A essência do ser enquanto ser é


6
 Ludwig Feuerbach – teses provisórias para a revolução da filosofia (1842) -
http://www.lusosofia.net/textos/feuerbach_teses_provisorias_de_reforma_da_filosofia.pdf
a essência da natureza. A génese temporal estende-se apenas às formas,
                      não é essência da natureza.”


               A frase “o ser existe a partir de si e por si – o ser é só dado pelo ser” deve
ser destacada porque nela reside a idéia de essência e da própria dualidade da
existência humana. Entre o bem e o mal vivemos todos, mas a ética, a verdadeira ética,
como conhecida pelos filósofos, deve ser concebida a partir do ponto em que somos. E
nada seremos se perdermos a essência.


               Quando afirmamos que uma pessoa não pode casar mais de uma vez,
concebemos um pré-conceito muito grande. Os mitos, os símbolos, estão de tal forma
inseridos em nosso ser, que a ritualística do casamento se faz marcante em nossas vidas.
O vestido, a impossibilidade de o noivo ver a noiva antes do sacramento, enfim, são
diversas concepções que não nos permitem a morte do rito. Mas se Nietzsche matou
Deus – e aqui precisamos entender a idéia da niilidade e os conceitos filosóficos -, por
que não se pode ser essência?


- UMA PESSOA QUE CASOU MAIS DE UMA VEZ NÃO PODE SER UMA BOA PESSOA


               Será? Por que a sociedade nos cobra de forma tão audaciosa e insensata a
niilidade do ser?


               Por que será que somos obrigados a misturar em nossa essência as frases
feitas? Não quero, sob qualquer hipótese, admitir a existência sem a essência. Mas
também não estou afirmando, aqui, que devemos agir pelo simples agir. Na moral e na
ética não se encontram tamanhas proibições.


               Se a essência do meu eu não coincidir com a essência do seu eu, o que
acontece é a idéia de que água e fogo podem conviver sem que um interfira no outro. E
isto é impossível, pelo menos, por enquanto. A partir do momento em que analisamos a
concepção de existência e essência sob o ponto de vista de não interferência, afirmo que
é impossível água e fogo estarem juntos. A água tentará, de qualquer maneira, apagar o
fogo. O fogo, por sua vez, tentará de qualquer maneira evaporar a água. Faz parte da
essência destes elementos.
Mas água e fogo podem conviver pacificamente, a partir do momento em
que têm consciência de que suas essências são diversas e que uma pode completar a
outra, dependendo da ocasião e da maneiras como interagem.


              Se um casamento não deu certo, é porque a água tentou, de alguma
forma, transformar o fogo em água, ou vice-e-versa. Pretendeu-se modificar a essência,
ao invés de com ela conviver e transmutar-se.


              A idéia de modificação do ser conduz à total falta de sentimento. A falta
de sentimento conduz à inexistência do próprio ser. A inexistência conduz à morte
(simbólica, ao menos).


              A manutenção de relacionamentos fracassados conduz à total
inexistência. Conduz à perda da essência. E não se pode atribuir culpa. Culpa, aliás, é
um grande mal da civilização. Somos temidos e sofremos temores. Por que a
necessidade de sermos tidos e concebidos com culpas e medos? Os preconceitos nos
fazem temer e ser temidos.


              Mas a essência não precisa do medo para sobreviver. A essência
necessita, ao contrário, da chama viva. E se por algum motivo uma pessoa tenta por
dezenas de vezes encontrar o par perfeito, a sua alma gêmea, ser feliz, por que taxar-lhe
de incompetente no casamento? Se for homem, a sociedade, de uma certa forma,
perdoa. Mas se estamos falando de uma mulher, os mais variados adjetivos lhes serão
imputados.


              É, então, preferível manter um relacionamento para que a sociedade não
nos crucifique (e, aqui, temos outro símbolo de enorme grandeza, que é a cruz), a
vivenciarmos e experimentarmos a nossa essência.


              Mas não podemos deixar de avaliar as conseqüências, porque enquanto
essência não podemos agir por condicionamentos. Devemos avaliar, sempre, a nossa
postura. O que não podemos é chegar ao ponto da anulação da felicidade.
Imaginemos, então, que vivemos mundos paralelos! Suponhamos que as
máquinas dominam a humanidade, com o avanço tecnológico e estamos aqui e em outro
lugar, simultaneamente. Admitamos, para fins de compreensão, que é possível viver em
mundos paralelos, simultaneamente. Temos, aqui, uma idéia de essência e dualidade.


                 Eu posso estar vivendo neste mundo, aonde as letras são escritas desta
forma, mas posso estar, ao mesmo tempo, no etéreo, ou em outro mundo, tendo as
sensações do meu outro ser, que carrega em si a mesma essência. E convivo,
bilateralmente com estas idéias. De um lado de minha existência estou triste, porque
desejam modificar minha essência, mas o meu outro ser, de tão feliz que se encontra,
provoca-me uma sensação de retornar à origem.


                 Em mundos paralelos eu posso admitir a possibilidade de novas regras e
novos conceitos. E posso admitir que existo por existir e minha essência é a mesma em
qualquer mundo em que viva. Tenho a nítida sensação de poder estar vivendo mundos
paralelos de forma ampla. Então, como necessito de um rótulo, não tenho a menor
dúvida que serei taxado de psicótico7.


                 Criaram-me um rótulo porque pretendo admitir a existência do ser em
sua dualidade, entre o bem e o mal, entre o ser e o não ser, entre o existir e o não existir.
A essência... Esta a palavra mestra para podermos conceber nossa visão de universos
paralelos dentro de nosso próprio ser e eliminar, de alguma forma, a idéia de que não
podemos ser felizes.


                 Em um mundo paralelo posso sentir-me culpado de um lado e feliz de
outro. A minha dualidade permite-me os dois sentimentos. Mas é certo que não posso
conviver com esta dualidade no mundo físico em que me encontro. Uma digressão entre
o ser e o estar é preciso. Eu posso ser feliz sentindo-me culpado? Mas se estou feliz e



7
  Psicose é um termo psiquiátrico genérico que se refere a um estado mental no qual existe uma quot;perda de
contacto com a realidadequot;. Ao experienciar um episódio psicótico, um indivíduo pode ter alucinações ou
delírios, assim como mudanças de personalidade e pensamento desorganizado. Tal é frequentemente
acompanhado por uma falta de quot;críticaquot; ou de quot;insightquot; que se traduz numa incapacidade de reconhecer o
carácter estranho ou bizarro do seu comportamento. Desta forma surgem também dificuldades de
interacção     social   e    em     cumprir   normalmente       as   actividades    de     vida   diária.
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Psicose>
me culpo? Por que é preciso matar o meu sentimento de felicidade pela atrocidade da
culpa?


               Não tenho a menor dúvida que é pelo rótulo. Mas retorno ao meu mundo
paralelo e vivo essências diversas, com pensamentos e sensações diversas. Culpado...
Feliz... Estou, sim, culpado, porque não tive a coragem de manter um casamento que
não deu certo, porque a sociedade me impõe uma neurose coletiva. E se posso estar em
um mundo paralelo, por que não posso admitir a psicose daqueles que me rotulam?
Quem será mais louco que eu nesta existência dual?


               Por outro lado, estou feliz! E querem arrancar-me esta felicidade em
detrimento da própria sociedade psicótica! Os rótulos são para a média das pessoas e
nem todos os doentes precisam estar doentes. No meu mundo paralelo, não estou
doente, porque estou feliz. Mas em meu mundo real, estou doente pela tristeza causada
pela culpa.


               Meu casamento não deu certo, então não posso ser uma boa pessoa e não
tenho o direito de tentar, e tentar e tentar... Então, que fique a culpa!


               A essência não admite a culpa por esta razão, como não admite a
existência de mundos paralelos. A essência admite a verdade do meu sentimento e da
vontade de extirparem-se os rótulos e as mágoas que os mesmos geram.


               A essência procura a felicidade. E, quando se está diante de tamanho
preconceito, a impossibilidade de sermos felizes, ainda que os relacionamentos não
estejam tão perfeitos, nada melhor que Coríntios. Como dito antes, a Bíblia é profunda e
forte em suas palavras e símbolos.


                                   1 Coríntios 13
  Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse amor, seria
1
  como o metal que soa ou como o sino que tine.
  E ainda que tivesse o dom de profecia, e conhecesse todos os mistérios e toda a
2 ciência, e ainda que tivesse toda a fé, de maneira tal que transportasse os montes, e
  não tivesse amor, nada seria.
3 E ainda que distribuísse toda a minha fortuna para sustento dos pobres, e ainda que
entregasse o meu corpo para ser queimado, e não tivesse amor, nada disso me
   aproveitaria.
   O amor é sofredor, é benigno; o amor não é invejoso; o amor não trata com
4
   leviandade, não se ensoberbece.
   Não se porta com indecência, não busca os seus interesses, não se irrita, não suspeita
5
   mal;
6 Não folga com a injustiça, mas folga com a verdade;
7 Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.
   O amor nunca falha; mas havendo profecias, serão aniquiladas; havendo línguas,
8
   cessarão; havendo ciência, desaparecerá;
9 Porque, em parte, conhecemos, e em parte profetizamos;
10 Mas, quando vier o que é perfeito, então o que o é em parte será aniquilado.
   Quando eu era menino, falava como menino, sentia como menino, discorria como
11
   menino, mas, logo que cheguei a ser homem, acabei com as coisas de menino.
   Porque agora vemos por espelho em enigma, mas então veremos face a face; agora
12
   conheço em parte, mas então conhecerei como também sou conhecido.
   Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e o amor, estes três, mas o maior destes é
13
   o amor.



- É PRECISO DOAR-SE, INTEGRALMENTE, PARA SER FELIZ;


              A doação faz parte do ser humano. Não tem como não admitirmos a
doação. A essência se doa. Mas qual o limite da doação?


              O limite da doação está na doença da essência. Quando a essência
adoece, de nada adianta a doação, que se transformará em um grande e imenso vazio da
existência. Nada de dual: apenas o ser em sofrimento. A doação pode ser pura, mas
pode ser fruto de egoísmo. Entender o dual, na essência, é a grande chave para a
conquista do que concebemos como felicidade.


              Para amar, para sentir, é preciso conceber a essência e aprofundar-se no
seu mais puro sentido. É preciso saber viver a essência. Quando se doa, apenas por doar,
ou na intenção de querer fazer outra pessoa bem, não se está doando, mas necessitando
de aplauso e não se está diante da pura essência do ser humano.


              Muitas vezes a doação é um duplo egoísmo: para conosco e para aquele a
quem doamos, porque esta se transformará em cobrança futura.
A essência não precisa de aplauso externo. Nós precisamos nos conhecer
de tal maneira, que os argumentos e sensações externos não afetem o verdadeiro ser.
Quando deixamos que os outros afirmem sermos desta ou daquela maneira, criamos um
laço simbiótico a ponto de anularmos o nosso verdadeiro ser. E quando assim deixamos
os outros agirem, estamos permitindo que a essência seja perdida. A conseqüência será
a necessidade de aplauso e reconhecimento externo.


              O reconhecimento deve partir de nós. Devemos estar bem conosco e
descobrir nosso verdadeiro EU para a felicidade brotar. A felicidade não está em poder
de ninguém. A felicidade está na realização da essência e do sentir. O verdadeiro sentir.


              O externo, as sensações que nos transmitem, a necessidade que temos de
deixar o outro afirmar sermos assim ou daquele jeito, mata a beleza do existir humano.
Quando não precisamos mais do aplauso daquela pessoa, ou de quem quer que seja,
estamos vivendo a nossa existência em sua plenitude. Estamos deixando que brote de
nosso interior a maior beleza do universo: a doação plena pelo amor e não a doação por
doar.


              Quando a doação frutifica do mais puro sentimento, não há cobrança.
Mas quando a doação se faz quando precisamos dos aplausos, podemos esquecer que a
bilheteria do teatro da vida não foi suficientemente farta para nos alimentar. E quando
não se consegue uma casa cheia, o espetáculo não tem sentido.


              A essência, plena, doa sem necessitar retorno. Mas o doar para fazer o
outro feliz é o maior erro que se pode cometer, porque estamos afugentando a platéia da
vida. E nesta platéia existem espectadores que não podem sofrer pelo egoísmo de
alguém que nada entende de arte e apenas sentou-se em uma das cadeiras para poder
vaiar.


              O resumo da doação: cumplicidade. O resumo do egoísmo: morte da
essência. A verdadeira intenção: participar do espetáculo da vida e se alguém desejar
assistir o nosso desenvolvimento no palco, que a vaia não nos afete!
Na oração de São Francisco verificamos uma autopoeisis fantástica, que
resume a idéia de doação e felicidade:


Senhor, fazei-me instrumento de vossa paz.
Onde houver ódio, que eu leve o amor;
Onde houver ofensa, que eu leve o perdão;
Onde houver discórdia, que eu leve a união;
Onde houver dúvida, que eu leve a fé;
Onde houver erro, que eu leve a verdade;
Onde houver desespero, que eu leve a esperança;
Onde houver tristeza, que eu leve a alegria;
Onde houver trevas, que eu leve a luz.
Ó Mestre, Fazei que eu procure mais
Consolar, que ser consolado;
compreender, que ser compreendido;
amar, que ser amado.
Pois, é dando que se recebe,
é perdoando que se é perdoado,
e é morrendo que se vive para a vida eterna.


              Estamos todos à procura da paz. E São Francisco propõe-se ser este
grande mensageiro de amor e paz. Dispõe-se a falar de amor, como os anjos. Propõe-se
eliminar a discórdia. Quando passei a sentir a oração de São Francisco, e deixei de
tentar entendê-la – porque arte não se entende, se sente -, vi que a autopoiesis da mesma
é verdadeira e plena. E não há em seu contexto uma sofrer para que o outro seja feliz.
Existe, ao contrário, um mergulho na essência.


              Se dou, receberei. E, se recebo, acabo doando. Amo, mas serei amado.
Perdôo e serei perdoado. Ao morrer, para viver a vida eterna, posso sentir esta parte da
oração como morte física ou emocional. E, em qualquer que seja a hipótese, será através
da paz, do amor, do perdão, da LUZ, que terei a essência de meu ser. Quero muito amar.
Mas é preciso dar amor para ser amado. Então, amo!
E amo sem esperar nada em troca. Sou, então, amado. Eu dou sem querer
receber, então recebo.


              Este milagre da vida é imperceptível, mas é de enorme profundidade. Na
autopieisis eu não posso admitir inputs e outputs. Ao contrário, a vida é gerada por ela
mesma. A teoria biológica de Humberto Maturana e Francisco Varela afirma que o
organismo vive circularmente, ou seja, por ele e através dele, sem que se possa admitir a
inserção de qualquer elemento estranho a interagir no corpo humano. A teoria avançou
de tal forma, que no Direito se estuda o sistema autopoiético.




              Poesia tem seu radical em poesis. E, poesis é criação. Autopoiesis é auto-
criação. É a essência do ser. Vivo porque vivo! A frase, em si, é autopoiética. Fui criado
e mantenho-me em criação.


              Este circular de nossas vidas é que nos faz entender a essência. De que
adianta, por exemplo, um perfume sem essência? De nada! Trata-se de álcool com água.
E ambos evaporam-se. Mas a essência permite que se dê odor.


              Diante desta concepção autopoiética da oração de São Francisco,
concebemos a essência como amor, poesia e sentimento.


              Não se pode deixar morrer a essência pela doação impensada, ou pelo
egoísmo desenfreado. O egoísmo reside na perda de contato com a essência. Então
podemos admitir que existe o auto-egoísmo quando pensamos mais nos outros do que
em nós mesmos. Muito poderão afirmar que esta frase é egoísta!


                 Einstein revolucionou o mundo com a sua teoria da relatividade8. Ao
desenvolver a teoria da relatividade, Einstein consegue provar que a relação entre
espaço e tempo não é de tal maneira imutável, quanto antes se admitia. Espaço e tempo
são relativos.


                 Para entendermos esta concepção de relatividade, imaginemos que
estamos dentro de um avião, sem saber que lá estamos. Não temos a idéia se nossos pés
se encontram em solo firme ou não. Mas é certo estarmos a mais de 10.000 metros de
altura. Relatividade!


                 Analisando a Biologia de Maturana e Varela e a Física de Einstein,
quando penso em mim não estou sendo egoísta. Quando penso no outro, estou sendo
egoísta. A partir do momento em que deixo de pensar em mim, sequer estou pensando
no outro. Anulo-me para fazer o outro feliz. A concepção ocidental moderna afirmará
que esta é a forma correta de viver: pensar no outro. Mas como conceber o pensar no
outro anulando minha essência?


                 A conseqüência é a imensa tristeza e a morte simbólica de minha
essência. Esta morte poderá ser perpétua se não conseguir olhar internamente e
descobrir minha essência. Então, se não penso em mim, não enxergo a essência e estou
sendo profundamente egoísta. A poesis perdeu-se. Perdendo-se a poesis, não posso,
sequer, admitir a autopoiesis. A poesia se foi. A criação se perdeu nela mesma. E então
tenho uma autopoeisis destrutiva: mato-me e acabando anulando tudo à minha volta.


                 O egoísmo como forma de atribuir aos outros a nossa insegurança é o
maior erro da concepção ocidental moderna. Somente serei egoísta se não amar minha
8
  Em Física, a relatividade geral é a generalização da Teoria da gravitação de Newton, publicada em
1915 por Albert Einstein e cuja base matemática foi desenvolvida pelo cientista francês Henri Poincaré. A
nova teoria leva em consideração as idéias descobertas na Relatividade restrita sobre o espaço e o tempo e
propõe a generalização do princípio da relatividade do movimento de referenciais em movimento
uniforme para a relatividade do movimento mesmo entre referenciais em movimento acelerado. Esta
generalização tem implicações profundas no nosso conhecimento do espaço-tempo, levando, entre outras
conclusões, à de que a matéria (energia) curva o espaço e o tempo à sua volta. Isto é, a gravitação é um
efeito da geometria do espaço-tempo. < http://pt.wikipedia.org/wiki/Teoria_Geral_da_Relatividade>
essência. Serei, sim, egoísta, se fizer algo pelo próximo, sem admitir o alto preço que
pagarei, porque, desta forma, estarei cobrando do outro o meu ceder.


              E esta é a gênese da oração de São Francisco:
Ó Mestre, Fazei que eu procure mais
Consolar, que ser consolado;
compreender, que ser compreendido;
amar, que ser amado.
Pois, é dando que se recebe,
é perdoando que se é perdoado,
e é morrendo que se vive para a vida eterna.


              Compreender: sou eu quem compreendo e não o próximo.
              Amar: sou eu quem amo.
              Dando: sou eu quem dou.
              Perdoar: sou em quem perdôo.


              E, desta forma, tudo faço sem egoísmo. Compreendo minha essência,
para amar e dar. Quando compreendo minha essência, perdôo sem que haja uma futura
cobrança.


              Então, a partir do momento em que penso em mim enquanto essência e
até em que ponto posso doar-me, não estou sendo egoísta, mas altruísta.


              Luís de Camões mostra-nos a autopoesis do amor em seus versos. E não
existe amor maior que o amor à essência.


Amor é fogo que arde sem se ver

Amor é fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer;

É um não querer mais que bem querer;
É solitário andar por entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É cuidar que se ganha em se perder;

É querer estar preso por vontade;
É servir a quem vence, o vencedor;
É ter com quem nos mata lealdade.

Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?

                Luís de Camões

              Não tente compreender. Apenas sinta!

                                                                O TRÁGICO DILEMA

     “Quando alguém pergunta a um autor o que este quis dizer, é porque um dos dois é
                                                                             burro.”

                                                                          Mario Quintana



- NO CASAMENTO, NO NAMORO, NO AMOR, ENFIM, É PRECISO APAGAR PARTE DE SEU SER.


           E estabelecerei a minha aliança entre mim e ti e a tua descendência depois de
Gênesis
              ti em suas gerações, por aliança perpétua, para te ser a ti por Deus, e à tua
17:7
                                                               descendência depois de ti.




              Ao casarmos criamos uma aliança com a pessoa amada. E aliança é
união. União é compartilhar. Compartilhar é trocar. A essência pode ser transformada,
mas jamais modificada. Casamento não é mudança, mas transformação. Quando esta
química não existe, não se pode falar em aliança.


                   Desta forma, não se pode conceber a morte ou modificação da essência
pelo casamento. A palavra-chave é cumplicidade. E cumplicidade é entender e aceitar
as mutações de cada um. Admitir que fogo e água podem se misturar sem que um anule
o outro, mas que promovam transformações saudáveis. Se o vapor e o gelo são
necessários, dependendo da situação em que nos encontremos, assim deve ser o
casamento: uma alquimia!


                   Mas nem sempre este sonho se consegue realizar, porque no casamento
temos a idéia do egoísmo impregnada. Temos a exata sensação de que devemos nos
anular, em benefício do outro. E esta não é a essência. Se um dos dois se anula, a
conclusão será uma progressão geométrica: anulação vezes anulação. Não se trata de
uma simples progressão aritmética!


                   A anulação é de tal forma prejudicial à essência que a anulação de um
provoca uma reação em cadeia de extrema anulação da própria aliança. E assim vai até a
extinção total do casamento e dos pactos que se firmaram de juras e promessas.


                   Mas como manter um relacionamento já impregnado pelas anulações?
Será possível?


                   Tudo é possível. Para Fernando Pessoa, “tudo vale à pena quando a alma
não é pequena”. E, como essência e poesia têm muito em comum, Fernando Pessoa, ou
Alberto Caeiro9, demonstram a dualidade da essência:


O poeta é um fingidor,
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.




9
    Pessoa foi um gênio. Entre seus pseudônimos conseguia traduzir diversas formas de pensar.
Fernando Pessoa


Ser poeta não é uma ambição minha.
É a minha maneira de estar sozinho


              Alberto Caeiro


              Em Fernando Pessoa temos a idéia do poeta, que de tão profundo,
consegue mentir a sua dor. O mesmo pessoa, com o nome de Caeiro, justifica a busca da
essência, porque nada melhor que estar sozinho para poder fazer parte da criação.


              E o casamento, muitas vezes, não permite este estar sozinho. É o egoísmo
dado. O egoísmo de olhar o outro e para o outro, esquecendo-se de olhar para nós. O
auto-egoísmo. Na aliança o que se pretende é a união. Mas o doar-se, integralmente,
fruto de um pensamento ocidental extremamente massacrante e doentio, nos faz viver
em função de, e não em função para.


              Quando vivemos em função de, estamos vivenciando a plenitude da
inexistência. Quando vivemos para, ou em função para, caminhamos lado a lado e esta é
a essência do casamento. Olhar juntos para frente!


              A pior frase já criada pelo ser humano é a de que atrás de um grande
homem sempre tem uma grande mulher. Por que esta concepção?


              O homem não pode ser grande por ele? E se a mulher é grande, ela não
pode demonstrar esta grandeza, mas servir-se de sombra ao homem? Isto não é
casamento e não há orgulho para o homem que assim se vê ou para a mulher que assim
se sente. ANULARAM-SE!


              Não existe poesia na frase, ainda que queiram justificar ser um grande
elogio à mulher e forma de reconhecimento do homem! Mas que egoísmo profundo se
encontra na frase. Se a mulher faz de seu homem grande, será que ela serviu de escada?
E por que a frase não foi escrita de forma diversa?
Por que a mulher não pode ser grande? Ou será que pode?


              Onde está a aliança? A união? A essência?


              A frase revela uma simbiose. E, nesta simbiose, água e fogo são
destrutivos um para o outro: a água tentará apagar o fogo e o fogo tentará evaporar a
água. Quando o casamento finda, talvez até por esta troca egoísta, as cobranças serão as
mais violentas possíveis. Sempre um terá “mais razão” que o outro. Sempre um “deu
mais que o outro”. Sempre um “foi melhor que o outro”. Sempre um “foi
incompreendido”.


              Quantas frustrações se revelam na concepção moderna de união e
quantas separações temos vivenciado pela perda da essência? Lembro-me bem do meu
casamento, e, apesar de ser católico, foi um pastor protestante quem o celebrou. Ele
disse: - O casamento, para dar certo, a mulher deve ser submissa ao homem!


              Confesso ter sentido um arrepio naquela frase.


              O que o pastor quis dizer? – Mulher, mate a sua essência. Assuma o seu
casamento e esqueça-se da sua essência. Anule-se!


              E é neste anular-se ou tentar anular o outro que o casamento se perde. De
aliança, cisão! E da cisão, os grandes conflitos, as grandes dores e a sensação de perda.
O casamento se tornou tão importante na cultura ocidental que ele não pode ser desfeito,
mesmo que a essência esteja morrendo, dia a dia. Mate-me, mas não deixe que o
casamento termine!


              Minta a dor, seja um poeta sem poesia. Anule-se!


              Anulando-se, você está perdendo a sua essência e matando a essência
daquele a quem se fez juras de amor, de permanência na doença, na alegria e na tristeza.
Então, a miséria toma conta e a promessa de estar presente na bonança e na pobreza se
perde, porque a pobreza que resta é da alma e a bonança que sobra é a do egoísmo.
Mas a sociedade impinge esta necessidade de anulação. Se o pensamento
for anárquico, que o seja. Mas eu afirmo que o pensamento não pode ser rotulado, assim
como não se pode rotular o sentir!


               Sinta! Viva! Essencialize-se.


               Minta a morte que deveras sente! Seja poeta na poesia! Se mentires a
morte, talvez encontres a essência. Se mentires a vida, também pode ser que encontres a
essência. Mas se mentires o sentimento, jamais conseguirá alcançar a aliança.


               E a aliança, pelo fogo, se derrete. Pela água, machuca a mão. Pela terra,
arranha. Pelo vento se perde!


               Pela quintessência, se perfeito for, algo de errado pode estar acontecendo,
porque a perfeição não existe e não pode ser cobrada. Perfeição... o que será?


                                 ACRÓSTICO DA ESSÊNCIA


Este meu pensar, perdido nos ventos da noite, para a lua que
Sorri ao poeta. E este canta seus versos, procura a musa.
Sobressai-se porque escreve, mas prefere os ensinamentos dos
Essênios: pensar, refletir e viver. Iniciar uma jornada,
Nadar no mais belo oceano,
Cantar a poesia e não sentir-se pequeno diante de uma
Ilha perdida, ou do grande
Amor que se espera, porque o maior amor está na essência!
A TERRA


                 Estamos tão presos a conceitos e pré-conceitos que fixamos nosso
pensamento na terra, como sementes plantadas e raízes profundas que nos prendem ao
solo. Enquanto essência não podemos perder a noção de fixação, porque, caso contrário,
também a perderíamos, mas a idéia de termos a planta e a raiz podem ser de extrema
complexidade.


                 A fixação de pensamentos, comparando-a com a raiz que se aprofunda, é
um dos maiores problemas para a libertação da essência. Precisamos compreender o
nosso ser para identificar a nossa origem. Ou identificar a nossa origem para a
compreensão do ser. Não posso imputar a minha existência a quem quer que seja a não
ser, biologicamente a meus pais, e metafisicamente, a Deus.


                 Admitir que fixo-me em virtude de uma outra pessoa é a morte da
essência pela raiz. Então, estamos tratando de ego10. Pior ainda quando lidamos com o
superego, que é a morte plena da essência. Ao admitirmos o superego, que é o controle
dos impulsos pelos padrões societários, matamos a nossa essência, porque dependemos
da aprovação. E estamos tão presos ao solo, que não dissociamos a idéia do elemento
terra.


                 O superego “faz parte do aparelho psíquico da psicanálise freudiana de
que ainda fazem parte o ego (eu) e o id. Representa a censura das pulsões que a
sociedade e a cultura impõem ao id, impedindo-o de satisfazer plenamente os seus
instintos e desejos. É a repressão, particularmente, a repressão sexual. Manifesta-se à
consciência indiretamente, sob forma da moral, como um conjunto de interdições e



10
  Ego é o centro da consciência inferior, diferente do Eu que é centro superior da consciência. O Ego é a
soma total dos pensamentos, idéias, sentimentos, lembranças e percepções sensoriais. É a parte mais
superficial do indivíduo, a qual, modificada e tornada consciente, tem por funções a comprovação da
realidade e a aceitação, mediante seleção e controle, de parte dos desejos e exigências procedentes dos
impulsos que emanam do indivíduo. Obedece ao princípio da realidade, ou seja, à necessidade de
encontrar objetos que possam satisfazer ao id sem transgredir as exigências do superego. Quando o ego se
submete ao id, torna-se imoral e destrutivo; ao se submeter ao superego, enlouquece de desespero, pois
viverá numa insatisfação insuportável; se não se submeter ao mundo, será destruído por ele. Para Jung, o
Ego é um complexo; o “complexo do ego”. Diz ele, sobre o Ego: “É um dado complexo formado
primeiramente por uma percepção geral de nosso corpo e existência e, a seguir, pelos registros de nossa
memória”. <http://pt.wikipedia.org/wiki/Ego>
deveres, e por meio da educação, pela produção do quot;eu idealquot;, isto é, da pessoa moral,
boa e virtuosa “11.


                   A sociedade é um conjunto, um todo. A sociedade da informação
tecnológica ampliou imensamente este conceito e uma nova sociedade vem sendo
moldada (ou já se moldou). Vivemos a Cibercultura de forma ampla. São novos
conceitos e novos desafios. A Internet proporcionou o intercâmbio imediato e
globalizado de idéias e pensamentos.


                   Os conceitos – ou dogmas – de repressão vêm se perdendo. A
criminalidade, por outro lado, aumenta na mesma proporção. São novos tempos e novas
formas de pensar. A Cibercultura modifica o pensamento ocidental. Na China, por
exemplo, a Internet é censurada. Então, diante desta nova concepção de sociedade, com
torpedos12, e-mail, conversas em tempo real e pelo mundo, videoconferência, enfim,
diversos mecanismos tecnológicos dispostos ao homem, também perdemos um pouco o
contato com a essência.


                   A rapidez com que nos comunicamos e mudamos de pensamento, afasta
do ser a busca de sua essência. A tecnologia deve ser concebida para auxiliar o homem
e não para modificar o homem. Mas o superego começa a se desenvolver de forma
diversa. Se os conceitos societários se modificam, tratamos da ética de forma diversa.
Então, devemos pensar novos conceitos e novas idéias para mantermos a essência.


                   A    Cibercultura     neste    ponto    pode   ser   revolucionária:   quebrar
determinados conceitos que nos impõem busca pelo superego = necessidade de aplauso
externo. E o que seria dentro desta necessidade de aplauso externo a impulsividade?
Em determinados momentos o impulsivo é aquele que diz o que pensa e faz o que
deseja, sem qualquer freio.


                   Mas a pergunta é: em determinados momentos isto não é saudável?




11
     <http://pt.wikipedia.org/wiki/Superego>
12
     SMS – short message system (serviço de mensagens curtas)
Sim. Dês que eu tenha a plena consciência do preço que pagarei. Se o
preço for a mantença de minha essência não vou conceber o controle do que denominam
impulso. Estarei preso a terra, com raiz profunda e uma tristeza inconsolável. Mas se o
preço for a morte de minha essência, posso controlar meu impulso.


              Não existe uma fórmula para identificarmos o preço a ser pago, mas em
termos de sentimentos, o controle extremo por conta do superego é causa de tristezas.
Quando nos libertamos dos pensamos impostos pelos outros, somos mais felizes. Ora,
se eu sou um escritor técnico e desenvolvo obras na minha área de conhecimento, por
que preciso temer e escrever sobre essência? Em determinadas comunidades as críticas
serão acirradas, porque um escritor técnico deve ser um escritor técnico = superego.


              Mas, por outro lado, esta mesma comunidade não me dá a oportunidade
de libertar a minha essência através da escrita. Então, não admito como impulsividade
escrever. E escrever em áreas que não são as que escrevo tecnicamente. Liberto a minha
essência, em sua plenitude, quando aventuro-me pelas linhas da escrita. E isto faz-me
bem. Não me importa, então, as críticas. Não pago um preço por isto.


              Contudo, se meu impulso é a necessidade de conter meu semelhante, não
estou tratando de superego, porque, apesar de ser passível de crítica pela sociedade,
estou matando a essência do ser.


              A dicotomia impulso x sentimento ainda é uma grande descoberta que
compete aos poetas da psicologia. E sentimento, aqui, deve ser lido como essência. A
idéia de termos um preço a pagar não é mentirosa, mas precisamos saber se o nosso
caixa tem suporte para este preço.


              Admito que o preço mais caro seja o embotamento da essência!


              A terra, então, pode ser o símbolo de prisão, ou de criação. A terra, com a
água, germina. A terra, com o fogo, perde a essência, os nutrientes e nada mais nasce.
Qual a terra onde desejamos estar? A da criação, que faz parte da própria essência.
Em algumas sociedades iniciáticas pode-se ler, em determinado momento
da iniciação, o anagrama VITRIOL, transportado da Alquimia. Em verdade,
V.I.T.R.I.O.L.     que   é   a   abreviação   de   VISITA   INTERIOREM        TERRAE
RECTIFICANDOQUE INVENIES OCCULTUM LAPIDEM - Visita o Interior da
Terra Retificando Encontrarás a Pedra Oculta – procura a busca da pedra oculta. No
Cristianismo a busca do Santo Graal.




                 A terra, ou o elemento terra, não precisa ser símbolo de prisão, pelas
raízes que provoca. E é porque a partir do momento em que visito o interior da terra e
retificando-me encontrarei a pedra oculta, ainda mais quando se está diante de um
drama iniciático, o que procuro é a minha essência. Preciso morrer para o mundo
profano e renascer para uma nova realidade. Esta a idéia passada pelos mais diversos
cerimoniais de iniciação.


                 Os bantus são negros da África. A denominação bantus deriva da
necessidade de distinção entre dois grupos étnicos africanos. Nos bantus há um
cerimonial de iniciação e o iniciado é inserido em uma pedra com o formato do útero.
Fica o iniciado em posição fetal, em determinado momento da cerimônia, até que, para
ser aceito nos mistérios, uma parte é aberta e a pessoa cai. O símbolo presente é o do
nascimento. O iniciado, enquanto preso na pedra, em formato de útero, morrera para o
mundo profano dos bantus, até nascer para os rituais e símbolos próprios da sociedade.
Sempre teremos a imagem de busca do ser. A iniciação, o batismo – que
limpa o pecado original, no catolicismo -, a primeira comunhão, enfim, sempre estamos
à busca de nossa essência.


              Aprofundar-se na terra e procurar a pedra oculta nada mais é que um
forte símbolo de busca interior. O homem vive nesta busca incessante pela felicidade. E
a felicidade, pela cultura imposta pelo próprio homem, aprisionando o ego pelo
superego, é possuir muito dinheiro, ser realizado profissionalmente etc. Diversos livros
de auto-ajuda estão à venda para ter sucesso sozinho ou em conjunto, para enriquecer,
para neutralizar o pensamento do ser humano e pela neurolinquística o fazer repetir
tantas vezes uma determinada frase que o superego aceitará e parecerá que está feliz.


              Determinar a alcançar metas! Quais metas? As minhas ou as que a
sociedade impõe?


              Repito que o discurso não é anarquista. O discurso é mais profundo. O
discurso é a busca do eu, da essência, de quem eu sou. Não preciso saber de onde vim e
para onde eu vou, porque isto é a morte da essência. E perco muito tempo em tentar
entender estas questões que transcendem qualquer conhecimento. Mas eu posso
procurar – e encontrar – a minha essência. E não precisarei buscar dinheiro, realização
profissional etc. Quando encontrar a essência, a felicidade será plena e a conseqüência
serão as necessidades básicas que possuímos.


              Trata-se, novamente, da autopoiesis. Se eu não encontro minha essência,
não consigo ser feliz, e, se não consigo ser feliz, não tenho como realizar-me
profissionalmente, e, desta forma, não consigo manter minha família, ou comprar aquele
carro que eu quero. O dinheiro, a realização profissional e os demais bens que o
superego me impõe não são a necessidade básica. Será apenas conseqüência! E a
essência, esta sim, não pode ser conseqüência.


              Um problema a ser enfrentado pela psicanálise moderna. Por que tantas
pessoas se encontram infelizes? O mundo cresceu com o advento da tecnologia e da
modificação societária. Mas, por outro lado, informação e contatos em excesso
acabaram por provocar um efeito interessante na Cibercultura: a desinformação e a
desmaterialização das relações. A essência não se apresenta tão importante, porque o
externo é mais importante: meu computador, meu celular, meu tênis... meu... meu...


                   E o eu? Esta a grande pergunta que todos deveria fazer.


                   Ser!


                   Esta a necessidade.


                   Ter!


                   Uma mera conseqüência.


                   Em texto intitulado Entre a Psicanálise e a Arte, Noemi Moritz Kon
afirma que “é, portanto, contra a noção geral de latência, que nos impele a pensar numa
essência a ser desvendada, que nos propomos, quando admitimos, sem ambigüidades, a
força criadora do imaginário. O fazer psicanalítico perde, então, o seu caráter de
tradução de sentidos dissimulados, tornando-se, assim, desde esta perspectiva, um fazer
criador, que não está para decifrar um código de ocultamento de um conhecimento
presente, mas esquecido, mas sim, para criar, num encontro psicanalítico fundante, os
múltiplos sentidos de realidades singulares inéditas. O encontro com a produção
artística atual, e com a crítica que lhe segue, pode nos permitir, então, que
vislumbremos, como que em câmera lenta, este gesto criador presente, mas tantas vezes
temido, na própria experiência psicanalítica. É Paul Klee, pintor suíço, quem nos
permite, quase que num mantra, ressaltar sinteticamente o que viemos propondo até
então. Diz ele: quot;A arte não reproduz o visível, faz visívelquot;13 .


                   A frase pode ser transmutada, porque: a essência não se reproduz. Ela
precisa estar visível. E a partir do momento em que concebemos a arte, pela teoria
freudiana, como sendo um marco para os mais profundos mergulhos no interior da terra,
em busca da pedra oculta, admitimos o belo como fonte. E do belo extraímos a nossa
essência. As doenças podem ser curadas se enfrentarmos a essência.


13
     http://www.antroposmoderno.com/textos/Entre.shtml
Pela essência, pela fórmula básica de nossa criação, não somos um rótulo
ou uma condição. Não podemos estar à frente de uma neurose coletiva, a imputar
termos como impulsividade para tratar de sentimento. Ou de pânico para tratar
determinados distúrbios de ansiedade, ou, mesmo, admitir que a bipolaridade é um foco
de distorções sensitivas.


               A essência faz com que caminhemos em busca da pedra oculta, do Santo
Graal, do mergulho interior à terra. Necessitamos de água, de ar, de terra e de fogo.
Unindo os quatro elementos, teremos parte do que seja a essência. Mas não podemos
admitir a quintessência como fonte, porque a perfeição não existe nem mesmo na
essência.


               No recanto profundo da alma existe a essência. No recanto de nossos
mais sórdidos pensamentos, reside a essência.


               Mas na beleza da demonstração de nosso ser, aqui, sim, está a pura
essência. Ela não precisa ser bela, mas precisa ser vivenciada e sentida. A essência
embotada é a doença aflorada.


               A impulsividade, a neurose ansiosa, enfim, males da alma e da mente
podem ser embotamento da essência.


                                OS MALES E O SUPEREGO


               A sociedade se apresenta como a grande vilã para o embotamento da
essência. A semente, quando devidamente plantada, cuidada, com os elementos vívidos:
água, terra, ar e fogo (aqui, leia-se calor), produzirá a mais bela planta ou o mais
gostoso dos legumes. Assim somos nós. Se tratados, na essência, como devemos,
podemos ser belos. Contudo, se vivermos para os conceitos da sociedade, estamos
impregnando de agrotóxico a nossa plantação.


               Na Idade Média as mulheres cortavam costelas para poderem caber em
vestidos. Os espartilhos causavam as dores mais insuportáveis, porque a cintura deveria
ser de tal forma fina, para agradar aos gostos, que a moda passou a ditar, inclusive, o
bem estar das pessoas.


               O espartilho, hoje, se visualizado como símbolo de desejo e fantasia, não
causa dor, mas gozo. Quanto às costelas, não dá para conceber tamanho sacrifício. Mas
a sociedade é esta geradora de conceitos e pré-conceitos que nos impedem de
aprofundarmo-nos em nosso ser. Ir ao centro da terra. Procurar a pedra oculta.


               Os Cavaleiros Templários, por séculos, cuidaram do caminho sagrado, e,
simbolicamente, protegiam o Santo Graal, até não interessarem mais para a Igreja
Católica e serem queimados como hereges. Em momentos graves das cruzadas, os
Templários foram a força da Igreja, até o ponto em que chegaram próximo de sua
perfeição enquanto cavaleiros. A morte dos Templários deve ser concebida como um
símbolo. A perfeição, para o modelo de sociedade que se prega em determinado
momento, é causador de dores e sacrifícios.


               Mas    não   precisamos    matar    a   nossa     essência.   Nem   mesmo
simbolicamente.


               Reprimimos os nossos desejos e quando os liberamos ganhamos o rótulo
da impulsividade.


               Pisemos no solo, na terra, de pés descalços! Deixemos que a sensação do
formigamento nos tome conta, naquele momento. Esfreguemos os pés no chão e
deixemos que a energia da terra tome conta de nós. Uma brincadeira de criança. E,
como sempre nos perguntamos, por que crescemos? É o mito de Peter Pan que nos
assola, o tempo todo. Podemos, sim, ser Peter Pan nos momentos mais doces da vida,
como o simples esfregar do pé no chão e sentir o sal da terra.


               Mas podemos nos perder, enquanto essência, se deixarmos Peter Pan
dominar nossas vidas e não nos permitir crescer, porque a essência, como a semente que
se planta em solo fértil, necessita crescer e se comunicar com outras essências. Temos a
transformação, mas não a mudança. A flor possui sua essência na semente e será esta
essência quem demonstrará se ela é bela ou não.
Os nossos pensamentos, de Alice, por exemplo, nos conduz a um país das
maravilhas, mas é preciso encararmos a vida pelos nossos pensamentos e nossas
vontades. Vontade... A verdadeira vontade, encontrada na essência, é a necessidade de
realização de encontro com a pedra oculta.


                A vontade, por outro lado, de algo intangível ou imaginário, é a busca de
Peter Pan e Alice. São personagens fortes em nosso imaginário, que não precisam estar
escondidos, mas que precisam se apresentar em momentos de afloramento da essência.


                Quando estou brincando com meus filhos, tenho que ser Peter Pan e
aqueles minutos são mágicos. Quando estou triste, preciso cair no país das maravilhas e
procurar meu grande amigo coelho. São mitos, são símbolos, mas são a fuga necessária
da essência em determinados momentos. Nestes momentos, podemos agir ou não com
impulsividade.


                Mas a impulsividade não pode ser aquele padrão esteriotipado da
sociedade, porque, se assim o for, deveriam as mulheres continuar a quebrar suas
costelas para entrar no vestido. Eu admito ser mais fácil moldar o vestido a sacrificar o
meu corpo.


                Os Templários não precisavam construir um enorme caminho, ligando a
Europa à Ásia. Mas fizeram, em amor à essência que os impulsionava. E os mitos
gerados contra os Templários fizeram com que a essência pura da busca pelo Graal se
perdesse.


                Nós somos o Graal, a Pedra Oculta, Alice e Peter Pan.


                Mas enquanto vivermos presos aos conceitos impostos, pelos
pensamentos de cada momento histórico, estaremos sempre em busca de nossa essência.
Ou, acaso sejamos dotados da coragem dos Templários, da pureza de Peter Pan14, ou do


14
  Parece-me que Fernando Pessoa, em seu pseudônimo Bernardo Soares, traduz o meu sentir de Peter
Pan: “quot;O sonhador não é superior ao homem activo porque o sonho seja superior à realidade. A
superioridade do sonhador consiste em que sonhar é muito mais prático que viver, e em que o sonhador
encantamento de Alice, podemos dar um basta aos pensamentos ocidentais e
procurarmos no símbolo do taoísmo a nossa essência.



                                                ☯
                Como conceber o TAO como representação da essência? Ora, se o TAO,
em si, é dual, nossa essência também é. E é por esta razão que descartamos a
quintessência como existência do ser. Ou como interpretação para a transmutação do
quinto elemento.


                A partir da imagem do TAO, enquanto essência, podemos ser bons e
maus. Amorosos e revoltosos. Amigos e inimigos. Em todo o ser existe a dualidade.
Sentir e não sentir. Mas, entre sentir e não sentir temos a grande inquietação do ser, e da
essência.


                Por que tenho que sentir o que não me permitem sentir? E quando sinto,
o que apenas sinto, não me deixam apenas sentir? Por que é preciso sentir, sem sentir? E
por que não sentir se me mandam sentir?


                Arte e poesia são parte de nossa essência. E Fernando Pessoa foi um
mestre. Alguns textos de Do Livro do Desassossego, com o pseudônimo Bernardo
Soares, Pessoa nos provoca uma enorme introspecção:


                quot;O coração, se pudesse pensar, pararia.quot;


                 quot;Tudo me interessa e nada me prende. Atendo a tudo sonhando sempre;
                 fixo os mínimos gestos faciais de com quem falo, recolho as entoações
                 milimétricas dos seus dizeres expressos; mas ao ouvi-lo, não o escuto,
                 estou pensando noutra coisa, e o que menos colhi da conversa foi a noção


extrai da vidaum prazer muito mais vasto e muito mais variado do que o homem de acção. Em melhores e
muito mais directas palavras, o sonhador é que é o homem de acção. Sendo a vida essencialmente um
estado mental, e tudo, quanto fazemos ou pensamos, válido para nós na proporção em que o pensamos
válido, depende de nós a valorização. O sonhador é um emissor de notas, e as notas que emite correm na
cidade do seu espírito do mesmo modo que as da realidade.quot;
do que nela se disse, da minha parte ou da parte de com quem falei.
Assim, muitas vezes, repito a alguém o que já lhe repeti, pergunto-lhe de
novo aquilo a que ele já me respondeu; mas posso descrever, em quatro
palavras fotográficas, o semblante muscular com que ele disse o que me
não lembra, ou a inclinação de ouvir com os olhos com que recebeu a
narrativa que me não recordava ter-lhe feito. Sou dois, e ambos têm a
distância – irmãos siameses que não estão pegados.quot;


quot;Tenho fome da extensão do tempo, e quero ser eu sem condições.quot;


quot;Pesa-me, realmente me pesa, como uma condenação a conhecer, esta
noção repentina da minha individualidade verdadeira, dessa que andou
sempre viajando sonolentamente entre o que sente e o que vê.quot;


quot;Sou do tamanho do que vejo!quot;Cada vez que penso esta frase com toda a
atenção dos meus nervos, ela me parece mais destinada a reconstruir
consteladamente o universo. quot;Sou do tamanho do que vejo!quot; Que grande
posse mental vai desde o poço das emoções profundas até às altas
estrelas que se reflectem nele e, assim, em certo modo, ali estão.
E já agora, consciente de saber ver, olho a vasta metafísica objectiva dos
céus todos com uma segurança que me dá vontade de morrer cantando.
quot;Sou do tamanho do que vejo!quot; E o vago luar, inteiramente meu, começa
a estragar de vago o azul meio-negro do horizonte. Tenho vontade de
erguer os braços e gritar coisas de uma selvageria ignorada, de dizer
palavras aos mistérios altos, de afirmar uma nova personalidade larga aos
grandes espaços da matéria vazia. Mas recolho-me e abrando-me. quot;Sou
do tamanho do que vejo!quot; E a frase fica sendo-me a alma inteira, encosto
a ela todas as emoções que sinto, e sobre mim, por dentro, como sobre a
cidade por fora, cai a paz indecifrável do luar duro que começa largo com
o anoitecer.quot;


quot;Aquilo que, creio, produz em mim o sentimento profundo, em que vivo,
de incongruência com os outros, é que a maioria pensa com a
sensibilidade, e eu sinto com o pensamento.
Para o homem vulgar, sentir é viver e pensar é saber viver. Para mim,
                  pensar é viver e sentir não é mais que o alimento de pensar.quot;


                  quot;Meditei hoje, num intervalo de sentir, na forma de prosa de que uso. Em
                  verdade, como escrevo? Tive, como muitos têm tido, a vontade
                  pervertida de querer ter um sistema e uma norma. É certo que escrevi
                  antes da norma e do sistema; nisso, porém, não sou diferente dos outros.
                  Analisando-me à tarde, descubro que o meu sistema de estilo assenta em
                  dois princípios, e imediatamente, e à boa maneira dos bons clássicos,
                  erijo esses dois princípios em fundamentos gerais de todo estilo: dizer o
                  que se sente exactamente como se sente - claramente, se é claro;
                  obscuramente, se é obscuro; confusamente, se é confuso - ; compreender
                  que a gramática é um instrumento, e não uma lei.quot;


                  Nós somos essência, e, como essência, precisamos de ar e “O vento
levantou-se...Primeiro era como a voz de um vácuo...um soprar no espaço para dentro
de um buraco, uma falta no silêncio do ar. Depois ergueu-se um soluço, um soluço do
fundo do mundo, o sentir-se que tremiam vidraças e que era realmente vento. Depois
soou mais alto, urro surdo, um chocar sem ser ante o aumentar nocturno, um ranger de
coisas, um cair de bocados, um átomo de fim do mundo.15quot;


                                         A ESSÊNCIA E O AR


                  Não me parece haver, através dos quatro elementos, algo que me dê mais
liberdade que o ar. E entender o ar, como o último elemento a ser analisado na essência
e na dualidade do ser, parece-me a libertação de todo o sentir humano.


                  Estou muito preso! E estou sentindo-me preso. A sociedade está, a cada
dia, exigindo mais e mais de nossos sentidos e nos obrigando a nos afastar da essência.
Se não posso estar solto em minha existência, de nada me adianta pensar na essência. Se
a psicanálise não consegue explicar o sentir pelo sentir, ou se a arte não tem mais
importância, pergunto-me por que discutir tanto sobre a essência e o existir?


15
     Do Livro do Desassossego - Bernardo Soares - Bernardo Soares (heterônimo de Fernando Pessoa)
Por que a prisão na terra, pela raiz? Por que não conceber que a mesma
terra pode gerar-me a mais bela colheita de lírios do campo. Ah! Olhai os lírios do
campo e procure neles a sua essência. Se não encontrares a tua essência dentre os lírios
do campo, voe como Fernão Capelo Gaivota, que arriscou a sua vida em sociedade para
provar que poderia ser diferente e alçar vôos mais altos que as demais gaivotas. Ou,
então, apegue-se ao Pequeno Príncipe e viaje por universos desconhecidos.


              Mas viva pelo ar!


              Sinta pela terra!


              Purifique-se pela água!


              E ame como o fogo!


              Em Mateus, 5, Jesus nos apresenta a grande sabedoria da existência.
Ainda que o drama bíblico seja deveras forte, não pretendo traduzir o pensamento, mas,
diante da essência, pretendo sentir o que Ele nos apresentou em seus ensinamentos:
1 E Jesus, vendo a multidão, subiu a um monte, e, assentando-se, aproximaram-se dele
os seus discípulos; 2 E, abrindo a sua boca, os ensinava, dizendo: 3 Bem-aventurados
os pobres de espírito, porque deles é o reino dos céus; 4 Bem-aventurados os que
choram, porque eles serão consolados; 5 Bem-aventurados os mansos, porque eles
herdarão a terra; 6 Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque eles
serão fartos; 7 Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão
misericórdia; 8 Bem-aventurados os limpos de coração, porque eles verão a Deus; 9
Bem-aventurados os pacificadores, porque eles serão chamados filhos de Deus; 10
Bem-aventurados os que sofrem perseguição por causa da justiça, porque deles é o reino
dos céus; 11 Bem-aventurados sois vós, quando vos injuriarem e perseguirem e,
mentindo, disserem todo o mal contra vós por minha causa. 12 Exultai e alegrai-vos,
porque é grande o vosso galardão nos céus; porque assim perseguiram os profetas que
foram antes de vós. 13 Vós sois o sal da terra; e se o sal for insípido, com que se há de
salgar? Para nada mais presta senão para se lançar fora, e ser pisado pelos homens. 14
Vós sois a luz do mundo; não se pode esconder uma cidade edificada sobre um monte;
15 Nem se acende a candeia e se coloca debaixo do alqueire, mas no velador, e dá luz a
todos que estão na casa. 16 Assim resplandeça a vossa luz diante dos homens, para que
vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai, que está nos céus. 17 Não
cuideis que vim destruir a lei ou os profetas: não vim ab-rogar, mas cumprir. 18 Porque
em verdade vos digo que, até que o céu e a terra passem, nem um jota ou um til se
omitirá da lei, sem que tudo seja cumprido. 19 Qualquer, pois, que violar um destes
mandamentos, por menor que seja, e assim ensinar aos homens, será chamado o menor
no reino dos céus; aquele, porém, que os cumprir e ensinar será chamado grande no
reino dos céus. 20 Porque vos digo que, se a vossa justiça não exceder a dos escribas e
fariseus, de modo nenhum entrareis no reino dos céus. 21 Ouvistes que foi dito aos
antigos: Não matarás; mas qualquer que matar será réu de juízo. 22 Eu, porém, vos digo
que qualquer que, sem motivo, se encolerizar contra seu irmão, será réu de juízo; e
qualquer que disser a seu irmão: Raca, será réu do sinédrio; e qualquer que lhe disser:
Louco, será réu do fogo do inferno. 23 Portanto, se trouxeres a tua oferta ao altar, e aí te
lembrares de que teu irmão tem alguma coisa contra ti, 24 Deixa ali diante do altar a tua
oferta, e vai reconciliar-te primeiro com teu irmão e, depois, vem e apresenta a tua
oferta. 25 Concilia-te depressa com o teu adversário, enquanto estás no caminho com
ele, para que não aconteça que o adversário te entregue ao juiz, e o juiz te entregue ao
oficial, e te encerrem na prisão. 26 Em verdade te digo que de maneira nenhuma sairás
dali enquanto não pagares o último ceitil. 27 Ouvistes que foi dito aos antigos: Não
cometerás adultério. 28 Eu, porém, vos digo, que qualquer que atentar numa mulher
para a cobiçar, já em seu coração cometeu adultério com ela. 29 Portanto, se o teu olho
direito te escandalizar, arranca-o e atira-o para longe de ti; pois te é melhor que se perca
um dos teus membros do que seja todo o teu corpo lançado no inferno. 30 E, se a tua
mão direita te escandalizar, corta-a e atira-a para longe de ti, porque te é melhor que um
dos teus membros se perca do que seja todo o teu corpo lançado no inferno. 31 Também
foi dito: Qualquer que deixar sua mulher, dê-lhe carta de desquite. 32 Eu, porém, vos
digo que qualquer que repudiar sua mulher, a não ser por causa de prostituição, faz que
ela cometa adultério, e qualquer que casar com a repudiada comete adultério. 33
Outrossim, ouvistes que foi dito aos antigos: Não perjurarás, mas cumprirás os teus
juramentos ao Senhor. 34 Eu, porém, vos digo que de maneira nenhuma jureis; nem
pelo céu, porque é o trono de Deus; 35 Nem pela terra, porque é o escabelo de seus pés;
nem por Jerusalém, porque é a cidade do grande Rei; 36 Nem jurarás pela tua cabeça,
porque não podes tornar um cabelo branco ou preto. 37 Seja, porém, o vosso falar: Sim,
sim; Não, não; porque o que passa disto é de procedência maligna. 38 Ouvistes que foi
dito: Olho por olho, e dente por dente. 39 Eu, porém, vos digo que não resistais ao mal;
mas, se qualquer te bater na face direita, oferece-lhe também a outra; 40 E, ao que
quiser pleitear contigo, e tirar-te a túnica, larga-lhe também a capa; 41 E, se qualquer te
obrigar a caminhar uma milha, vai com ele duas. 42 Dá a quem te pedir, e não te desvies
daquele que quiser que lhe emprestes. 43 Ouvistes que foi dito: Amarás o teu próximo,
e odiarás o teu inimigo. 44 Eu, porém, vos digo: Amai a vossos inimigos, bendizei os
que vos maldizem, fazei bem aos que vos odeiam, e orai pelos que vos maltratam e vos
perseguem; para que sejais filhos do vosso Pai que está nos céus; 45 Porque faz que o
seu sol se levante sobre maus e bons, e a chuva desça sobre justos e injustos. 46 Pois, se
amardes os que vos amam, que galardão tereis? Não fazem os publicanos também o
mesmo? 47 E, se saudardes unicamente os vossos irmãos, que fazeis de mais? Não
fazem os publicanos também assim? 48 Sede vós pois perfeitos, como é perfeito o vosso
Pai que está nos céus.


               Do pai, a semente. Da semente, o fruto. O fruto: essência. A perfeição,
concebida pelo pensamento, não pode ser admitida como o não errar, mas como a busca
interior da própria essência, da pedra oculta, do Santo Graal. Não será pelo sacrifício
que nossa essência será perdoada, mas porque guardando o que há de melhor em nossa
essência, poderemos ser livres como o ar. “8 Bem-aventurados os limpos de coração,
porque eles verão a Deus”, ou, porque estamos em essência, somos bem-aventurados
porque nos encontramos. Se, através de um antropomorfismo, somos feitos imagem e
semelhança de Deus, por que não concebermos o nosso encontro conosco? Limpo de
coração, mergulhado na minha essência, sou a presença de Deus. Ou, sou homem, feito
à sua imagem e semelhança. E se pelo sopro nascemos. Se do pó viemos e ao pó
retornaremos, o ar nos deixa flutuar por nossa existência.


               A bem-aventurança está na conquista da liberdade da essência. E se
minha parceira pretende que minha essência se modifique, é porque nela não existe a
vontade de que o sol nasça para os bons e os maus. E se há maldade na essência, esta
vida poderá ser tão penosa quanto a própria maldade da existência. Mas mesmo os maus
possuem algo de bom e é importante compreender a essência para que a bondade aflore:
☯.
               E não há beleza maior para nossos ser do que perdoar. A partir do
momento em que concebo o perdão, em essência, digo a mim mesmo que meu inimigo
não conseguiu atingir a minha essência. Ele pode ter provocado meu superego, mas
jamais conseguiu atingir-me nas profundezas da pedra oculta, porque a ele não pertence.
Então, sequer preciso perdoar ou compreender os atos de meu inimigo, porque se
inimigo é, ausente de minha essência ele se encontra.


              Ao visualizar a multidão, Jesus apresentou, a todos, a essência. O drama
há de ser concebido pela época de pela forma como vivia o povo judeu, aprisionado
pelos imperadores. Jesus foi um revolucionário que trouxe à Terra o amor e as palavras
de amor. Ainda que embanhadas em certo temor Divino, as palavras nos remetem a um
grande pensar: as espadas contra os inimigos. A colheita, o sal da Terra. Quais são as
nossas concepções diante da existência humana?


              Se dou tanta atenção ao meu inimigo,é porque estou encarando-o como
sendo superior a mim. Em Filipenses, 2:3, temos a noção de respeito: “ Nada façais por
contenda ou por vanglória, mas por humildade; cada um considere os outros superiores
a si mesmo.” Respeito à minha essência. Respeito à essência do outro. E uma exata
noção de que ao nos defrontarmos com o inimigo – e, aqui, vamos tratar de algumas
espécies de inimigos – não devemos nos sentir superiores. Mergulhemos em nossa
essência.


              O ar, enquanto elemento, em sua integração com os demais elementos,
nos proporciona a liberdade do ser. E os nossos inimigos podem querem embotar o
nosso voar. Impedir que sejamos corajosos como Fernão Capelo Gaivota...


                              OS INIMIGOS E A ESSÊNCIA


              Quem são nossos inimigos? Quem são os inimigos da essência?


              Eu posso ter como inimigo o meu maior amigo, se ele pretender embotar
a minha essência. Amigo não é aquele que está ao meu lado para aplaudir-me quando
erro, mas ser crítico. A minha parceira pode ser uma grande inimiga quando tenta
sufocar a minha existência. O ciúme, ainda que no romantismo se traduza como símbolo
de amor, pode ser o inimigo da essência.
A essência vive da emoção, mas não pela emoção. Enquanto seres
viventes, somos plenos e capazes em emoções e nossas doenças, muitas vezes, são fruto
de emoções.


                   O budismo possui em um dos seus patamares de ensinamento o Jitai
Kensho, que, em breves palavras, significa: “O conceito budista de sabedoria e
individualidade indica uma real forma de conduzirmos a vida. Jitai se refere ao
indivíduo com as suas características próprias e Kensho se refere ao estado na qual este
ser brilha e se manifesta de forma clara.16”


                   Quais são as características próprias senão a própria essência? E este
estado que é a descoberta da essência. Conta uma determinada lenda que dois
peregrinos procuravam a luz. E, ao procurarem, descobriram que no alto de uma
montanha havia um monge, dotado de grande luz e sabedoria.


                   Os peregrinos alcançaram o alto do monte e passaram a seguir o mestre.
Em determinado dia, um dos peregrinos disse ao outro:


                   - Eu vou embora!
                   - Mas como? Nós encontramos a luz que tanto procurávamos e você vai
embora? – replicou o outro.
                   - Sim. Encontrei uma pessoa que ensinou-me a ver a minha luz. Então,
este é o momento de partir!


                   A luz está em nossa essência e não em uma determinada pessoa. E é por
isto que encontramos inimigos, ainda que o termo não seja apropriado para tratarmos de
pessoas tão próximas e que nos são muito caras.


                   O     resumo:     “quando      a   luz    do    Nam-myoho-rengue-kyo   brilha
interiormente, as características individuais brilham de forma radiante. Em
contrapartida, quando não há luz suficiente, em algumas ocasiões os aspectos positivos
não se tornam aparentes ou em outros, o aspecto negativo é que se torna mais aparente.


16
     http://www.vertex.com.br/users/san/jitai.htm - Fonte: Yasashi Kyogaku pg. 53
Por fim, como seguidores da filosofia budista de Nitiren, não podemos encerrar a nossa
existência no arrependimento de não ter sido possível manifestar todo o nosso potencial
e através da Lei Mística podemos fazer brilhar todas as nossas habilidades individuais e
edificar o mais elevado estado de vida17.”


              Assim é que podemos ter na sociedade a grande inimiga da existência do
ser. A grande inimiga da essência. Mas não apenas nesta sociedade simbiótica,
manipuladora e extremamente consumista, que esquece o ser, para dar valor ao ter.


              Também encontramos inimigos em nossos grandes amigos, na esposa ou
no marido, na família, no trabalho, enfim, sempre poderemos ter inimigos se assim nós
permitimos. E não são inimigos no sentido stricto da palavra, mas enquanto inimigos da
essência.


              Ao embotarmos nossos mais puros sentimentos por pré-conceitos,
estamos dando tanto valor ao outro, que a nossa luz se apaga e passamos a viver a luz
do outro. Esta não é a busca da pedra oculta, ou da nossa essência. Esta é a aniquilação
de nosso ser. Mas não podemos ser egoístas, certo? E o que é ser egoísta? Imaginemos,
então, que estamos tratando de macros. A macro-economia pode nos apontar uma
tendência a aplicar na bolsa. Eu tenho duas opções: acompanhar ou macro ou optar por
outro investimento.


              Se optar por outro investimento, estou trabalhando no micro e posso
perder tudo. Então, pelos conceitos vulgares da sociedade, estaria sendo chamado de
burro, ou outro termo do gênero. Mas eu quis seguir o micro e paguei o meu preço por
ele. Mas e se o micro der lucro e a tendência do macro for uma grande perda? Ah!
Passei a ser um gênio.


              No campo dos sentimentos podemos agir da mesma forma, ou seja,
mantermos, por exemplo, um casamento falido, porque o macro age desta forma e não
me permitirão admitir que o micro, aquele sentimento que somente eu sinto, possa ser
aflorado. Eu prefiro, então, em prol do macro, deixar o micro de lado. Mas eu preciso


17
     Idem
A Essência
A Essência
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A Essência

  • 1.
  • 2. A ESSÊNCIA NA DUALIDADE DA EXISTÊNCIA HUMANA JOSÉ CARLOS DE ARAÚJO ALMEIDA FILHO Rio de Janeiro – 2009
  • 3. Dedicado a dois anjos que conheci em minha caminhada Com grande e enorme carinho à pessoa que me fez escrever sobre a essência, porque por causa dela, voltei à minha
  • 4. quot;Se escrevo o que sinto é porque assim diminuo a febre de sentir. O que confesso não tem importância, pois nada tem importância. Faço paisagens com o que sinto.quot; Bernardo Soares (Fernando Pessoa)
  • 5. A ESSÊNCIA NA DUALIDADE DA EXISTÊNCIA HUMANA Os homens sempre tiveram a necessidade de classificar as coisas e as situações. Sempre tiveram o desejo de materializar. Sempre houve necessidade de explicação para tudo e para todos. O homem passa o dia explicando-se e tentando explicar aos outros o que sente, o que pensa, o que existe e o que poderia existir. Desde a remota antiguidade, tudo era explicado e teorizado. Os deuses! Estes deuses que são natureza, como o sol, a lua, o fogo, o trovão. Mais tarde, discute-se a existência dos quatro elementos e a quintessência. Mas estamos distante de nós mesmos quando começamos a atribuir aos elementos, ou aos outros, o que verdadeiramente somos? E o que verdadeiramente somos? Somos fogo, água, ar, terra? Ou, na teoria da quintessência, o perfeito? Somos isto tudo, nada disto, ou algo mais? Somos algo mais: somos essência. A água possui a sua essência, assim como o fogo, a terra e o ar. Tudo na vida depende, única e exclusivamente, da essência. E a essência não muda. Ela se altera. Ainda que os termos possam parecer semelhantes, não são idênticos. Mudança significa a passagem de água para fogo e isto é impossível. Modificação. Contudo, alteração significa passagem de água para vapor. E o vapor, por sua vez, volta a ser água. Se congelada, a água se transforma em sólido, mas uma vez derretida a pedra, volta a ser água. Assim, a essência não se modifica, ela se altera. Eu posso alterar o sentido de uma frase, mas não posso modificar o sentido da mesma. Os quatro elementos, por exemplo, podem se transformar. Mas a essência se modifica? Ou a essência se altera? A resposta parece simples, porque afirmamos acima a impossibilidade da modificação da essência. Mas ela se transforma. A mudança, para o que se pretende entender enquanto ser humano, é muito forte. A transformação, por sua vez, não nos parece algo doloroso. Mesmo assim, na dualidade da existência humana, podemos conviver com o mudar e o transformar.
  • 6. Na Bíblia, em Eclesiastes 3:20, observamos a força da palavra, quando se afirma que o homem veio do pó e ao pó voltará: “Todos vão para um lugar; todos foram feitos do pó, e todos voltarão ao pó.” Forte a concepção de pó, porque admitimos, dentro da análise dos quatro elementos, que a madeira, após o seu estado sólido, se queimada pelo elemento fogo, que, por sua vez necessita do elemento ar para existir, transmuta-se ao pó. Há extrema modificação. A simbologia bíblica é muito forte. Mas adotemos o pó como essência. E tentemos modificar a frase bíblica para: todos vão para um lugar; todos têm sua essência, e todos retornam à sua essência. A idéia do pó, diante do texto bíblico, está em Gênesis, 2:7: “E formou o SENHOR Deus o homem do pó da terra, e soprou em suas narinas o fôlego da vida; e o homem foi feito alma vivente.” O que seria, então, este pó, diante do Sopro Divino, senão a própria essência? Essência se modifica? Transmuta-se? Como entender a nossa essência e o nosso pensar de acordo com os dias que se passam? A questão se torna intrigante quando ouvimos de alguém: - Você precisa mudar! Mas será que este alguém, que de forma tão categórica, afirma que eu preciso mudar, também não precisaria? Ou será que ninguém tem o direito de fazer ou tentar fazer com que o seu semelhante mude? Na verdade, a grande sabedoria reside no sentido de descobrirmos a essência da pessoa e sabermos se é possível conviver com esta parte oculta. Quando somos essência, não precisamos ser modificados, porque, adotando a teoria dos quatro elementos, se sou água e me modifico, passo ao estado gasoso. Vejamos, por exemplo, a sociedade e os tempos modernos: a sociedade continua sendo sociedade. Os sociólogos atribuem termos à sociedade e hora é da informação, hora da informação tecnológica, hora apenas sociedade. Mas é sociedade. E, se estamos tratando de sociedade tecnológica, pensemos como as relações se modificam com a informação. Não muda, mas se transforma.
  • 7. Se há timidez profunda em uma pessoa, porque esta é sua essência, com a informática e a idéia de Cibercultura, é bem provável que esta pessoa consiga enviar uma mensagem eletrônica para a pessoa amada, ou para um amigo, a fim de dizer o que realmente sente. Ele não mudou sua essência de timidez, mas conseguiu, através de uma ferramenta que lhe deram, dizer algo que não diria. Esta pessoa não deixou de ser tímida, mas conseguiu, de alguma forma, demonstrar seus sentimentos. E precisamos entender a idéia de essência para alavancarmos o pensamento que nos deixa tão inquietos: a mudança, a necessidade de mudança, e a mudança que os outros querem ver em nós. Precisamos mudar? Esta é a questão mais complexa que devemos desenvolver. Qual a necessidade de mudança? Por que precisamos ser “feitos à imagem e semelhança do outro?” Não! Em verdade, precisamos descobrir a nossa essência. E por que o outro não nos aceita da forma como somos? Esta questão é de suma importância. Se alguém deseja tanto que nos modifiquemos ou que sejamos reprimidos em nossos sentimentos mais profundos, em verdade, não nos querem, mas desejam um espelho. E não podemos ser espelho de ninguém. Mirar-se em alguém, seguir-lhe bons exemplos, admirar o próximo pelos grandes feitos é uma forma saudável de comportamento. Invejar estas qualidades faz parte de uma essência pouco vigorosa ou que se possa dizer bondosa. Mas, se desejamos ser como o próximo, estamos abandonando a nossa essência. Deixamos, mesmo, de ser como a água e nos esquecemos de voltar ao nosso estado natural. A beleza da vida consiste em sermos e estarmos em nosso estado natural. Muitos relacionamentos não se desenvolvem ou se desgastam porque nos tornamos espelhos, ou nos deixamos ser espelhos do companheiro ou da companheira.
  • 8. Não podemos permitir que as pessoas tenham tanto domínio sobre nós e é por isto que a separação e os descontroles nos lares se tornou uma coisa extremamente comum no século XX. Não podemos ser “caramujos” de nossa própria existência e a imagem do caramujo é porque ele se esconde na concha. Mas a concha se quebra. Se adotarmos a simbologia, talvez a mais forte seja a da Idade Média, muito provavelmente por ter sido o período mais longo da história. E, como cavaleiros medievais, nos encerramos em armaduras e elmos. Nosso corpo e nossa cabeça se encontram tão encobertos que não temos a possibilidade de penetrarmos no mais íntimo pensamento de nosso ser – a essência. Como damas da Idade Média, deixamos que nossas costelas sejam quebradas para nos adaptarmos à moda. E sofremos com a dor, porque todos desejam uma cintura mais fina. Os homens com suas armaduras, as mulheres sem suas costelas. Todos perdidos em sua mais nobre essência, porque o pensamento do outro nos parece mais poderoso que o nosso próprio sentir. E o sentimento faz parte da essência da mesma forma como a luz é a fonte de todas as cores. Sem luz, não temos cor. A física, a química, a sociologia, enfim, as ciências nos mostram o quão é importante a essência. Os alquimistas tentaram, por anos a fio, transformar metais em ouro e não conseguiram. Mas nos deixaram o grande legado que é saber ser possível transformar, mas jamais modificar. Um metal que nasce impuro, jamais brilhará como o mais puro ouro. Se Alice não tivesse caído no país das maravilhas, talvez não tivesse a oportunidade de viver em si toda a sua existência. Peter Pan nos mostra a necessidade de sermos crianças. Deixemos de lado as “síndromes” e passemos a enfrentar as personagens dos clássicos como retorno à essência. Ser uma Alice ou um Peter Pan, e se os dois se
  • 9. unirem em essência, não se pode conceber problemas. Peter Pan pode crescer e Alice pode descobrir que em seu mundo real existe algo de mágico. A essência é a magia do ser, que flui de dentro do mais íntimo despudor da existência humana. Quando Einstein relativizou o tempo chamaram-no de louco. Despudor ou pudor, relativizados, são o equilíbrio perfeito na magia da grande mágica que é o viver. Assim como a água, por mais que nos modifiquem ou nos transformem em espelhos sem qualquer forma de agir, ainda que nos façam Pinóquio, algum dia enfrentaremos a realidade do mundo dos sonhos e retornaremos à essência. Pinóquio se transforma em ser humano, Peter Pan cresce e Alice aprende a viver seu mundo mágico. No balanço da vida, quando estamos prestes a não mais entender o seu sentido, conseguimos força e retornamos à essência. A água nos faz viver, o fogo nos aquece, o vento nos ameniza e a terra nos faz viver a realidade. Podemos sonhar com o vento, sentir o fogo no breve espaço do amar, beber da pureza da alma e viver do pó da terra. Podemos ser o que somos. Devemos ser o que somos. Devemos ser essência. E, enquanto essência, entender o por que de nossa existência. OS QUATRO ELEMENTOS E A VIVÊNCIA HUMANA A ÁGUA Ergo logo sun. Bem, se penso, logo existo, existo porque existe uma razão neste universo que se encontra ao nosso redor. Ao tratar dos quatro elementos, concebemos a água como a maior fonte de vida. Enquanto fetos, vivemos embanhados em água. Sem água, não sobrevivemos. E a água nos parece a maior força para tratarmos da existência humana e da essência. A essência... O que poderia ser a essência?
  • 10. Assim como a água, podemos admitir a essência como pureza. Não que não haja pessoas cuja essência seja ruim, mas ainda que se trate de ruim, é pura pela própria natureza de essência. A pureza, aqui analisada, consiste no fato de ser algo imanente ao ser humano em seu estágio mais primitivo. A essência poderá ser boa ou ruim. Não visualizamos a possibilidade de modificação da essência, mas de seu aperfeiçoamento. E a água é um exemplo clássico desta idéia. A água, em seu estado puro, é H2O. Já a água transformada em oxigenada, sem que a fórmula essencial seja perdida, é H2O2. Houve uma transmutação, mas não houve modificação na essência. A essência continua sendo H2O. A essência humana, contudo, apesar de parecer uma unidade, é dicotômica e podemos concebê-la diante dos mitos e das metáforas. Para os românticos, a unidade é a união perfeita, o encontro da alma gêmea. Mas não apenas! É preciso avançar na teoria da unicidade e entender a dicotomia sob o símbolo ( ou mito) do duplo. A duplicidade própria de todo o ser humano e não existe melhor simbologia para a explicação que o símbolo do TAO - ☯ -. Na dualidade estamos vivenciando a própria unidade do ser. E não é de hoje que este conceito se apresenta em nossas vidas. Retornando à Bíblia, em Gênesis, ainda que o antropomorfismo seja a base de toda a narrativa bíblica, ou seja, o homem foi feito à imagem e semelhança de Deus – e, aqui, cabe um hiato, porque se assim o foi o homem seria uno e não dual, diante da religiosidade empregada na forte concepção da Santíssima Trindade (Pai, Filho e Espírito Santo) -, também é certo que o homem foi dividido: “E Adão pôs os nomes a todo o gado, e às aves dos céus, e a todo o animal do campo; mas para o homem não se achava ajudadora idônea. Então o SENHOR Deus fez cair um sono pesado sobre Adão, e este adormeceu; e tomou uma das suas costelas, e cerrou a carne em seu lugar; E da costela que o SENHOR Deus tomou do homem, formou uma
  • 11. mulher, e trouxe-a a Adão. E disse Adão: Esta é agora osso dos meus ossos, e carne da minha carne; esta será chamada mulher, porquanto do homem foi tomada1.” Ainda que feito a imagem e semelhança de Deus, o homem foi bipartido e sua costela transforma-se em mulher. Na psique humana também vivenciamos esta dualidade tão bem retratada no texto bíblico, porque animus e anima, nos arquétipos jungianos, se completam, mas são duos. E da dualidade é que se pode conceber a essência. Conceber a essência e a dualidade é de grande importância, porque os símbolos e os mitos nos fazem entender a personalidade e como podemos ser felizes se deixarmos a verdadeira essência transbordar. Se em determinado momento de minha vida me apaixono, parece que o medo da perda se faz presente. E, em assim agindo, estou atribuindo ao outro a minha felicidade. O que não quer dizer que o outro, como ser em essência possa ter elementos próximos ao meu e fazer-me feliz. O que não posso é atribuir minha felicidade a quem quer que seja, a não ser a mim. A partir do momento em que estou em essência, sou feliz e posso visualizar a felicidade com a pessoa a quem desejo estar próximo. O medo, contudo, nos faz afastar esta pessoa. Para os românticos a questão está entre o amor e a morte. E a morte, aqui, se apresenta como o medo de vivenciar experiências novas e mergulhar dentro de nossa essência. Ainda que pareça um exercício de lógica, ao atribuir ao outrem a minha felicidade, trabalho da seguinte forma: estou triste. Conheci Fulana e fiquei feliz. Então, Fulana me faz feliz. As premissas são tão falsas quanto a conclusão e a lógica não se apresenta concebível na dualidade do ser. Para os românticos a morte tem o significado de perda, mas podemos concebê-la como renascimento. Ousar, em determinadas situações é tão saudável quanto recuar. Se eu temo algo que possa ser bom, com medo 1 Gênesis, 3:20-23
  • 12. de que venha a sofrer, estou vivenciando a plenitude da dicotomia humana: viver e morrer – aqui de forma simbólica, apenas. Viver e morrer em determinadas situações não representa nada além do que vivenciar o momento e deixar que o passado se afaste, de tal maneira que os pensamentos ruins não nos abale mais. O casal que se encontra em núpcias parece começar o dia com juras de amor e promessas de um sem fim. Mas tudo tem início, meio e fim. E o fim pode ser concebido como término ou como finalidade, objetivo de se alcançar alguma coisa. Se o meu fim é a idéia de perda, este medo se faz tão presente que acabo por perdê-lo. Se tenho medo de vivenciar um grande e novo sentimento e deixo-o escoar pelas mãos, nada mais estou fazendo do que deixar de sentir o que mais importante existe em mim que é a essência da vida. Assim como a água necessita do oxigênio, todos os serem necessitam, seja de forma real ou simbólica. Ainda que eu precise ser Alice no país das maravilhas, ou Peter Pan na Terra do Nunca, eu sei que poderei encontrar um coelho ou uma fada. Mas é preciso que eu não atribua ao coelho ou à fada a essência de minha felicidade. Viver! Sentir! Não se arrepender! São difíceis as ações, mas são necessárias. Oxigenar as relações... mas, se as relações não se oxigenam, deixamos de lado a nossa essência e começamos a procurar no outro a fonte de vida que à ele não pertence, porque somente pertence a nós. Estou feliz ao lado de alguém e não por causa de alguém. Se assim eu pensar, não restam dúvidas que sou dual, mas não perdi minha essência. EMOÇÕES E SENSAÇÕES NA DUALIDADE DO SER A partir do momento em que percebemos nossa essência, não precisamos temer o que somos. Não precisamos temer o que sentimos. Mas devemos estar atentos aos movimentos provocados pelo sentir.
  • 13. Entre a essência e o sentir existe um liame profundo e não raras às vezes confunde-se o existir com a impulsividade. Mas o que seria impulsivo quando estamos tratando de essência, de dual e de sentir? Tentar pegar o telefone, ligar, falar horas? Controlar-se? Até que ponto tem-se a idéia da impulsividade e distorção do verdadeiro sentir? A essência, dual, por natureza, deve conviver com as idéias que nos passam pela mente. E não podemos confundir sentimentos com neuroses2. Não afirmo que exista total discrepância entre os dois, mas as neuroses são sentimentos destrutivos (nem sempre, porque podem provocar sensações de conquista ou necessidade de superação), ao passo em que o sentimento puro da essência, dês que boa, não é destrutivo. E se o sentimento nasce da essência, ou se a essência reclama este sentimento, então não podemos admitir haver algo de doente. Podemos entender esta dualidade de sentimentos (neuroses não deixam de serem emoções, e, por sua vez, sentimentos) como a água. Em determinado momento nos prendem de tal forma que nos sentimos tão duros quanto o gelo. E somos obrigados a conviver no ambiente transformado de nossa essência. Estou sólido, porque não me permito. Estou duro, porque não me permito. Estou petrificado, porque não me permito. Mas sinto! Por outro lado, se deixar meu sentimento tomar conta de mim, transformo-me em vapor e fico tão solto quanto as nuvens. É preciso entender a essência e o meio termo. 2 A neurose, na teoria psicanalítica, é uma estratégia ineficaz para lidar com sucesso com algo, o que Sigmund Freud propôs ser causado por emoções de uma experiência passada causando um forte sentimento que dificulta reação ou interferindo na experiência presente. Por exemplo: alguém que foi atacado por um cachorro quando criança pode ter fobia ou um medo intenso de cachorros. Porém, ele reconheceu que algumas fobias são simbólicas e expressam um medo reprimido. Na teoria da psicologia analítica, de Carl Jung, a neurose resulta do conflito entre duas partes psíquicas, das quais uma deve ser inconsciente.
  • 14. Quando me sinto solto, diante de um sentimento – o amor, por exemplo -, preciso identificar, em minha essência, se estou solto porque sou solto, ou porque alguém me soltou. Ora, se alguém me soltou, é certo que esta não é minha essência, mas um momento etéreo e que se perde se o vapor não retornar ao seu estado natural que é a água. Por outro lado, se o sentir é petrificante, estou encarcerado. A idéia da essência é exatamente olhar para dentro de cada um de nós e entender o que se passa, sem que possamos admitir tratar-se de impulsividade, neurose, ou qualquer outro rótulo. Posso, neste momento, sentir-me Peter Pan ou Alice. O preço devo avaliar e pagar pelo mesmo, mas não conseguirei fugir da minha essência. Ouvindo uma música da Shakira, pude perceber a idéia de essência, quando o coração está à flor da pele e o sentimento não se confunde com impulsividade: Para amar-te necessito uma razão, e é difícil crer, Que não existe nada mas, que este amor Sobra tanto, dentro deste coração, Que apesar do que dizem, que os anos são sábios, Ainda se sente a dor, Porque todo o tempo que passei junto a ti, Deixo tecido seu fio dentro de mim A poesia permite estas licenças, quando a razão de ser convive na outra pessoa. E a poesia é um dos maiores fenômenos de vida, de viver, de sentir. Poesis é criação, e, como tal, deve ser entendida como pura essência. Mas nem sempre a poesia, com suas licenças, nos deixarão compreender a essência. Se “quando não existe mais nada que este amor”, a vida deixa de ter sentido e deixamos de lado a nossa essência. Sem dúvida, melancólica e bela a poesia, mas não pode ser entendida como viver a essência. Agora, a partir do momento em que somos detentores de fortes emoções, a impulsividade está presente. Contudo, uma diferença entre sentir e ser impulsivo é preciso. Se o amor se deixa estar no outro, posso, até, admitir existir impulsividade. Mas
  • 15. se sinto, porque sou eu quem está sentindo, ou minha essência está sentindo, espero enviar ao outro este sentimento e que ele sinta sem que a minha emoção interfira na dele. Não é impulsividade, mas verdadeiro sentir: não dependo dele, mas gosto de estar com ele. Não é preciso ir muito além para tentar imaginar qual foi a sua primeira sensação ao analisar a foto... Mas não vamos parar por aqui...
  • 16. QUAIS FORAM SUAS SENSAÇÕES?
  • 17. VONTADE DE ESTAR NESTE LUGAR? Tente, de alguma forma, interpretar as imagens, seus sentimentos, suas emoções. Tente, de alguma forma, misturar a vontade de estar, com o impulso de estar. Sinônimos, sem dúvida, mas não termos idênticos. E, quando estamos diante de essência, não podemos tratar de sinônimos ou assemelhados, mas de essência. Mas, mesmo o impulso pode ser produtivo, porque:
  • 18. IMPULSO = DESEJO = REALIZAÇÃO Mas é preciso pensar nas conseqüências e avaliá-las. Eu admito que a avaliação está na essência. Sim... em um primeiro momento posso estar dominado pelo impulso, que se transforma, imediatamente, em desejo. Posso reprimir, como o gelo, posso liberar, como o vapor. Mas se unir impulso, com desejo, na minha essência, o que tenho é realização. Em outras palavras: medi as conseqüências e optei pelo que me deixa, realmente, feliz, e não o que me deixa acomodado. O FOGO PODE ALGUÉM RESGATAR A SUA ESSÊNCIA? Sim? Não? Não sei? O fogo é elemento de força e vida. Assim como a água e os demais elementos, o fogo é intenso e vivo.
  • 19. O fogo, enquanto análise da essência, reporta-nos, de alguma forma, à Phoenix. E não há um símbolo tão profundo quanto a Phoenix, se estamos tratando de essência. Às vezes é preciso morrermos, pelo fogo, para voltarmos à essência e darmos de alimentar aos filhos.
  • 20. A Phoenix renasce das cinzas! Apocalíptica imagem, a Phoenix reside em cada um de nós enquanto essência. Quando não deixamos nossa essência ser dominada, ou, ainda que adormecida por sermos obrigados a escutar verdades que não são nossas, é da imagem do fogo e de sua transformação em pó que podemos reconstruir o Sopro Divino que reside em nós. Através do mito da Phoenix, descobrimos que ela se reproduz sem qualquer ato sexual, ainda que o fogo possa ser um grande símbolo da sexualidade, porque sempre existirá apenas uma ave. E é admissível, porque se ela renasce das cinzas, somente uma Phoenix pode existir. E qual a grande simbologia entre Phoenix, Fogo e Essência? A unidade. Ainda que a existência seja dual, por natureza, a essência, envolta nesta dualidade, necessita, sempre, estar à mostra. Precisa apresentar-se. Encolhida pelo fogo, por diversas vezes; escondida pela perversidade daqueles que não podem admitir o crescimento; adormecida sobre o leito perverso da solidão... Mas a essência renasce. E, como pelo fogo foi extirpada, pelo mesmo fogo, ungida em água, símbolo de purificação, renasce a ave bela, que viaja por tempos e caminhos longínquos, mas sempre tão perto de nós que não conseguimos visualizar: esta é a nossa essência. Escondida! Perdida! Adormecida! A Phoenix é uma presença nas religiões. A mitologia e a simbologia, muitas vezes, são desperdiçadas, porque as pessoas tendem a admitir serem pagãs. Mas não são. A idéia da Phoenix, por exemplo, pode ser concebida no Cristianismo como a ressurreição de Cristo, porque cada alma justa é uma Phoenix3. Quando passamos a conceber o mito como análise e alegoria do viver, temos no fogo a expressão do calor e da vida plena. Phoenix, segundo Brunel, afirma 3 BRUNEL, Pierre. Dicionário de Mitos Literários. José Olympio, RJ: 1988
  • 21. que “não fazem parte da história da fênix pecados ou castigos. Nada de provas a serem vencidas, a não ser uma única que talvez pudesse ser qualificada de glorificante: a morte que irá resultar em ressurreição. A unicidade da fênix, sua beleza, sua privilegiada ligação com o Sol, fonte de vida, tudo se congrega para dar-lhe qualidades positivas.” E o que esperamos da essência, senão a vivência em unicidade conosco? Admirar a beleza do Sol? Viver plenamente? Se morrermos, em determinado momento de nossa vida, morte emocional embotada pelos sentimentos daqueles que em nada nos acrescentam e até sentem prazer em destruir o que de bom possuímos, será pelo fogo da vida, pela cinza – porque do pó veio e ao pó retornarás – que seremos sempre nós! E, quando somos nós, somos essência. A essência não se destrói, porque sua força é tão bela e forte com a ave que sobrevoa mundos distantes, em mito, em sonho, mas que nos traz, sempre, de volta à nossa bela e imaginável origem. Afinal de contas, nascemos para ser felizes!
  • 22. ENTRE A ÁGUA E O FOGO COMO ENTENDERMOS A NECESSIDADE DE MUDAREM A NOSSA ESSÊNCIA? Quantas vezes não ouvimos que precisamos mudar? Nossa estima se perde quando ouvimos esta frase a partir do momento em que a admitimos como verdadeira, ou seja, que precisamos mudar. Estamos entre o fogo e a água quando uma frase desta é proferida. Mas se admitimos a essência, não precisamos nos modificar. Não precisamos ser feitos à imagem e semelhança do outro. Mas podemos, sim, respeitar o outro e conviver com seus defeitos e qualidades. Na dualidade do ser, somos a Lua e seu lado negro. Precisamos conceber nossa dicotomia nesta existência e aprendermos a lidar com nossos lados: o melhor e o pior de nós. Aceitar que somos fortes e fracos, bons e maus, saudáveis e doentes. Todos somos um misto de água e fogo, terra e ar. Mas não somos rótulos. Não somos passíveis de modificação em essência. Não pertencemos ao próximo, mas queremos estar ao lado de alguém. Heidegger, um dos mais complexos filósofos do Séc. XX, admitia esta essência do ser. Para Heidegger4 o humanismo é a grande chave. E quot;que as mais altas determinações humanísticas da essência do homem ainda não experimentam a dignidade propriamente dita do homemquot;5. Neste texto o que se pretende demonstrar é que a humanidade é dotada de uma essência, sem que haja necessidade de ser rotulada. O ser humano, em sua essência, busca a verdade: a sua verdade! E não nos compete atribuir a este sentir uma denominação ou um rótulo. O preconceito existente no mundo ocidental moderno, muitas vezes, proporciona um afastamento do homem de sua essência. Alguns exemplos, que envolvem sentimentos, podem ser bem explicados: 4 HEIDEGGER, M. Introdução à Metafísica; trad. Emmanuel C. Leão. - Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1987. ____________, _. quot;Sobre o Humanismoquot;, in Conferências e Escritos Filosóficos; trad. Ernildo Stein. - São Paulo: Abril Cultural, 1983. 5 Idem
  • 23. - uma pessoa que casou mais de uma vez não pode ser uma boa pessoa; - é preciso doar-se, integralmente, para ser feliz; - no casamento, no namoro, no amor, enfim, é preciso apagar parte de seu ser. São frases feitas, verdadeiros clichês, que devem ser analisados, sob pena do ser humano ficar tão preso a uma falsa essência, que sequer conseguirá livrar-se das garras de sua própria existência (ou inexistência). A partir do momento em que deixamos nossa essência passamos a viver na inexistência. E, neste ponto, lembra-me Nietzsche, que admite a niilidade. Heidegger não fica atrás, já que a idéia é contemporânea. A niilidade de Nietzsche, assim como a de Heidegger, apesar de seu humanismo, não podem ser concebidas como a perda da essência. Antes de analisarmos os três nortes de preconceito lançados, porque não se resumem, apenas, a eles, mas que servem de base para a compreensão da existência da essência, será necessário entendermos o ponto nodal da filosofia moderna: “Uma filosofia que não tenha em si qualquer princípio passivo; uma filosofia que especula sobre a existência sem tempo, sobre a existência sem duração, sobre a qualidade sem sensação, sobre o ser sem ser, sobre a vida sem vida, sem carne e sangue – uma tal filosofia, como a filosofia do Absoluto em geral, tem necessariamente como seu contrário, na sua unilateralidade plena, a empiria. Espinosa fez da matéria um atributo da Substância, não porém como um princípio de afecção, mas justamente porque ela não sofre, porque é única, indivisível e infinita, porque possui exactamente as mesmas determinações que o seu contrário, o atributo do pensamento, em suma, porque é uma matéria abstracta, uma matéria sem matéria, da mesma maneira que a essência da lógica hegeliana é a essência da natureza e do homem, mas sem essência, sem natureza, sem homem.6 (...) A verdadeira relação entre pensamento e ser é apenas esta: o ser é o sujeito, o pensamento o predicado. O pensamento provém do ser, mas não o ser do pensamento. O ser existe a partir de si e por si – o ser é só dado pelo ser. O ser tem o seu fundamento em si mesmo, porque só o ser é sentido, razão, necessidade, verdade, numa palavra, tudo em todas as coisas. – O ser é, porque o não ser é não ser, isto é, nada, não-sentido. A essência do ser enquanto ser é 6 Ludwig Feuerbach – teses provisórias para a revolução da filosofia (1842) - http://www.lusosofia.net/textos/feuerbach_teses_provisorias_de_reforma_da_filosofia.pdf
  • 24. a essência da natureza. A génese temporal estende-se apenas às formas, não é essência da natureza.” A frase “o ser existe a partir de si e por si – o ser é só dado pelo ser” deve ser destacada porque nela reside a idéia de essência e da própria dualidade da existência humana. Entre o bem e o mal vivemos todos, mas a ética, a verdadeira ética, como conhecida pelos filósofos, deve ser concebida a partir do ponto em que somos. E nada seremos se perdermos a essência. Quando afirmamos que uma pessoa não pode casar mais de uma vez, concebemos um pré-conceito muito grande. Os mitos, os símbolos, estão de tal forma inseridos em nosso ser, que a ritualística do casamento se faz marcante em nossas vidas. O vestido, a impossibilidade de o noivo ver a noiva antes do sacramento, enfim, são diversas concepções que não nos permitem a morte do rito. Mas se Nietzsche matou Deus – e aqui precisamos entender a idéia da niilidade e os conceitos filosóficos -, por que não se pode ser essência? - UMA PESSOA QUE CASOU MAIS DE UMA VEZ NÃO PODE SER UMA BOA PESSOA Será? Por que a sociedade nos cobra de forma tão audaciosa e insensata a niilidade do ser? Por que será que somos obrigados a misturar em nossa essência as frases feitas? Não quero, sob qualquer hipótese, admitir a existência sem a essência. Mas também não estou afirmando, aqui, que devemos agir pelo simples agir. Na moral e na ética não se encontram tamanhas proibições. Se a essência do meu eu não coincidir com a essência do seu eu, o que acontece é a idéia de que água e fogo podem conviver sem que um interfira no outro. E isto é impossível, pelo menos, por enquanto. A partir do momento em que analisamos a concepção de existência e essência sob o ponto de vista de não interferência, afirmo que é impossível água e fogo estarem juntos. A água tentará, de qualquer maneira, apagar o fogo. O fogo, por sua vez, tentará de qualquer maneira evaporar a água. Faz parte da essência destes elementos.
  • 25. Mas água e fogo podem conviver pacificamente, a partir do momento em que têm consciência de que suas essências são diversas e que uma pode completar a outra, dependendo da ocasião e da maneiras como interagem. Se um casamento não deu certo, é porque a água tentou, de alguma forma, transformar o fogo em água, ou vice-e-versa. Pretendeu-se modificar a essência, ao invés de com ela conviver e transmutar-se. A idéia de modificação do ser conduz à total falta de sentimento. A falta de sentimento conduz à inexistência do próprio ser. A inexistência conduz à morte (simbólica, ao menos). A manutenção de relacionamentos fracassados conduz à total inexistência. Conduz à perda da essência. E não se pode atribuir culpa. Culpa, aliás, é um grande mal da civilização. Somos temidos e sofremos temores. Por que a necessidade de sermos tidos e concebidos com culpas e medos? Os preconceitos nos fazem temer e ser temidos. Mas a essência não precisa do medo para sobreviver. A essência necessita, ao contrário, da chama viva. E se por algum motivo uma pessoa tenta por dezenas de vezes encontrar o par perfeito, a sua alma gêmea, ser feliz, por que taxar-lhe de incompetente no casamento? Se for homem, a sociedade, de uma certa forma, perdoa. Mas se estamos falando de uma mulher, os mais variados adjetivos lhes serão imputados. É, então, preferível manter um relacionamento para que a sociedade não nos crucifique (e, aqui, temos outro símbolo de enorme grandeza, que é a cruz), a vivenciarmos e experimentarmos a nossa essência. Mas não podemos deixar de avaliar as conseqüências, porque enquanto essência não podemos agir por condicionamentos. Devemos avaliar, sempre, a nossa postura. O que não podemos é chegar ao ponto da anulação da felicidade.
  • 26. Imaginemos, então, que vivemos mundos paralelos! Suponhamos que as máquinas dominam a humanidade, com o avanço tecnológico e estamos aqui e em outro lugar, simultaneamente. Admitamos, para fins de compreensão, que é possível viver em mundos paralelos, simultaneamente. Temos, aqui, uma idéia de essência e dualidade. Eu posso estar vivendo neste mundo, aonde as letras são escritas desta forma, mas posso estar, ao mesmo tempo, no etéreo, ou em outro mundo, tendo as sensações do meu outro ser, que carrega em si a mesma essência. E convivo, bilateralmente com estas idéias. De um lado de minha existência estou triste, porque desejam modificar minha essência, mas o meu outro ser, de tão feliz que se encontra, provoca-me uma sensação de retornar à origem. Em mundos paralelos eu posso admitir a possibilidade de novas regras e novos conceitos. E posso admitir que existo por existir e minha essência é a mesma em qualquer mundo em que viva. Tenho a nítida sensação de poder estar vivendo mundos paralelos de forma ampla. Então, como necessito de um rótulo, não tenho a menor dúvida que serei taxado de psicótico7. Criaram-me um rótulo porque pretendo admitir a existência do ser em sua dualidade, entre o bem e o mal, entre o ser e o não ser, entre o existir e o não existir. A essência... Esta a palavra mestra para podermos conceber nossa visão de universos paralelos dentro de nosso próprio ser e eliminar, de alguma forma, a idéia de que não podemos ser felizes. Em um mundo paralelo posso sentir-me culpado de um lado e feliz de outro. A minha dualidade permite-me os dois sentimentos. Mas é certo que não posso conviver com esta dualidade no mundo físico em que me encontro. Uma digressão entre o ser e o estar é preciso. Eu posso ser feliz sentindo-me culpado? Mas se estou feliz e 7 Psicose é um termo psiquiátrico genérico que se refere a um estado mental no qual existe uma quot;perda de contacto com a realidadequot;. Ao experienciar um episódio psicótico, um indivíduo pode ter alucinações ou delírios, assim como mudanças de personalidade e pensamento desorganizado. Tal é frequentemente acompanhado por uma falta de quot;críticaquot; ou de quot;insightquot; que se traduz numa incapacidade de reconhecer o carácter estranho ou bizarro do seu comportamento. Desta forma surgem também dificuldades de interacção social e em cumprir normalmente as actividades de vida diária. <http://pt.wikipedia.org/wiki/Psicose>
  • 27. me culpo? Por que é preciso matar o meu sentimento de felicidade pela atrocidade da culpa? Não tenho a menor dúvida que é pelo rótulo. Mas retorno ao meu mundo paralelo e vivo essências diversas, com pensamentos e sensações diversas. Culpado... Feliz... Estou, sim, culpado, porque não tive a coragem de manter um casamento que não deu certo, porque a sociedade me impõe uma neurose coletiva. E se posso estar em um mundo paralelo, por que não posso admitir a psicose daqueles que me rotulam? Quem será mais louco que eu nesta existência dual? Por outro lado, estou feliz! E querem arrancar-me esta felicidade em detrimento da própria sociedade psicótica! Os rótulos são para a média das pessoas e nem todos os doentes precisam estar doentes. No meu mundo paralelo, não estou doente, porque estou feliz. Mas em meu mundo real, estou doente pela tristeza causada pela culpa. Meu casamento não deu certo, então não posso ser uma boa pessoa e não tenho o direito de tentar, e tentar e tentar... Então, que fique a culpa! A essência não admite a culpa por esta razão, como não admite a existência de mundos paralelos. A essência admite a verdade do meu sentimento e da vontade de extirparem-se os rótulos e as mágoas que os mesmos geram. A essência procura a felicidade. E, quando se está diante de tamanho preconceito, a impossibilidade de sermos felizes, ainda que os relacionamentos não estejam tão perfeitos, nada melhor que Coríntios. Como dito antes, a Bíblia é profunda e forte em suas palavras e símbolos. 1 Coríntios 13 Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse amor, seria 1 como o metal que soa ou como o sino que tine. E ainda que tivesse o dom de profecia, e conhecesse todos os mistérios e toda a 2 ciência, e ainda que tivesse toda a fé, de maneira tal que transportasse os montes, e não tivesse amor, nada seria. 3 E ainda que distribuísse toda a minha fortuna para sustento dos pobres, e ainda que
  • 28. entregasse o meu corpo para ser queimado, e não tivesse amor, nada disso me aproveitaria. O amor é sofredor, é benigno; o amor não é invejoso; o amor não trata com 4 leviandade, não se ensoberbece. Não se porta com indecência, não busca os seus interesses, não se irrita, não suspeita 5 mal; 6 Não folga com a injustiça, mas folga com a verdade; 7 Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. O amor nunca falha; mas havendo profecias, serão aniquiladas; havendo línguas, 8 cessarão; havendo ciência, desaparecerá; 9 Porque, em parte, conhecemos, e em parte profetizamos; 10 Mas, quando vier o que é perfeito, então o que o é em parte será aniquilado. Quando eu era menino, falava como menino, sentia como menino, discorria como 11 menino, mas, logo que cheguei a ser homem, acabei com as coisas de menino. Porque agora vemos por espelho em enigma, mas então veremos face a face; agora 12 conheço em parte, mas então conhecerei como também sou conhecido. Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e o amor, estes três, mas o maior destes é 13 o amor. - É PRECISO DOAR-SE, INTEGRALMENTE, PARA SER FELIZ; A doação faz parte do ser humano. Não tem como não admitirmos a doação. A essência se doa. Mas qual o limite da doação? O limite da doação está na doença da essência. Quando a essência adoece, de nada adianta a doação, que se transformará em um grande e imenso vazio da existência. Nada de dual: apenas o ser em sofrimento. A doação pode ser pura, mas pode ser fruto de egoísmo. Entender o dual, na essência, é a grande chave para a conquista do que concebemos como felicidade. Para amar, para sentir, é preciso conceber a essência e aprofundar-se no seu mais puro sentido. É preciso saber viver a essência. Quando se doa, apenas por doar, ou na intenção de querer fazer outra pessoa bem, não se está doando, mas necessitando de aplauso e não se está diante da pura essência do ser humano. Muitas vezes a doação é um duplo egoísmo: para conosco e para aquele a quem doamos, porque esta se transformará em cobrança futura.
  • 29. A essência não precisa de aplauso externo. Nós precisamos nos conhecer de tal maneira, que os argumentos e sensações externos não afetem o verdadeiro ser. Quando deixamos que os outros afirmem sermos desta ou daquela maneira, criamos um laço simbiótico a ponto de anularmos o nosso verdadeiro ser. E quando assim deixamos os outros agirem, estamos permitindo que a essência seja perdida. A conseqüência será a necessidade de aplauso e reconhecimento externo. O reconhecimento deve partir de nós. Devemos estar bem conosco e descobrir nosso verdadeiro EU para a felicidade brotar. A felicidade não está em poder de ninguém. A felicidade está na realização da essência e do sentir. O verdadeiro sentir. O externo, as sensações que nos transmitem, a necessidade que temos de deixar o outro afirmar sermos assim ou daquele jeito, mata a beleza do existir humano. Quando não precisamos mais do aplauso daquela pessoa, ou de quem quer que seja, estamos vivendo a nossa existência em sua plenitude. Estamos deixando que brote de nosso interior a maior beleza do universo: a doação plena pelo amor e não a doação por doar. Quando a doação frutifica do mais puro sentimento, não há cobrança. Mas quando a doação se faz quando precisamos dos aplausos, podemos esquecer que a bilheteria do teatro da vida não foi suficientemente farta para nos alimentar. E quando não se consegue uma casa cheia, o espetáculo não tem sentido. A essência, plena, doa sem necessitar retorno. Mas o doar para fazer o outro feliz é o maior erro que se pode cometer, porque estamos afugentando a platéia da vida. E nesta platéia existem espectadores que não podem sofrer pelo egoísmo de alguém que nada entende de arte e apenas sentou-se em uma das cadeiras para poder vaiar. O resumo da doação: cumplicidade. O resumo do egoísmo: morte da essência. A verdadeira intenção: participar do espetáculo da vida e se alguém desejar assistir o nosso desenvolvimento no palco, que a vaia não nos afete!
  • 30. Na oração de São Francisco verificamos uma autopoeisis fantástica, que resume a idéia de doação e felicidade: Senhor, fazei-me instrumento de vossa paz. Onde houver ódio, que eu leve o amor; Onde houver ofensa, que eu leve o perdão; Onde houver discórdia, que eu leve a união; Onde houver dúvida, que eu leve a fé; Onde houver erro, que eu leve a verdade; Onde houver desespero, que eu leve a esperança; Onde houver tristeza, que eu leve a alegria; Onde houver trevas, que eu leve a luz. Ó Mestre, Fazei que eu procure mais Consolar, que ser consolado; compreender, que ser compreendido; amar, que ser amado. Pois, é dando que se recebe, é perdoando que se é perdoado, e é morrendo que se vive para a vida eterna. Estamos todos à procura da paz. E São Francisco propõe-se ser este grande mensageiro de amor e paz. Dispõe-se a falar de amor, como os anjos. Propõe-se eliminar a discórdia. Quando passei a sentir a oração de São Francisco, e deixei de tentar entendê-la – porque arte não se entende, se sente -, vi que a autopoiesis da mesma é verdadeira e plena. E não há em seu contexto uma sofrer para que o outro seja feliz. Existe, ao contrário, um mergulho na essência. Se dou, receberei. E, se recebo, acabo doando. Amo, mas serei amado. Perdôo e serei perdoado. Ao morrer, para viver a vida eterna, posso sentir esta parte da oração como morte física ou emocional. E, em qualquer que seja a hipótese, será através da paz, do amor, do perdão, da LUZ, que terei a essência de meu ser. Quero muito amar. Mas é preciso dar amor para ser amado. Então, amo!
  • 31. E amo sem esperar nada em troca. Sou, então, amado. Eu dou sem querer receber, então recebo. Este milagre da vida é imperceptível, mas é de enorme profundidade. Na autopieisis eu não posso admitir inputs e outputs. Ao contrário, a vida é gerada por ela mesma. A teoria biológica de Humberto Maturana e Francisco Varela afirma que o organismo vive circularmente, ou seja, por ele e através dele, sem que se possa admitir a inserção de qualquer elemento estranho a interagir no corpo humano. A teoria avançou de tal forma, que no Direito se estuda o sistema autopoiético. Poesia tem seu radical em poesis. E, poesis é criação. Autopoiesis é auto- criação. É a essência do ser. Vivo porque vivo! A frase, em si, é autopoiética. Fui criado e mantenho-me em criação. Este circular de nossas vidas é que nos faz entender a essência. De que adianta, por exemplo, um perfume sem essência? De nada! Trata-se de álcool com água. E ambos evaporam-se. Mas a essência permite que se dê odor. Diante desta concepção autopoiética da oração de São Francisco, concebemos a essência como amor, poesia e sentimento. Não se pode deixar morrer a essência pela doação impensada, ou pelo egoísmo desenfreado. O egoísmo reside na perda de contato com a essência. Então
  • 32. podemos admitir que existe o auto-egoísmo quando pensamos mais nos outros do que em nós mesmos. Muito poderão afirmar que esta frase é egoísta! Einstein revolucionou o mundo com a sua teoria da relatividade8. Ao desenvolver a teoria da relatividade, Einstein consegue provar que a relação entre espaço e tempo não é de tal maneira imutável, quanto antes se admitia. Espaço e tempo são relativos. Para entendermos esta concepção de relatividade, imaginemos que estamos dentro de um avião, sem saber que lá estamos. Não temos a idéia se nossos pés se encontram em solo firme ou não. Mas é certo estarmos a mais de 10.000 metros de altura. Relatividade! Analisando a Biologia de Maturana e Varela e a Física de Einstein, quando penso em mim não estou sendo egoísta. Quando penso no outro, estou sendo egoísta. A partir do momento em que deixo de pensar em mim, sequer estou pensando no outro. Anulo-me para fazer o outro feliz. A concepção ocidental moderna afirmará que esta é a forma correta de viver: pensar no outro. Mas como conceber o pensar no outro anulando minha essência? A conseqüência é a imensa tristeza e a morte simbólica de minha essência. Esta morte poderá ser perpétua se não conseguir olhar internamente e descobrir minha essência. Então, se não penso em mim, não enxergo a essência e estou sendo profundamente egoísta. A poesis perdeu-se. Perdendo-se a poesis, não posso, sequer, admitir a autopoiesis. A poesia se foi. A criação se perdeu nela mesma. E então tenho uma autopoeisis destrutiva: mato-me e acabando anulando tudo à minha volta. O egoísmo como forma de atribuir aos outros a nossa insegurança é o maior erro da concepção ocidental moderna. Somente serei egoísta se não amar minha 8 Em Física, a relatividade geral é a generalização da Teoria da gravitação de Newton, publicada em 1915 por Albert Einstein e cuja base matemática foi desenvolvida pelo cientista francês Henri Poincaré. A nova teoria leva em consideração as idéias descobertas na Relatividade restrita sobre o espaço e o tempo e propõe a generalização do princípio da relatividade do movimento de referenciais em movimento uniforme para a relatividade do movimento mesmo entre referenciais em movimento acelerado. Esta generalização tem implicações profundas no nosso conhecimento do espaço-tempo, levando, entre outras conclusões, à de que a matéria (energia) curva o espaço e o tempo à sua volta. Isto é, a gravitação é um efeito da geometria do espaço-tempo. < http://pt.wikipedia.org/wiki/Teoria_Geral_da_Relatividade>
  • 33. essência. Serei, sim, egoísta, se fizer algo pelo próximo, sem admitir o alto preço que pagarei, porque, desta forma, estarei cobrando do outro o meu ceder. E esta é a gênese da oração de São Francisco: Ó Mestre, Fazei que eu procure mais Consolar, que ser consolado; compreender, que ser compreendido; amar, que ser amado. Pois, é dando que se recebe, é perdoando que se é perdoado, e é morrendo que se vive para a vida eterna. Compreender: sou eu quem compreendo e não o próximo. Amar: sou eu quem amo. Dando: sou eu quem dou. Perdoar: sou em quem perdôo. E, desta forma, tudo faço sem egoísmo. Compreendo minha essência, para amar e dar. Quando compreendo minha essência, perdôo sem que haja uma futura cobrança. Então, a partir do momento em que penso em mim enquanto essência e até em que ponto posso doar-me, não estou sendo egoísta, mas altruísta. Luís de Camões mostra-nos a autopoesis do amor em seus versos. E não existe amor maior que o amor à essência. Amor é fogo que arde sem se ver Amor é fogo que arde sem se ver; É ferida que dói e não se sente; É um contentamento descontente; É dor que desatina sem doer; É um não querer mais que bem querer; É solitário andar por entre a gente; É nunca contentar-se de contente;
  • 34. É cuidar que se ganha em se perder; É querer estar preso por vontade; É servir a quem vence, o vencedor; É ter com quem nos mata lealdade. Mas como causar pode seu favor Nos corações humanos amizade, Se tão contrário a si é o mesmo Amor? Luís de Camões Não tente compreender. Apenas sinta! O TRÁGICO DILEMA “Quando alguém pergunta a um autor o que este quis dizer, é porque um dos dois é burro.” Mario Quintana - NO CASAMENTO, NO NAMORO, NO AMOR, ENFIM, É PRECISO APAGAR PARTE DE SEU SER. E estabelecerei a minha aliança entre mim e ti e a tua descendência depois de Gênesis ti em suas gerações, por aliança perpétua, para te ser a ti por Deus, e à tua 17:7 descendência depois de ti. Ao casarmos criamos uma aliança com a pessoa amada. E aliança é união. União é compartilhar. Compartilhar é trocar. A essência pode ser transformada,
  • 35. mas jamais modificada. Casamento não é mudança, mas transformação. Quando esta química não existe, não se pode falar em aliança. Desta forma, não se pode conceber a morte ou modificação da essência pelo casamento. A palavra-chave é cumplicidade. E cumplicidade é entender e aceitar as mutações de cada um. Admitir que fogo e água podem se misturar sem que um anule o outro, mas que promovam transformações saudáveis. Se o vapor e o gelo são necessários, dependendo da situação em que nos encontremos, assim deve ser o casamento: uma alquimia! Mas nem sempre este sonho se consegue realizar, porque no casamento temos a idéia do egoísmo impregnada. Temos a exata sensação de que devemos nos anular, em benefício do outro. E esta não é a essência. Se um dos dois se anula, a conclusão será uma progressão geométrica: anulação vezes anulação. Não se trata de uma simples progressão aritmética! A anulação é de tal forma prejudicial à essência que a anulação de um provoca uma reação em cadeia de extrema anulação da própria aliança. E assim vai até a extinção total do casamento e dos pactos que se firmaram de juras e promessas. Mas como manter um relacionamento já impregnado pelas anulações? Será possível? Tudo é possível. Para Fernando Pessoa, “tudo vale à pena quando a alma não é pequena”. E, como essência e poesia têm muito em comum, Fernando Pessoa, ou Alberto Caeiro9, demonstram a dualidade da essência: O poeta é um fingidor, Finge tão completamente Que chega a fingir que é dor A dor que deveras sente. 9 Pessoa foi um gênio. Entre seus pseudônimos conseguia traduzir diversas formas de pensar.
  • 36. Fernando Pessoa Ser poeta não é uma ambição minha. É a minha maneira de estar sozinho Alberto Caeiro Em Fernando Pessoa temos a idéia do poeta, que de tão profundo, consegue mentir a sua dor. O mesmo pessoa, com o nome de Caeiro, justifica a busca da essência, porque nada melhor que estar sozinho para poder fazer parte da criação. E o casamento, muitas vezes, não permite este estar sozinho. É o egoísmo dado. O egoísmo de olhar o outro e para o outro, esquecendo-se de olhar para nós. O auto-egoísmo. Na aliança o que se pretende é a união. Mas o doar-se, integralmente, fruto de um pensamento ocidental extremamente massacrante e doentio, nos faz viver em função de, e não em função para. Quando vivemos em função de, estamos vivenciando a plenitude da inexistência. Quando vivemos para, ou em função para, caminhamos lado a lado e esta é a essência do casamento. Olhar juntos para frente! A pior frase já criada pelo ser humano é a de que atrás de um grande homem sempre tem uma grande mulher. Por que esta concepção? O homem não pode ser grande por ele? E se a mulher é grande, ela não pode demonstrar esta grandeza, mas servir-se de sombra ao homem? Isto não é casamento e não há orgulho para o homem que assim se vê ou para a mulher que assim se sente. ANULARAM-SE! Não existe poesia na frase, ainda que queiram justificar ser um grande elogio à mulher e forma de reconhecimento do homem! Mas que egoísmo profundo se encontra na frase. Se a mulher faz de seu homem grande, será que ela serviu de escada? E por que a frase não foi escrita de forma diversa?
  • 37. Por que a mulher não pode ser grande? Ou será que pode? Onde está a aliança? A união? A essência? A frase revela uma simbiose. E, nesta simbiose, água e fogo são destrutivos um para o outro: a água tentará apagar o fogo e o fogo tentará evaporar a água. Quando o casamento finda, talvez até por esta troca egoísta, as cobranças serão as mais violentas possíveis. Sempre um terá “mais razão” que o outro. Sempre um “deu mais que o outro”. Sempre um “foi melhor que o outro”. Sempre um “foi incompreendido”. Quantas frustrações se revelam na concepção moderna de união e quantas separações temos vivenciado pela perda da essência? Lembro-me bem do meu casamento, e, apesar de ser católico, foi um pastor protestante quem o celebrou. Ele disse: - O casamento, para dar certo, a mulher deve ser submissa ao homem! Confesso ter sentido um arrepio naquela frase. O que o pastor quis dizer? – Mulher, mate a sua essência. Assuma o seu casamento e esqueça-se da sua essência. Anule-se! E é neste anular-se ou tentar anular o outro que o casamento se perde. De aliança, cisão! E da cisão, os grandes conflitos, as grandes dores e a sensação de perda. O casamento se tornou tão importante na cultura ocidental que ele não pode ser desfeito, mesmo que a essência esteja morrendo, dia a dia. Mate-me, mas não deixe que o casamento termine! Minta a dor, seja um poeta sem poesia. Anule-se! Anulando-se, você está perdendo a sua essência e matando a essência daquele a quem se fez juras de amor, de permanência na doença, na alegria e na tristeza. Então, a miséria toma conta e a promessa de estar presente na bonança e na pobreza se perde, porque a pobreza que resta é da alma e a bonança que sobra é a do egoísmo.
  • 38. Mas a sociedade impinge esta necessidade de anulação. Se o pensamento for anárquico, que o seja. Mas eu afirmo que o pensamento não pode ser rotulado, assim como não se pode rotular o sentir! Sinta! Viva! Essencialize-se. Minta a morte que deveras sente! Seja poeta na poesia! Se mentires a morte, talvez encontres a essência. Se mentires a vida, também pode ser que encontres a essência. Mas se mentires o sentimento, jamais conseguirá alcançar a aliança. E a aliança, pelo fogo, se derrete. Pela água, machuca a mão. Pela terra, arranha. Pelo vento se perde! Pela quintessência, se perfeito for, algo de errado pode estar acontecendo, porque a perfeição não existe e não pode ser cobrada. Perfeição... o que será? ACRÓSTICO DA ESSÊNCIA Este meu pensar, perdido nos ventos da noite, para a lua que Sorri ao poeta. E este canta seus versos, procura a musa. Sobressai-se porque escreve, mas prefere os ensinamentos dos Essênios: pensar, refletir e viver. Iniciar uma jornada, Nadar no mais belo oceano, Cantar a poesia e não sentir-se pequeno diante de uma Ilha perdida, ou do grande Amor que se espera, porque o maior amor está na essência!
  • 39. A TERRA Estamos tão presos a conceitos e pré-conceitos que fixamos nosso pensamento na terra, como sementes plantadas e raízes profundas que nos prendem ao solo. Enquanto essência não podemos perder a noção de fixação, porque, caso contrário, também a perderíamos, mas a idéia de termos a planta e a raiz podem ser de extrema complexidade. A fixação de pensamentos, comparando-a com a raiz que se aprofunda, é um dos maiores problemas para a libertação da essência. Precisamos compreender o nosso ser para identificar a nossa origem. Ou identificar a nossa origem para a compreensão do ser. Não posso imputar a minha existência a quem quer que seja a não ser, biologicamente a meus pais, e metafisicamente, a Deus. Admitir que fixo-me em virtude de uma outra pessoa é a morte da essência pela raiz. Então, estamos tratando de ego10. Pior ainda quando lidamos com o superego, que é a morte plena da essência. Ao admitirmos o superego, que é o controle dos impulsos pelos padrões societários, matamos a nossa essência, porque dependemos da aprovação. E estamos tão presos ao solo, que não dissociamos a idéia do elemento terra. O superego “faz parte do aparelho psíquico da psicanálise freudiana de que ainda fazem parte o ego (eu) e o id. Representa a censura das pulsões que a sociedade e a cultura impõem ao id, impedindo-o de satisfazer plenamente os seus instintos e desejos. É a repressão, particularmente, a repressão sexual. Manifesta-se à consciência indiretamente, sob forma da moral, como um conjunto de interdições e 10 Ego é o centro da consciência inferior, diferente do Eu que é centro superior da consciência. O Ego é a soma total dos pensamentos, idéias, sentimentos, lembranças e percepções sensoriais. É a parte mais superficial do indivíduo, a qual, modificada e tornada consciente, tem por funções a comprovação da realidade e a aceitação, mediante seleção e controle, de parte dos desejos e exigências procedentes dos impulsos que emanam do indivíduo. Obedece ao princípio da realidade, ou seja, à necessidade de encontrar objetos que possam satisfazer ao id sem transgredir as exigências do superego. Quando o ego se submete ao id, torna-se imoral e destrutivo; ao se submeter ao superego, enlouquece de desespero, pois viverá numa insatisfação insuportável; se não se submeter ao mundo, será destruído por ele. Para Jung, o Ego é um complexo; o “complexo do ego”. Diz ele, sobre o Ego: “É um dado complexo formado primeiramente por uma percepção geral de nosso corpo e existência e, a seguir, pelos registros de nossa memória”. <http://pt.wikipedia.org/wiki/Ego>
  • 40. deveres, e por meio da educação, pela produção do quot;eu idealquot;, isto é, da pessoa moral, boa e virtuosa “11. A sociedade é um conjunto, um todo. A sociedade da informação tecnológica ampliou imensamente este conceito e uma nova sociedade vem sendo moldada (ou já se moldou). Vivemos a Cibercultura de forma ampla. São novos conceitos e novos desafios. A Internet proporcionou o intercâmbio imediato e globalizado de idéias e pensamentos. Os conceitos – ou dogmas – de repressão vêm se perdendo. A criminalidade, por outro lado, aumenta na mesma proporção. São novos tempos e novas formas de pensar. A Cibercultura modifica o pensamento ocidental. Na China, por exemplo, a Internet é censurada. Então, diante desta nova concepção de sociedade, com torpedos12, e-mail, conversas em tempo real e pelo mundo, videoconferência, enfim, diversos mecanismos tecnológicos dispostos ao homem, também perdemos um pouco o contato com a essência. A rapidez com que nos comunicamos e mudamos de pensamento, afasta do ser a busca de sua essência. A tecnologia deve ser concebida para auxiliar o homem e não para modificar o homem. Mas o superego começa a se desenvolver de forma diversa. Se os conceitos societários se modificam, tratamos da ética de forma diversa. Então, devemos pensar novos conceitos e novas idéias para mantermos a essência. A Cibercultura neste ponto pode ser revolucionária: quebrar determinados conceitos que nos impõem busca pelo superego = necessidade de aplauso externo. E o que seria dentro desta necessidade de aplauso externo a impulsividade? Em determinados momentos o impulsivo é aquele que diz o que pensa e faz o que deseja, sem qualquer freio. Mas a pergunta é: em determinados momentos isto não é saudável? 11 <http://pt.wikipedia.org/wiki/Superego> 12 SMS – short message system (serviço de mensagens curtas)
  • 41. Sim. Dês que eu tenha a plena consciência do preço que pagarei. Se o preço for a mantença de minha essência não vou conceber o controle do que denominam impulso. Estarei preso a terra, com raiz profunda e uma tristeza inconsolável. Mas se o preço for a morte de minha essência, posso controlar meu impulso. Não existe uma fórmula para identificarmos o preço a ser pago, mas em termos de sentimentos, o controle extremo por conta do superego é causa de tristezas. Quando nos libertamos dos pensamos impostos pelos outros, somos mais felizes. Ora, se eu sou um escritor técnico e desenvolvo obras na minha área de conhecimento, por que preciso temer e escrever sobre essência? Em determinadas comunidades as críticas serão acirradas, porque um escritor técnico deve ser um escritor técnico = superego. Mas, por outro lado, esta mesma comunidade não me dá a oportunidade de libertar a minha essência através da escrita. Então, não admito como impulsividade escrever. E escrever em áreas que não são as que escrevo tecnicamente. Liberto a minha essência, em sua plenitude, quando aventuro-me pelas linhas da escrita. E isto faz-me bem. Não me importa, então, as críticas. Não pago um preço por isto. Contudo, se meu impulso é a necessidade de conter meu semelhante, não estou tratando de superego, porque, apesar de ser passível de crítica pela sociedade, estou matando a essência do ser. A dicotomia impulso x sentimento ainda é uma grande descoberta que compete aos poetas da psicologia. E sentimento, aqui, deve ser lido como essência. A idéia de termos um preço a pagar não é mentirosa, mas precisamos saber se o nosso caixa tem suporte para este preço. Admito que o preço mais caro seja o embotamento da essência! A terra, então, pode ser o símbolo de prisão, ou de criação. A terra, com a água, germina. A terra, com o fogo, perde a essência, os nutrientes e nada mais nasce. Qual a terra onde desejamos estar? A da criação, que faz parte da própria essência.
  • 42. Em algumas sociedades iniciáticas pode-se ler, em determinado momento da iniciação, o anagrama VITRIOL, transportado da Alquimia. Em verdade, V.I.T.R.I.O.L. que é a abreviação de VISITA INTERIOREM TERRAE RECTIFICANDOQUE INVENIES OCCULTUM LAPIDEM - Visita o Interior da Terra Retificando Encontrarás a Pedra Oculta – procura a busca da pedra oculta. No Cristianismo a busca do Santo Graal. A terra, ou o elemento terra, não precisa ser símbolo de prisão, pelas raízes que provoca. E é porque a partir do momento em que visito o interior da terra e retificando-me encontrarei a pedra oculta, ainda mais quando se está diante de um drama iniciático, o que procuro é a minha essência. Preciso morrer para o mundo profano e renascer para uma nova realidade. Esta a idéia passada pelos mais diversos cerimoniais de iniciação. Os bantus são negros da África. A denominação bantus deriva da necessidade de distinção entre dois grupos étnicos africanos. Nos bantus há um cerimonial de iniciação e o iniciado é inserido em uma pedra com o formato do útero. Fica o iniciado em posição fetal, em determinado momento da cerimônia, até que, para ser aceito nos mistérios, uma parte é aberta e a pessoa cai. O símbolo presente é o do nascimento. O iniciado, enquanto preso na pedra, em formato de útero, morrera para o mundo profano dos bantus, até nascer para os rituais e símbolos próprios da sociedade.
  • 43. Sempre teremos a imagem de busca do ser. A iniciação, o batismo – que limpa o pecado original, no catolicismo -, a primeira comunhão, enfim, sempre estamos à busca de nossa essência. Aprofundar-se na terra e procurar a pedra oculta nada mais é que um forte símbolo de busca interior. O homem vive nesta busca incessante pela felicidade. E a felicidade, pela cultura imposta pelo próprio homem, aprisionando o ego pelo superego, é possuir muito dinheiro, ser realizado profissionalmente etc. Diversos livros de auto-ajuda estão à venda para ter sucesso sozinho ou em conjunto, para enriquecer, para neutralizar o pensamento do ser humano e pela neurolinquística o fazer repetir tantas vezes uma determinada frase que o superego aceitará e parecerá que está feliz. Determinar a alcançar metas! Quais metas? As minhas ou as que a sociedade impõe? Repito que o discurso não é anarquista. O discurso é mais profundo. O discurso é a busca do eu, da essência, de quem eu sou. Não preciso saber de onde vim e para onde eu vou, porque isto é a morte da essência. E perco muito tempo em tentar entender estas questões que transcendem qualquer conhecimento. Mas eu posso procurar – e encontrar – a minha essência. E não precisarei buscar dinheiro, realização profissional etc. Quando encontrar a essência, a felicidade será plena e a conseqüência serão as necessidades básicas que possuímos. Trata-se, novamente, da autopoiesis. Se eu não encontro minha essência, não consigo ser feliz, e, se não consigo ser feliz, não tenho como realizar-me profissionalmente, e, desta forma, não consigo manter minha família, ou comprar aquele carro que eu quero. O dinheiro, a realização profissional e os demais bens que o superego me impõe não são a necessidade básica. Será apenas conseqüência! E a essência, esta sim, não pode ser conseqüência. Um problema a ser enfrentado pela psicanálise moderna. Por que tantas pessoas se encontram infelizes? O mundo cresceu com o advento da tecnologia e da modificação societária. Mas, por outro lado, informação e contatos em excesso acabaram por provocar um efeito interessante na Cibercultura: a desinformação e a
  • 44. desmaterialização das relações. A essência não se apresenta tão importante, porque o externo é mais importante: meu computador, meu celular, meu tênis... meu... meu... E o eu? Esta a grande pergunta que todos deveria fazer. Ser! Esta a necessidade. Ter! Uma mera conseqüência. Em texto intitulado Entre a Psicanálise e a Arte, Noemi Moritz Kon afirma que “é, portanto, contra a noção geral de latência, que nos impele a pensar numa essência a ser desvendada, que nos propomos, quando admitimos, sem ambigüidades, a força criadora do imaginário. O fazer psicanalítico perde, então, o seu caráter de tradução de sentidos dissimulados, tornando-se, assim, desde esta perspectiva, um fazer criador, que não está para decifrar um código de ocultamento de um conhecimento presente, mas esquecido, mas sim, para criar, num encontro psicanalítico fundante, os múltiplos sentidos de realidades singulares inéditas. O encontro com a produção artística atual, e com a crítica que lhe segue, pode nos permitir, então, que vislumbremos, como que em câmera lenta, este gesto criador presente, mas tantas vezes temido, na própria experiência psicanalítica. É Paul Klee, pintor suíço, quem nos permite, quase que num mantra, ressaltar sinteticamente o que viemos propondo até então. Diz ele: quot;A arte não reproduz o visível, faz visívelquot;13 . A frase pode ser transmutada, porque: a essência não se reproduz. Ela precisa estar visível. E a partir do momento em que concebemos a arte, pela teoria freudiana, como sendo um marco para os mais profundos mergulhos no interior da terra, em busca da pedra oculta, admitimos o belo como fonte. E do belo extraímos a nossa essência. As doenças podem ser curadas se enfrentarmos a essência. 13 http://www.antroposmoderno.com/textos/Entre.shtml
  • 45. Pela essência, pela fórmula básica de nossa criação, não somos um rótulo ou uma condição. Não podemos estar à frente de uma neurose coletiva, a imputar termos como impulsividade para tratar de sentimento. Ou de pânico para tratar determinados distúrbios de ansiedade, ou, mesmo, admitir que a bipolaridade é um foco de distorções sensitivas. A essência faz com que caminhemos em busca da pedra oculta, do Santo Graal, do mergulho interior à terra. Necessitamos de água, de ar, de terra e de fogo. Unindo os quatro elementos, teremos parte do que seja a essência. Mas não podemos admitir a quintessência como fonte, porque a perfeição não existe nem mesmo na essência. No recanto profundo da alma existe a essência. No recanto de nossos mais sórdidos pensamentos, reside a essência. Mas na beleza da demonstração de nosso ser, aqui, sim, está a pura essência. Ela não precisa ser bela, mas precisa ser vivenciada e sentida. A essência embotada é a doença aflorada. A impulsividade, a neurose ansiosa, enfim, males da alma e da mente podem ser embotamento da essência. OS MALES E O SUPEREGO A sociedade se apresenta como a grande vilã para o embotamento da essência. A semente, quando devidamente plantada, cuidada, com os elementos vívidos: água, terra, ar e fogo (aqui, leia-se calor), produzirá a mais bela planta ou o mais gostoso dos legumes. Assim somos nós. Se tratados, na essência, como devemos, podemos ser belos. Contudo, se vivermos para os conceitos da sociedade, estamos impregnando de agrotóxico a nossa plantação. Na Idade Média as mulheres cortavam costelas para poderem caber em vestidos. Os espartilhos causavam as dores mais insuportáveis, porque a cintura deveria
  • 46. ser de tal forma fina, para agradar aos gostos, que a moda passou a ditar, inclusive, o bem estar das pessoas. O espartilho, hoje, se visualizado como símbolo de desejo e fantasia, não causa dor, mas gozo. Quanto às costelas, não dá para conceber tamanho sacrifício. Mas a sociedade é esta geradora de conceitos e pré-conceitos que nos impedem de aprofundarmo-nos em nosso ser. Ir ao centro da terra. Procurar a pedra oculta. Os Cavaleiros Templários, por séculos, cuidaram do caminho sagrado, e, simbolicamente, protegiam o Santo Graal, até não interessarem mais para a Igreja Católica e serem queimados como hereges. Em momentos graves das cruzadas, os Templários foram a força da Igreja, até o ponto em que chegaram próximo de sua perfeição enquanto cavaleiros. A morte dos Templários deve ser concebida como um símbolo. A perfeição, para o modelo de sociedade que se prega em determinado momento, é causador de dores e sacrifícios. Mas não precisamos matar a nossa essência. Nem mesmo simbolicamente. Reprimimos os nossos desejos e quando os liberamos ganhamos o rótulo da impulsividade. Pisemos no solo, na terra, de pés descalços! Deixemos que a sensação do formigamento nos tome conta, naquele momento. Esfreguemos os pés no chão e deixemos que a energia da terra tome conta de nós. Uma brincadeira de criança. E, como sempre nos perguntamos, por que crescemos? É o mito de Peter Pan que nos assola, o tempo todo. Podemos, sim, ser Peter Pan nos momentos mais doces da vida, como o simples esfregar do pé no chão e sentir o sal da terra. Mas podemos nos perder, enquanto essência, se deixarmos Peter Pan dominar nossas vidas e não nos permitir crescer, porque a essência, como a semente que se planta em solo fértil, necessita crescer e se comunicar com outras essências. Temos a transformação, mas não a mudança. A flor possui sua essência na semente e será esta essência quem demonstrará se ela é bela ou não.
  • 47. Os nossos pensamentos, de Alice, por exemplo, nos conduz a um país das maravilhas, mas é preciso encararmos a vida pelos nossos pensamentos e nossas vontades. Vontade... A verdadeira vontade, encontrada na essência, é a necessidade de realização de encontro com a pedra oculta. A vontade, por outro lado, de algo intangível ou imaginário, é a busca de Peter Pan e Alice. São personagens fortes em nosso imaginário, que não precisam estar escondidos, mas que precisam se apresentar em momentos de afloramento da essência. Quando estou brincando com meus filhos, tenho que ser Peter Pan e aqueles minutos são mágicos. Quando estou triste, preciso cair no país das maravilhas e procurar meu grande amigo coelho. São mitos, são símbolos, mas são a fuga necessária da essência em determinados momentos. Nestes momentos, podemos agir ou não com impulsividade. Mas a impulsividade não pode ser aquele padrão esteriotipado da sociedade, porque, se assim o for, deveriam as mulheres continuar a quebrar suas costelas para entrar no vestido. Eu admito ser mais fácil moldar o vestido a sacrificar o meu corpo. Os Templários não precisavam construir um enorme caminho, ligando a Europa à Ásia. Mas fizeram, em amor à essência que os impulsionava. E os mitos gerados contra os Templários fizeram com que a essência pura da busca pelo Graal se perdesse. Nós somos o Graal, a Pedra Oculta, Alice e Peter Pan. Mas enquanto vivermos presos aos conceitos impostos, pelos pensamentos de cada momento histórico, estaremos sempre em busca de nossa essência. Ou, acaso sejamos dotados da coragem dos Templários, da pureza de Peter Pan14, ou do 14 Parece-me que Fernando Pessoa, em seu pseudônimo Bernardo Soares, traduz o meu sentir de Peter Pan: “quot;O sonhador não é superior ao homem activo porque o sonho seja superior à realidade. A superioridade do sonhador consiste em que sonhar é muito mais prático que viver, e em que o sonhador
  • 48. encantamento de Alice, podemos dar um basta aos pensamentos ocidentais e procurarmos no símbolo do taoísmo a nossa essência. ☯ Como conceber o TAO como representação da essência? Ora, se o TAO, em si, é dual, nossa essência também é. E é por esta razão que descartamos a quintessência como existência do ser. Ou como interpretação para a transmutação do quinto elemento. A partir da imagem do TAO, enquanto essência, podemos ser bons e maus. Amorosos e revoltosos. Amigos e inimigos. Em todo o ser existe a dualidade. Sentir e não sentir. Mas, entre sentir e não sentir temos a grande inquietação do ser, e da essência. Por que tenho que sentir o que não me permitem sentir? E quando sinto, o que apenas sinto, não me deixam apenas sentir? Por que é preciso sentir, sem sentir? E por que não sentir se me mandam sentir? Arte e poesia são parte de nossa essência. E Fernando Pessoa foi um mestre. Alguns textos de Do Livro do Desassossego, com o pseudônimo Bernardo Soares, Pessoa nos provoca uma enorme introspecção: quot;O coração, se pudesse pensar, pararia.quot; quot;Tudo me interessa e nada me prende. Atendo a tudo sonhando sempre; fixo os mínimos gestos faciais de com quem falo, recolho as entoações milimétricas dos seus dizeres expressos; mas ao ouvi-lo, não o escuto, estou pensando noutra coisa, e o que menos colhi da conversa foi a noção extrai da vidaum prazer muito mais vasto e muito mais variado do que o homem de acção. Em melhores e muito mais directas palavras, o sonhador é que é o homem de acção. Sendo a vida essencialmente um estado mental, e tudo, quanto fazemos ou pensamos, válido para nós na proporção em que o pensamos válido, depende de nós a valorização. O sonhador é um emissor de notas, e as notas que emite correm na cidade do seu espírito do mesmo modo que as da realidade.quot;
  • 49. do que nela se disse, da minha parte ou da parte de com quem falei. Assim, muitas vezes, repito a alguém o que já lhe repeti, pergunto-lhe de novo aquilo a que ele já me respondeu; mas posso descrever, em quatro palavras fotográficas, o semblante muscular com que ele disse o que me não lembra, ou a inclinação de ouvir com os olhos com que recebeu a narrativa que me não recordava ter-lhe feito. Sou dois, e ambos têm a distância – irmãos siameses que não estão pegados.quot; quot;Tenho fome da extensão do tempo, e quero ser eu sem condições.quot; quot;Pesa-me, realmente me pesa, como uma condenação a conhecer, esta noção repentina da minha individualidade verdadeira, dessa que andou sempre viajando sonolentamente entre o que sente e o que vê.quot; quot;Sou do tamanho do que vejo!quot;Cada vez que penso esta frase com toda a atenção dos meus nervos, ela me parece mais destinada a reconstruir consteladamente o universo. quot;Sou do tamanho do que vejo!quot; Que grande posse mental vai desde o poço das emoções profundas até às altas estrelas que se reflectem nele e, assim, em certo modo, ali estão. E já agora, consciente de saber ver, olho a vasta metafísica objectiva dos céus todos com uma segurança que me dá vontade de morrer cantando. quot;Sou do tamanho do que vejo!quot; E o vago luar, inteiramente meu, começa a estragar de vago o azul meio-negro do horizonte. Tenho vontade de erguer os braços e gritar coisas de uma selvageria ignorada, de dizer palavras aos mistérios altos, de afirmar uma nova personalidade larga aos grandes espaços da matéria vazia. Mas recolho-me e abrando-me. quot;Sou do tamanho do que vejo!quot; E a frase fica sendo-me a alma inteira, encosto a ela todas as emoções que sinto, e sobre mim, por dentro, como sobre a cidade por fora, cai a paz indecifrável do luar duro que começa largo com o anoitecer.quot; quot;Aquilo que, creio, produz em mim o sentimento profundo, em que vivo, de incongruência com os outros, é que a maioria pensa com a sensibilidade, e eu sinto com o pensamento.
  • 50. Para o homem vulgar, sentir é viver e pensar é saber viver. Para mim, pensar é viver e sentir não é mais que o alimento de pensar.quot; quot;Meditei hoje, num intervalo de sentir, na forma de prosa de que uso. Em verdade, como escrevo? Tive, como muitos têm tido, a vontade pervertida de querer ter um sistema e uma norma. É certo que escrevi antes da norma e do sistema; nisso, porém, não sou diferente dos outros. Analisando-me à tarde, descubro que o meu sistema de estilo assenta em dois princípios, e imediatamente, e à boa maneira dos bons clássicos, erijo esses dois princípios em fundamentos gerais de todo estilo: dizer o que se sente exactamente como se sente - claramente, se é claro; obscuramente, se é obscuro; confusamente, se é confuso - ; compreender que a gramática é um instrumento, e não uma lei.quot; Nós somos essência, e, como essência, precisamos de ar e “O vento levantou-se...Primeiro era como a voz de um vácuo...um soprar no espaço para dentro de um buraco, uma falta no silêncio do ar. Depois ergueu-se um soluço, um soluço do fundo do mundo, o sentir-se que tremiam vidraças e que era realmente vento. Depois soou mais alto, urro surdo, um chocar sem ser ante o aumentar nocturno, um ranger de coisas, um cair de bocados, um átomo de fim do mundo.15quot; A ESSÊNCIA E O AR Não me parece haver, através dos quatro elementos, algo que me dê mais liberdade que o ar. E entender o ar, como o último elemento a ser analisado na essência e na dualidade do ser, parece-me a libertação de todo o sentir humano. Estou muito preso! E estou sentindo-me preso. A sociedade está, a cada dia, exigindo mais e mais de nossos sentidos e nos obrigando a nos afastar da essência. Se não posso estar solto em minha existência, de nada me adianta pensar na essência. Se a psicanálise não consegue explicar o sentir pelo sentir, ou se a arte não tem mais importância, pergunto-me por que discutir tanto sobre a essência e o existir? 15 Do Livro do Desassossego - Bernardo Soares - Bernardo Soares (heterônimo de Fernando Pessoa)
  • 51. Por que a prisão na terra, pela raiz? Por que não conceber que a mesma terra pode gerar-me a mais bela colheita de lírios do campo. Ah! Olhai os lírios do campo e procure neles a sua essência. Se não encontrares a tua essência dentre os lírios do campo, voe como Fernão Capelo Gaivota, que arriscou a sua vida em sociedade para provar que poderia ser diferente e alçar vôos mais altos que as demais gaivotas. Ou, então, apegue-se ao Pequeno Príncipe e viaje por universos desconhecidos. Mas viva pelo ar! Sinta pela terra! Purifique-se pela água! E ame como o fogo! Em Mateus, 5, Jesus nos apresenta a grande sabedoria da existência. Ainda que o drama bíblico seja deveras forte, não pretendo traduzir o pensamento, mas, diante da essência, pretendo sentir o que Ele nos apresentou em seus ensinamentos: 1 E Jesus, vendo a multidão, subiu a um monte, e, assentando-se, aproximaram-se dele os seus discípulos; 2 E, abrindo a sua boca, os ensinava, dizendo: 3 Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reino dos céus; 4 Bem-aventurados os que choram, porque eles serão consolados; 5 Bem-aventurados os mansos, porque eles herdarão a terra; 6 Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque eles serão fartos; 7 Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia; 8 Bem-aventurados os limpos de coração, porque eles verão a Deus; 9 Bem-aventurados os pacificadores, porque eles serão chamados filhos de Deus; 10 Bem-aventurados os que sofrem perseguição por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus; 11 Bem-aventurados sois vós, quando vos injuriarem e perseguirem e, mentindo, disserem todo o mal contra vós por minha causa. 12 Exultai e alegrai-vos, porque é grande o vosso galardão nos céus; porque assim perseguiram os profetas que foram antes de vós. 13 Vós sois o sal da terra; e se o sal for insípido, com que se há de salgar? Para nada mais presta senão para se lançar fora, e ser pisado pelos homens. 14 Vós sois a luz do mundo; não se pode esconder uma cidade edificada sobre um monte; 15 Nem se acende a candeia e se coloca debaixo do alqueire, mas no velador, e dá luz a
  • 52. todos que estão na casa. 16 Assim resplandeça a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai, que está nos céus. 17 Não cuideis que vim destruir a lei ou os profetas: não vim ab-rogar, mas cumprir. 18 Porque em verdade vos digo que, até que o céu e a terra passem, nem um jota ou um til se omitirá da lei, sem que tudo seja cumprido. 19 Qualquer, pois, que violar um destes mandamentos, por menor que seja, e assim ensinar aos homens, será chamado o menor no reino dos céus; aquele, porém, que os cumprir e ensinar será chamado grande no reino dos céus. 20 Porque vos digo que, se a vossa justiça não exceder a dos escribas e fariseus, de modo nenhum entrareis no reino dos céus. 21 Ouvistes que foi dito aos antigos: Não matarás; mas qualquer que matar será réu de juízo. 22 Eu, porém, vos digo que qualquer que, sem motivo, se encolerizar contra seu irmão, será réu de juízo; e qualquer que disser a seu irmão: Raca, será réu do sinédrio; e qualquer que lhe disser: Louco, será réu do fogo do inferno. 23 Portanto, se trouxeres a tua oferta ao altar, e aí te lembrares de que teu irmão tem alguma coisa contra ti, 24 Deixa ali diante do altar a tua oferta, e vai reconciliar-te primeiro com teu irmão e, depois, vem e apresenta a tua oferta. 25 Concilia-te depressa com o teu adversário, enquanto estás no caminho com ele, para que não aconteça que o adversário te entregue ao juiz, e o juiz te entregue ao oficial, e te encerrem na prisão. 26 Em verdade te digo que de maneira nenhuma sairás dali enquanto não pagares o último ceitil. 27 Ouvistes que foi dito aos antigos: Não cometerás adultério. 28 Eu, porém, vos digo, que qualquer que atentar numa mulher para a cobiçar, já em seu coração cometeu adultério com ela. 29 Portanto, se o teu olho direito te escandalizar, arranca-o e atira-o para longe de ti; pois te é melhor que se perca um dos teus membros do que seja todo o teu corpo lançado no inferno. 30 E, se a tua mão direita te escandalizar, corta-a e atira-a para longe de ti, porque te é melhor que um dos teus membros se perca do que seja todo o teu corpo lançado no inferno. 31 Também foi dito: Qualquer que deixar sua mulher, dê-lhe carta de desquite. 32 Eu, porém, vos digo que qualquer que repudiar sua mulher, a não ser por causa de prostituição, faz que ela cometa adultério, e qualquer que casar com a repudiada comete adultério. 33 Outrossim, ouvistes que foi dito aos antigos: Não perjurarás, mas cumprirás os teus juramentos ao Senhor. 34 Eu, porém, vos digo que de maneira nenhuma jureis; nem pelo céu, porque é o trono de Deus; 35 Nem pela terra, porque é o escabelo de seus pés; nem por Jerusalém, porque é a cidade do grande Rei; 36 Nem jurarás pela tua cabeça, porque não podes tornar um cabelo branco ou preto. 37 Seja, porém, o vosso falar: Sim, sim; Não, não; porque o que passa disto é de procedência maligna. 38 Ouvistes que foi
  • 53. dito: Olho por olho, e dente por dente. 39 Eu, porém, vos digo que não resistais ao mal; mas, se qualquer te bater na face direita, oferece-lhe também a outra; 40 E, ao que quiser pleitear contigo, e tirar-te a túnica, larga-lhe também a capa; 41 E, se qualquer te obrigar a caminhar uma milha, vai com ele duas. 42 Dá a quem te pedir, e não te desvies daquele que quiser que lhe emprestes. 43 Ouvistes que foi dito: Amarás o teu próximo, e odiarás o teu inimigo. 44 Eu, porém, vos digo: Amai a vossos inimigos, bendizei os que vos maldizem, fazei bem aos que vos odeiam, e orai pelos que vos maltratam e vos perseguem; para que sejais filhos do vosso Pai que está nos céus; 45 Porque faz que o seu sol se levante sobre maus e bons, e a chuva desça sobre justos e injustos. 46 Pois, se amardes os que vos amam, que galardão tereis? Não fazem os publicanos também o mesmo? 47 E, se saudardes unicamente os vossos irmãos, que fazeis de mais? Não fazem os publicanos também assim? 48 Sede vós pois perfeitos, como é perfeito o vosso Pai que está nos céus. Do pai, a semente. Da semente, o fruto. O fruto: essência. A perfeição, concebida pelo pensamento, não pode ser admitida como o não errar, mas como a busca interior da própria essência, da pedra oculta, do Santo Graal. Não será pelo sacrifício que nossa essência será perdoada, mas porque guardando o que há de melhor em nossa essência, poderemos ser livres como o ar. “8 Bem-aventurados os limpos de coração, porque eles verão a Deus”, ou, porque estamos em essência, somos bem-aventurados porque nos encontramos. Se, através de um antropomorfismo, somos feitos imagem e semelhança de Deus, por que não concebermos o nosso encontro conosco? Limpo de coração, mergulhado na minha essência, sou a presença de Deus. Ou, sou homem, feito à sua imagem e semelhança. E se pelo sopro nascemos. Se do pó viemos e ao pó retornaremos, o ar nos deixa flutuar por nossa existência. A bem-aventurança está na conquista da liberdade da essência. E se minha parceira pretende que minha essência se modifique, é porque nela não existe a vontade de que o sol nasça para os bons e os maus. E se há maldade na essência, esta vida poderá ser tão penosa quanto a própria maldade da existência. Mas mesmo os maus possuem algo de bom e é importante compreender a essência para que a bondade aflore: ☯. E não há beleza maior para nossos ser do que perdoar. A partir do momento em que concebo o perdão, em essência, digo a mim mesmo que meu inimigo
  • 54. não conseguiu atingir a minha essência. Ele pode ter provocado meu superego, mas jamais conseguiu atingir-me nas profundezas da pedra oculta, porque a ele não pertence. Então, sequer preciso perdoar ou compreender os atos de meu inimigo, porque se inimigo é, ausente de minha essência ele se encontra. Ao visualizar a multidão, Jesus apresentou, a todos, a essência. O drama há de ser concebido pela época de pela forma como vivia o povo judeu, aprisionado pelos imperadores. Jesus foi um revolucionário que trouxe à Terra o amor e as palavras de amor. Ainda que embanhadas em certo temor Divino, as palavras nos remetem a um grande pensar: as espadas contra os inimigos. A colheita, o sal da Terra. Quais são as nossas concepções diante da existência humana? Se dou tanta atenção ao meu inimigo,é porque estou encarando-o como sendo superior a mim. Em Filipenses, 2:3, temos a noção de respeito: “ Nada façais por contenda ou por vanglória, mas por humildade; cada um considere os outros superiores a si mesmo.” Respeito à minha essência. Respeito à essência do outro. E uma exata noção de que ao nos defrontarmos com o inimigo – e, aqui, vamos tratar de algumas espécies de inimigos – não devemos nos sentir superiores. Mergulhemos em nossa essência. O ar, enquanto elemento, em sua integração com os demais elementos, nos proporciona a liberdade do ser. E os nossos inimigos podem querem embotar o nosso voar. Impedir que sejamos corajosos como Fernão Capelo Gaivota... OS INIMIGOS E A ESSÊNCIA Quem são nossos inimigos? Quem são os inimigos da essência? Eu posso ter como inimigo o meu maior amigo, se ele pretender embotar a minha essência. Amigo não é aquele que está ao meu lado para aplaudir-me quando erro, mas ser crítico. A minha parceira pode ser uma grande inimiga quando tenta sufocar a minha existência. O ciúme, ainda que no romantismo se traduza como símbolo de amor, pode ser o inimigo da essência.
  • 55. A essência vive da emoção, mas não pela emoção. Enquanto seres viventes, somos plenos e capazes em emoções e nossas doenças, muitas vezes, são fruto de emoções. O budismo possui em um dos seus patamares de ensinamento o Jitai Kensho, que, em breves palavras, significa: “O conceito budista de sabedoria e individualidade indica uma real forma de conduzirmos a vida. Jitai se refere ao indivíduo com as suas características próprias e Kensho se refere ao estado na qual este ser brilha e se manifesta de forma clara.16” Quais são as características próprias senão a própria essência? E este estado que é a descoberta da essência. Conta uma determinada lenda que dois peregrinos procuravam a luz. E, ao procurarem, descobriram que no alto de uma montanha havia um monge, dotado de grande luz e sabedoria. Os peregrinos alcançaram o alto do monte e passaram a seguir o mestre. Em determinado dia, um dos peregrinos disse ao outro: - Eu vou embora! - Mas como? Nós encontramos a luz que tanto procurávamos e você vai embora? – replicou o outro. - Sim. Encontrei uma pessoa que ensinou-me a ver a minha luz. Então, este é o momento de partir! A luz está em nossa essência e não em uma determinada pessoa. E é por isto que encontramos inimigos, ainda que o termo não seja apropriado para tratarmos de pessoas tão próximas e que nos são muito caras. O resumo: “quando a luz do Nam-myoho-rengue-kyo brilha interiormente, as características individuais brilham de forma radiante. Em contrapartida, quando não há luz suficiente, em algumas ocasiões os aspectos positivos não se tornam aparentes ou em outros, o aspecto negativo é que se torna mais aparente. 16 http://www.vertex.com.br/users/san/jitai.htm - Fonte: Yasashi Kyogaku pg. 53
  • 56. Por fim, como seguidores da filosofia budista de Nitiren, não podemos encerrar a nossa existência no arrependimento de não ter sido possível manifestar todo o nosso potencial e através da Lei Mística podemos fazer brilhar todas as nossas habilidades individuais e edificar o mais elevado estado de vida17.” Assim é que podemos ter na sociedade a grande inimiga da existência do ser. A grande inimiga da essência. Mas não apenas nesta sociedade simbiótica, manipuladora e extremamente consumista, que esquece o ser, para dar valor ao ter. Também encontramos inimigos em nossos grandes amigos, na esposa ou no marido, na família, no trabalho, enfim, sempre poderemos ter inimigos se assim nós permitimos. E não são inimigos no sentido stricto da palavra, mas enquanto inimigos da essência. Ao embotarmos nossos mais puros sentimentos por pré-conceitos, estamos dando tanto valor ao outro, que a nossa luz se apaga e passamos a viver a luz do outro. Esta não é a busca da pedra oculta, ou da nossa essência. Esta é a aniquilação de nosso ser. Mas não podemos ser egoístas, certo? E o que é ser egoísta? Imaginemos, então, que estamos tratando de macros. A macro-economia pode nos apontar uma tendência a aplicar na bolsa. Eu tenho duas opções: acompanhar ou macro ou optar por outro investimento. Se optar por outro investimento, estou trabalhando no micro e posso perder tudo. Então, pelos conceitos vulgares da sociedade, estaria sendo chamado de burro, ou outro termo do gênero. Mas eu quis seguir o micro e paguei o meu preço por ele. Mas e se o micro der lucro e a tendência do macro for uma grande perda? Ah! Passei a ser um gênio. No campo dos sentimentos podemos agir da mesma forma, ou seja, mantermos, por exemplo, um casamento falido, porque o macro age desta forma e não me permitirão admitir que o micro, aquele sentimento que somente eu sinto, possa ser aflorado. Eu prefiro, então, em prol do macro, deixar o micro de lado. Mas eu preciso 17 Idem