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A sombra do Mackenzie -
Com 40 anos de profissão, fui
humilhado por ex-colegas de
trabalho e caluniado na
redação do Diário do
Comercio (SP)
 Publicado em Publicado em22 de agosto de 2017
A experiência de um jornalista com o Diário do Comércio de São
Paulo
“Da minha humilhação farei uma catedral.” (Jean Genet)
"Tenho mais lembranças do que se tivesse mil anos" (Charles
Baudelaire)
Clarificada pelo tempo, que comigo age ao contrário e me desvela o
passado com cada vez mais nitidez, minha memória de uma matéria
sobre proclamação da república publicada no Diário do Comercio de
São Paulo há quase dez anos numa edição comemorativa que
distribuiu como brinde um pôster do quadro de Benedito Calixto
alusivo à data constata um produto muito bem feito, duas paginas com
diagramação e fotos que ilustram a tese da excelente historiadora
entrevistada pela matéria – a professora maria aparecida de aquino, do
Mackenzie, segundo a qual a proclamação da república foi um golpe
palaciano que manteve as mesmas figuras e a mesma ideologia
política do império.
O jogo das imagens que acompanham o texto mostra o conde D’Eu
ocupante de cargo publico no império e depois na república.A
primeira pagina das duas páginas em que se distribui a matéria traz um
apanhado dos acontecimentos e uma cronologia dos eventos no Brasil
no dia 15 de novembro de 1889; a segunda trazia a entrevista com as
reflexões da professora, expondo com clareza uma perspectiva que
está nos livros didáticos de história.
É uma reportagem que eu teria guardado se tivesse recebido o jornal.
Foi publicada no Diário do Comércio de São Paulo no dia 13 de
dezembro de 2009. Passados quase dez anos, serve de documento da
história da minha vida.
De uma parte ruim da minha vida porque a historia dessa matéria
começa com um dos editores do diário do comercio, josé maria dos
santos, me encomendando uma reportagem especial sobre a
proclamação da república que deveria acompanhar um brinde
distribuído pelo jornal nessa data - um pôster do quadro de Benedito
Calixto sobre o tema. José maria me pautou, dizendo que eu deveria
contar o fato, falar do quadro dado como brinde pelo jornal e
entrevistar alguém como o professor Carlos Guilherme Mota, do
Mackenzie, autor do livro Ideologia da cultura brasileira,que eu já
tinha lido, para falar sobre o assunto.
Fiz exatamente o que o editor me pediu, liguei para o carlos
Guilherme mota. Ele me atendeu num aeroporto e informado do
pedido de entrevista disse que estava viajando para fora do país e não
teria tempo de dar a entrevista, mas podia indicar uma pessoa que
poderia falar sobre o assunto dentro da sua linha de pesquisa e que
também era sua colega de Mackenzie, a professora maria aparecida de
aquino, de quem me passou o telefone e que lá no Mackenzie tinha
organizado uma cadeira e dava cursos como o de arqueologia da
ideologia brasileira.
Lembrei da adequação de entrevistar pessoas em sintonia com o
espírito da publicação que estivesse fazendo, por isso tinha
entrevistado para outra elogiada matéria do diário do comercio, desta
vez tratando da atuação do prefeito antonio prado em são Paulo, uma
professora que era membro do conselho consultivo da associação
comercial de são Paulo e viúva do historiador comunista Caio Prado
Júnior.
Contatei a professora maria aparecida de aquino, fiquei muito bem
impressionado e obtive uma ótima entrevista, como era de se esperar
dessa pessoa culta, generosa e didática, que sabe lidar com a imprensa.
Também entrevistei pesquisadoras da pinacoteca de são Paulo, onde o
quadro está exposto. A matéria ficou redonda, me tomou quase duas
semanas de trabalho para um pagamento relativamente baixo, 500
reais. Como o tema era interessante achei que tinha valido a pena dar
o melhor de mim, pois poderia render mais ofertas de trabalho no
jornal. Entreguei a matéria e o editor josé maria dos santos elogiou:
“Ficou muito bom, Marcão!” Gostei do resultado, a publicação da
edição comemorativa da proclamação da república com brinde do
pôster do quadro do Benedito Calixto e fotos de figuras do império
investidas de autoridade em dois tempos: o reinado que ajudaram a
derrubar e a república na qual continuaram detendo o poder.
Atribuí a qualidade da matéria e sua adequação às expectativas o
jornal à minha experiência de 40 anos na grande imprensa. Tinha tido
por exemplo o cuidado de seguir a orientação do editor josé maria
quanto ao especialista entrevistado, o professor o Mackenzie carlos
Guilherme mota, que foi o que me indicou outra colega também do
Mackenzie, a professora maria aparecida de aquino.
Cerca de dez dias depois começou o meu momento Kafka no jornal
Diário do Comercio. Recebi um e-mail do editor José Guilherme
Ferreira com o seguinte pedido: “Marcão, você poderia me mandar o
telefone da professora maria aparecida de aquino, que trabalha no
mackenzie, sei lá” Estranhei o “que trabalha no mackenzie, sei lá”,
mas nem comentei, e respondi ao email enviando o celular da
professora. O jose Guilherme havia trabalhado comigo no jornal da
usp e no jornal da tarde e uma vez fazendo um jornal de condomínios
me encomendou uma matéria, que a dona do projeto tinha elogiado –
mas curiosamente poupou qualquer elogio aos textos que eu estava
fazendo para o diáriodo comercio.
Dias antes de receber o email, falando com o josé Guilherme pelo
telefone perguntei sobre o que tinha achado sobre um texto que eu
havia escrito para o diário do comercio sobre o jardim do instituto de
biociências da usp. Ele fez questão de não elogiar o texto:
- Dei chamada de capa por causa das fotos – respondeu seco. A frieza
com que o jose Guilherme do diário do comercio me tratava me
intrigava, ele chegou a se referir ao fato de eu trata-lo pelo apelido
com que era chamado no jornal da usp e no jornal da tarde: Zegui.
“Você me trata por Zegui?”, perguntou certa vez... De novo estranhei
o comentário do editor josé guilherme Ferreira,pois o conhecia havia
vinte anos, do Jornal da USP, onde a editora maria lucia carneiro e
todos os calegas o chavamava de Zegui, e do Jornal da Tarde, onde
trabalhei na mesma equipe que ele, a Editoria Geral, por muitos e
muitos anos. "Que falta de memória", pensei.
Lembro que na ultima conversa que tive com josé guilherme ferreira
pelo telefone até toquei no assunto que é o cerne deste texto.
- E a matéria sobre a proclamação da república, você gostou? –
perguntei.
- Ih – a resposta lacônica que eu não entendi foi dada dias antes de ele
me mandar o email perguntando o telefone da professora.
Uma semana depois do estranho email que me pedia o telefone da
professora maria aparecida de aquino, “que leciona no Mackenzie, sei
lá” foi a vez de o editor josé maria me ligar:
- Marcão, você não terá confundido uma coisa? Uma pessoa está
dizendo que a professora maria aparecida de aquino não dá aulas no
Mackenzie, essa pessoa ligou para o Mackenzie e lhe disseram que a
professora maria aparecida de aquino não trabalha lá...
. Sem me dizer o nome da pessoa que me estava acusando o editor
josé maria me leu trechos da denúncia: “Vocês estão dando uma
pagina para esse absurdo e eu liguei para o Mackenzie e a professora
que o jornal está associando ao mackenzie não trabalha lá” – lembro
dos parágrafos que josé maria se deu ao trabalho de me ler pelo
telefone. Jósé maria até interrompeu a leitura para dizer:
- Demos uma página? É, demos uma página... – ele mesmo se
perguntou e respondeu...
Eu ia dizer que não foi uma página, foram duas, e que eu já tive
publicadas matérias de várias páginas, lembrei de uma sobre foz do
Iguaçu no jornal da tarde que tinha doze paginas e foi elogiada pela
secretaria de cultura da cidade em carta enviada ao jornal da tarde –
mas me calei.Estava achando a situação kafkiana, pensei que o
telefone do Mackenzie estava dando informações erradas e como eu
só tinha falado com a professora maria aparecida no celular dela falei
para o zé maria:
- Vou ligar para o Mackenzie e te ligo em seguida.
Me senti um personagem de Kafka tentando entrar no castelo do
diário do comercio para rebater uma acusação absurda num processo
absurdo. Com um acusador misterioso vociferando e até o editor
estranhando terem dado uma pagina para uma matéria que na verdade
ocupou duas paginas cheguei a achar que estava vivendo em um
universo paraleloe liguei para o Mackenzie perguntando se
conheciam a professora maria aparecida de aquino. Como eu esperava
para equilíbrio do meu mundo, o Mackenzie respondeu que ela
lecionava lá, sim. Passei o telefone do mackenzie para o editor josé
maria, enumerei as matérias que ela ensinava naquela universidade e o
editor josé maria anotou atentamente. Achei que o editor estava
anotando o que eu dizia para publicar uma resposta à carta do leitor,
como costuma acontecer nos jornais e revistas.. Mesmo assim mandei
email para ele e para o jose Guilherme repudiando a denuncia contra
mim e enviando em anexo o currículo cezar lattes da professora maria
aparecida de aquino, onde constava que ela trabalhava no Mackenzie.
Até hoje não tive resposta.
Achei pura crueldade os ex-colegas do jornal da tarde terem me
transmitido a crítica do leitor (ou sei lá quem fosse, porque não me
disseram o nome da pessoa e nunca mais tocaram no assunto) porque
a referência de que maria aparecida de aquino trabalhava no
Mackenzie constava na internet, tanto na plataforma cezar lattes como
no google acadêmico. Eles poderiam ter consultado ou ligado para o
Mackenzie antes de me ler por telefone uma carta com ofensas e
acusações falsas na qual deram a entender terem acreditado. Teriam
dirimido a dúvida e eu nem saberia da história.
Era Kafka puro, o mesmo texto que o editor josé maria tinha elogiado
(“Ficou muito bom, Marcão!”) agora era um texto que incomodava o
jornal (“Demos uma página? É, demos uma pagina...”)... Por um
momento duvidei de mim, como se estivesse acreditando na denuncia
de que eu estava usando o Mackenzie para promover uma pessoa com
a mentira de que ela trabalhava lá. Não fui informado de mais detalhes
do teor da denúncia contra mim nem fiquei sabendo o nome da pessoa
que me fez a acusação de mentir no jornal. O fato de os editores não
mais falarem sobre o assunto me ficou atravessado.
Mas o estrago estava feito. A má vontade do editor josé maria para
com os meus textos aumentou.
Eu tinha batido as portas do Diário do Comercio porque estava (e
estou) malaposentado como em geral acontece com os jornalistas... No
diário do comercio da época trabalhavam várias pessoas que tinham
trabalhado no Estadão e no Jornal da Tarde e que eu acreditava serem
meus amigos de décadas.
Apresentei-me ao diretor do jornal, moises rabinovici, pessoa
competente e digna.
- Tenho-o em muito alta conta – me disse o Rabino, com quem eu
havia trabalhado durante anos no Jornal da Tarde. Fez questão de ele
mesmo me levar à mesa do editor José Guilherme Ferreira,para me
apresentar. O José Guilherme, com quem eu tinha trabalhado no
Jornal da Usp e no jornal da tarde, não estava na mesa. Rabino pediu
para dizerem que tinha estado lá e me levou a outra mesa, de outro
editor, José Maria dos Santos, também ex-colega do jornal da tarde, de
quem eu inclusive revisava os textos, entre minhas inúmeras
obrigações.
Fui apresentado, o Rabino explicou que trabalhavam com pessoa
física, mas como eu provavelmente ia demorar um certo tempo para
abrir a empresa o primeiro pagamento poderia ser feito sem nota
fiscal. Fiquei animado com a perspectiva de constância nos
pagamentos e achei que finalmente tinha achado um trabalho decente
numa época de desemprego. Disseram que pagavam 500 reais por
matéria e eu pensei que iria ganhar uns 2 mil reais por mês, pois
poderia fazer folgadamente uma matéria por semana. Sugeri ao josé
maria que eu poderia fazer coluna sobre plantas medicinais, assunto
que estudo e de que sou autor de livroconsagrado, que tem sido
reeditado há mais de 25 anos, As Plantas da Saúde, das Edições
Paulinas. Também sugeri escrever sobre saúde ou sobre as arvores
significativas da cidade de são paulo.
- Nós já temos colunistas demais, o que eu precisoé de repórteres, e
você é bom de história - disse, elegendo a área que queria que eu
cobrisse para ele, e na qual eu me desempenhava bem, pois havia sido
editor chefe da coleção nosso século, da abril cultural, premiada pela
academia brasileira de letras, por exemplo. A vantagem de ter 40 anos
de grande imprensa é essa: tinha feito matérias de todas as áreas - até
pornografia para a coleção Momentos Intimos, da Abril, que nos anos
90 fazia sucesso nas bancas com a pornografia preferida das
secretárias,que antecipava inclusive a atual onda dos 50 Tons de
Cinza. Tinha feito até catálogos para a Bienal Internacional de Artes
Plasticas de São Paulo (a décima-nona e a vigésima-primera), de
mundial reconhecimento.
Notei um certo desconforto comigo por parte do José Maria – percebi
com estranheza que certamente eu não era a pessoa que ele escolheria
para trabalhar com ele. Esse é o problema das indicações por cima.
Fingi que não notei a maneira mais fria e distante como estava sendo
tratado por colegas que chegaram a ser carinhosos quando precisaram
de mim quando eu trabalhava com carteira assinada e tinha vínculos
empregatícios mais sérios na mesma empresa que eles.
No período em que colaborei no Diário do Comércio (2009/2010)
estive no prédio-sede da rua Boa Vista, centro de São Paulo, umas sete
vezes, no máximo. Lembro que uma vez eu estava na frente da mesa
do editor jose maria, tinha conversado com ele e enquanto apareceu
uma pessoa que o levou para outra mesa, interpelou-me um velho
amigo do jornal da tarde, que também estava trabalhando no Diário do
Comercio, o Valter, diretor de arte, que começou a falar comigo.
Pediu que eu esperasse que ele voltaria logo, pois queria me perguntar
um item de jardinagem. Estava sentado olhando umas pessoas fazendo
piadas na mesa vizinha quando o josé maria voltou e me perguntou:
- Ainda está aqui? Pode ir...
Respondi que estava esperando o Valtinho, que queria falar comigo.
Com cara de poucos amigos josé maria falou:
- Eu te levo na mesa dele.
Me dirigiu para um canto vazio do prédio e me pôs na frente de uma
mesa.
- É aqui que ele senta – disse, e foi embora, deixando-me de pé
esperando o Valtinho, a quem eu tinha sugerido que plantasse uma
jabuticabeira no meio do restaurante Dita Cabrita, do qual é dono, e
que felizmente chegou logo.
Eu trabalhava em casa, o josé maria me fazia as encomendas por
telefone. Passados alguns meses percebi que em vez de ganhar uns 2
mil por mês eu estava ganhando 500 reais num mês, mil reais em
outro mês, depois voltava a ganhar 500 reais e durante muitos meses
não ganhava nada porque o editor não me passava trabalho e eu tinha
de arcar sozinho com o religioso pagamento da contadora (Volp &
Contijet, que o proprio jornal me indicou) e encargos com o governo.
Depois da falsa acusação de que eu tinha inventado a professora maria
aparecida de aquino a situação piorou ainda mais. Tinha trabalhado
com empresas ruins, que não me pagaram como o jornal Bom Dia
ABCD, e logo consegui me desvencilhar delas, mas no caso do Diário
do Comercio fui obrigado a insistir porque por causa deles abrira
empresa e o direitor moises rabinovici tinha me dado esperanças.
Além disso lá trabalhavam amigo meus como o saudoso escritor e
jornalista Renato pompeu, que todo sabado almoçava em casa e
garantia que o jornal tinha permitido que sobrevivesse à parca
aposentadoria dos jornalistas.
Meu primeiro conflito com o diário do comercio ocorreu justamente
por causa da falta de pagmentos. Como o Rabino tinha dito que o
primeiro pagamento podia ser feito sem nota, porque a abertura da
empresa poderia demorar, reclamei com o setor de pagamentos que já
estava colaborndo há mais de tres meses com o diário do comercio e
ainda não tinha recebido meu primeiro pagamento. Falei que estava
havendo descaso comigo.
Minha reclamação descontentou um cara da academia paulista de
letras (segundo me contaram as secretárias) que trabalhava no setor de
pagamentos e essa pessoa, cujo nome não me foi revelado, agiu de
forma truculenta e foi reclamar com o zé maria, que me ligou em
seguida:
- Marcão, aqui no Diário do Comercio você não pode rodar a baiana,
estão reclamando que você está sendo inconveniente!
Resultado: só começaram a me pagar depois de quatro meses de
trabalho, quando a empresa ficou pronta. Achei má vontade, mas
como achar emprego não estava fácil deixei barato e não cobrei a
promessa do Rabino, de que o primeiro pagamento poderia ser feito
sem nota...
Depois de meses sem me passar trabalho por causa da reclamação,
meu melindroso editor me ligou e voltou a me pedir uma ou outra
matéria, como foi o caso da reportagem especial sobre proclamação da
república com a que comecei este relato.
Quando o editor josé maria me leu a carta ou e mail arrasando com
minha matéria que ele próprio tinha elogiado eu quase comento: “-
Nossa, esse cara está reclamando da matéria e rodando a baiana contra
mm. Você não falou que no Diário do Comercio não pode rodar a
baiana? Ou só eu é que não posso reclamar, como fiz quando percebi
que estava trabalhando para vocês havia quatro meses sem ver a cor
dos pagamentos?”
Andei procurando a matéria de anos atrás no site do jornal do
comercio, que agora só tem versão digital para internet, não achei e
notei que o jornal piorou muito: deixou de ser jornal e virou um
panfleto da direita. Queria publicar no facebook a matéria, o meu
currículo e a carta me denunciando. Inclusive queria comparar o teor e
o estilo da carta vociferante com as vozes da direita de hoje, para ter
uma visão arqueológica da perseguição à professora maria aparecida
de aquino, da qual eu também fui vitima.
Acho que o diário do comercio deve ter essa carta guardada, visto que
é empresa e deve tê-la respondido e arquivado o caso em algum lugar.
Queria saber se algum advogado pode me informar se não é um direito
meu ter uma copia dessa carta, visto que contém denuncias contra
mim e me prejudicou profissionalmente no jornal.
Para entender como essa professora é vista pela direita babante é só ler
artigos como o de Rodrigo Constantino falando mal dela. Acho que
tem o mesmo estilo vociferante, mentiroso, caluniador e burro do
denunciante que falou mal da minha matéria dizendo que seus
conceitos são absurdos e que a professora entrevistada nunca tinha
lecionado no Mackenzie, segundo ele próprio"comprovara" ligando
para a universidade e obtendo a resposta de que a professora maria
aparecida de aquino nunca trabalhou lá...
E com isso o Mackenzie virou um fantasma na minha vida – sua
sombra se estendeu para muitos anos depois do ocorrido, pois
recentemente soube que uma das fofocas que correm contra mim é a
de que eu teria inventado até uma falsa professora do Mackenzie...
Se tivesse sido comprovada a denuncia de que eu teria mentido como
jornalista ao dizer que a professora maria aparecida de aquino era
professora do Mackenzie sem nunca ter sido, acho que a melhor
atitude do jornal seria me demitir e publicar notinha na capa para
mostrar que é um veículo de credibilidade que não aceita publicar
mentiras. O problema é que eu provei que ela leciona no Mackenzie e
quem estava mentindo e não tinha credibilidade era o acusador.
O jornal não pôde me detratar na capa, mas me demitiu da forma mais
cruel: o editor josé maria dos santos foi seguidamente recusando e não
pagando as matérias que me passava até deixar de me passar trabalho
completamente. José maria rejeitou, por exemplo, uma matéria que me
encomendara sobre Tiradentes para a qual eu tinha comprado três
livros (e gastado 280 reais na esperança de ganhar 500...) com as
principais tendências historiográficas. Ele alegou que não aceitava a
materia porque os leitores do Diário do Comércio não iam gostar da
divulgação do fato de que Tiradentes era rico e tinha escravos,como
foi exaustivamente comprovado pelo historiador André Figueiredo
Rodrigues, autor do livro A fortuna dos inconfidentes (Globo Editora),
que eu tinha entrevistado para a matéria. (Provavelmente os "leitores"
iam dizer que ligaram para a Globo Editora e teriam recebido da
editora a informação de que André Figueiredo Rodrigues não é o autor
de A fortuna dos inconfidentes...)
Outra reportagem sobre o descobrimento do brasil também foi
recusada, e não paga sob a alegação de que talvez um dia ela pudesse
ser publicada numa tal revista da associaçãocomercial, que nunca vi
mais gorda. Em seguida, mais uma materia foi recusada, desta vez
sobre os sotaques da capital paulistana. Interessado pelo tema eu tinha
entrevistado linguistas e falei da lingua geral indigena, o nhengatu,
que determinou o sotaque geral da cidade, e das contribuições dos
imigrantes, o que me fez visitar a mooca, e outros bairros.
Cinco anos depois, o diretor Moises Rabinovici, que é honesto, soube
das minhas reclamações sobre o calote do jornal, que não fazia sentido
num profissional com 40 anos de experiencia e beirando os 60 anos de
idade, o que para mim configurava desrespeito. Ordenou que me
pagassem as matérias que tinha feito, perguntou quais eram e eu citei
duas de que na hora me lembrei: Tiradentes e Sotaques. A descoberta
do Brasil nunca foi paga porque eu equeci de cobrar do Rabino, apesar
de a matéria ter me custado várias idas ao departamento de história da
usp. Se um dia encontrar o editor josé maria, vou pedir que me pague
os 500 reais do seu bolso, para compensar meu esquecimento...
Curiosamente, um dos melhores amigos que angariei ao longo da vida,
o jornalista Renato Pompeu, que também colaborava no diário do
comércio, me contou meses depois de o meu texto sobre Tiradentes ter
sido recusado e não pago, que entregou a resenha do mesmo livro A
fortuna dos inconfidentes para outro editor do Diário do Comercio e
ela foi publicada e elogiada.
- Amo teu editor - disse-lhe, sem saber nem perguntar o nome da
pessoa. - Não tive a mesma sorte.
Embora muito mais à esquerda do que eu, o Renatão era colaborador
de primeira classe do Diário do Comercio. Recebia um pagamento
fixo independente do número de matérias que entregasse e era muito
mais respeitado.
- O Diario do Comercio foi a minha salvação - comentou Renato
Pompeu, que também estava malaposentado.
- Tive de engolir sapos, mas só podemos dizer a verdade sobre a nossa
imprensa quando não precisarmos mais dela - advertiu Renatão,
enquanto eu me sentia um charco, verdadeiro sapódromo.
Notei que meu status de terceirizado mudou a forma como antigos
colegas de trabalho me tratavam. Cartas contra mim ou algum
trabalho meu enviadas aos fascículos da Abril Cultural (onde trabalhei
17 anos), ao jornal da usp (5 anos), à revista Família Cristã (na qual
colaborei por mais de dez anos com sessões de medicina popular e
jardinagem) e ao jornal da tarde (17 anos em carteira assinada) eram
entregues a mim e a carta e a minha resposta eram divulgadas pelas
proprias publicações. Como terceirizado simplesmente me tornei
incomodo e não tive mecanismo de defesa. Suspeitei de que a
acusação velada era a de apoiar a esquerda ou o PT e de pertencer a
seus quadros. Isso aconteceu com vários jornalistas de esquerda ou
não, e é uma forma de "depurar" as redações, que hoje são currais de
direita.
Numa relação mais clara e honesta, poderiam ter me falado que eu
desagradava a algum diretor, empresario ou figura simpatica à casa e
por isso não queriam mais meu trabalho. O que eu achei cruel nessa
relação kafkiana tocada pela ideologia foi a falta de transparência e o
fato de passarem a recusar meus textos, de uma hora para outra
suspeitos de inadequados. De repente me senti a barata da
Metamorfose, tinha deixado de ser útil. Agora entendo que foi
acionado um mecanismo que levava todos a crer, inclusive a mim, que
o problema era eu, que eu devia me desligar porque era problemático.
Teria sido mais honesto dizer que eu devia me desligar porque não me
queriam e pronto...
Pensando nos meus (agora poucos) amigos jornalistas que partilham o
facebook comigo, constato que tenho relação mais carinhosa com os
da Abril Cultural de 30 e 40 anos atrás do que com os do Estadão mais
recentes. A crise da profissão piorou o caráter das pessoas. Nesta
realidade mais mesquinha e polarizada, lembro que na mesma época
em que os ex-Estadão do Diário do Comércio passaram a me evitar
porque entrevistei uma professora de esquerda para um jornal de
direita, outro colega do estadão que eu considerava meu amigo
gratuitamente me agrediu no inbox do face: o jornalista Sergio
Pompeu, que sem mais nem menos me disse: "Se mata seu lixo" e em
seguida me bloqueou.
Usou a mesma estratégia dos "colegas" do Diario do Comercio, a de
dizer uma coisa e em seguida sumir, deixando estranhos retalhos de
Gestalt aberta como o jose maria que me informou da denúncia de que
a professora maria aparecida de aquino não trabalhava no mackenzie
para em seguida não mais falar comigo sobre o assunto, nem me
respondido o email em que eu perguntava como seria meu direito de
resposta.
"O que mais impressiona na Metamorfose é a lenta desumanização da
barata", lembro das palavras do professor Antonio Candido numa das
aulas que tive com ele, quando fiz letras, na USP, há mais de 40 anos.
Fui acusado, não pude me defender satisfatóriamente, e, embora tenha
provado minha inocência, acabei sendo punido "por inadequação" por
gente que eu conhecia e que não me conhecia mais e não se fala mais
nisso e inclusive isso não vem ao caso. Kafka foi o primeiro pós-
moderno, sinto isso na carne. Acostumado a ser cumprimentado pelos
colegas quando sai da empresa vira barata e é varrido para a lata do
lixo pela empregada. Se minha memória do passado é de certa forma
intensa demais, a de meus ex-companheiros mostrou-se fraca demais,
como constatei pelo fato de o josé guilherme ferreira, meu colega do
jornal da usp e do jornal da tarde, não se lembrar mais que eu sempre
o tinha tratado pelo apelido Zegui e ter de uma certa forma comentado
sua estranheza por eu tratá-lo dessa forma. Mas essa é a condição
humana nas varias idades, raças e classes sociais - devido a odiosos
dispositivos de exclusão, as minorias viram baratas - velhos,
esquerdistas, pobres, gays, refugiados, negros, pacientes psiquiátricos,
portadores de depressão, indios, autistas...
APÊNDICE LITERÁRIO
Trecho dos momentos finais de A metamorfose, de Franz Kafka
"Além de merecerem essa pausa no trabalho, necessitavam
absolutamente dela. Assim, sentaram-se à mesa e escreveram três
cartas de justificação de ausência: o Senhor Samsa à gerência do
banco, a Senhora Samsa à dona da loja para quem trabalhava e Grete
ao patrão da firma onde estava empregada. Enquanto escreviam,
apareceu a empregada e avisou que iria sair naquele momento, pois já
tinha acabado o trabalho diário. A princípio, limitaram-se a acenar
afirmativamente, sem sequer levantarem a vista, mas, como ela
continuasse ali especada, olharam irritadamente para ela. - Sim? -
disse o Senhor Samsa. A criada sorria no limiar da porta, como se
tivesse boas notícias a dar-lhes, mas não estivesse disposta a dizer
uma palavra, a menos que fosse diretamente interrogada. A pena de
avestruz espetada no chapéu, com que o Senhor Samsa embirrava
desde o própriodia em que a mulher tinha começado a trabalhar lá em
casa, agitava-se animadamente em todas as direções. - Sim, o que há?
- perguntou o Senhor Samsa, que lhe merecia mais respeito do que os
outros. - Bem - replicou a criada,rindo de tal maneira que não
conseguiu prosseguir imediatamente -, era só isto: não é preciso
preocuparem-se com a maneira de se verem livres daquilo aqui no
quarto ao lado. Eu já tratei de tudo. -O Senhor Samsa e Grete
curvaram-se novamente sobre as cartas, parecendo preocupados.
Percebendo que ela estava ansiosa por começar a delatar todos os
pormenores, o Senhor Samsa interrompeu-a com um gesto decisivo.
Não lhe sendo permitido contar a história, a mulher lembrou-se da
pressa que tinha e, obviamente ressentida, atirou-lhes um - Bom dia a
todos - disse e girou desabridamente nos calcanhares, afastando-se no
meio de um assustador bater de portas. - Hoje à noite vamos despedi-
la - disse o Senhor Samsa, mas nem a mulher nem a filha deram
qualquer resposta, pois a criada parecia ter perturbado novamente a
tranqüilidade que mal tinham recuperado. Levantaram-se ambas e
foram-se postar à janela, muito agarradas uma à outra. O Senhor
Samsa voltou-se na cadeira,para as observar durante uns instantes.
Depois dirigiu-se a elas: - Então, então! O que lá vai, lá vai. E podiam
dar-me um bocado mais de atenção. - As duas mulheres responderam
imediatamente a este apelo, precipitando-se para ele e acarinhando-o,
após o que acabaram rapidamente as cartas. Depois saíram juntos de
casa, coisa que não sucedia havia meses, e meteram-se num trem em
direção ao campo, nos arredores da cidade."
APENDICE FACTUAL
Materias rejeitadas, uma forma truculenta de demissão (a pessoa
desiste porque acha que seus textos não estão à altura do veículo para
o qual está escrevendo – só que isso não cola para quem passou
quarenta anos na abril e no estadão...
Tiradentes e a inconfidência
Esta sobre Tiradentes e a inconfidência me foi encomendada e me deu
trabalho: comprei três livros para escrevê-la e foi rejeitada e não foi
paga pelo editor josé maria dos santos sob alegação de que “os leitores
do diário do comércio não vão gostar disso”.... Eu me pergunto até
hoje: os leitores do diáriodo comercio não vão gostar do quê? Fiz a
matéria orientado por professores da cátedra Jaime Cortesão do depto
de historia da usp e para isso resenhei os três livros mais importantes
sobre o assunto que haviam sido publicados nos últimos vinte anos...
Que tipo de leitor não gosta de história????
https://www.slideshare.net/MarcosGomes28/tiradentes-e-
inconfidentes
Sotaques da cidade de São Paulo
Outra matéria rejeitada,a última, depois da qual não me procuraram e
eu não mais os procurei
https://www.slideshare.net/MarcosGomes28/sotaques
#JornalismoIdeologico #DiarioDoComercio #DemissãoTruculenta

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Sombra do mackenzie depoimento de jornalista que foi humilhado e caluniado numa redação

  • 1. A sombra do Mackenzie - Com 40 anos de profissão, fui humilhado por ex-colegas de trabalho e caluniado na redação do Diário do Comercio (SP)  Publicado em Publicado em22 de agosto de 2017 A experiência de um jornalista com o Diário do Comércio de São Paulo “Da minha humilhação farei uma catedral.” (Jean Genet) "Tenho mais lembranças do que se tivesse mil anos" (Charles Baudelaire) Clarificada pelo tempo, que comigo age ao contrário e me desvela o passado com cada vez mais nitidez, minha memória de uma matéria sobre proclamação da república publicada no Diário do Comercio de São Paulo há quase dez anos numa edição comemorativa que distribuiu como brinde um pôster do quadro de Benedito Calixto alusivo à data constata um produto muito bem feito, duas paginas com diagramação e fotos que ilustram a tese da excelente historiadora entrevistada pela matéria – a professora maria aparecida de aquino, do Mackenzie, segundo a qual a proclamação da república foi um golpe
  • 2. palaciano que manteve as mesmas figuras e a mesma ideologia política do império. O jogo das imagens que acompanham o texto mostra o conde D’Eu ocupante de cargo publico no império e depois na república.A primeira pagina das duas páginas em que se distribui a matéria traz um apanhado dos acontecimentos e uma cronologia dos eventos no Brasil no dia 15 de novembro de 1889; a segunda trazia a entrevista com as reflexões da professora, expondo com clareza uma perspectiva que está nos livros didáticos de história. É uma reportagem que eu teria guardado se tivesse recebido o jornal. Foi publicada no Diário do Comércio de São Paulo no dia 13 de dezembro de 2009. Passados quase dez anos, serve de documento da história da minha vida. De uma parte ruim da minha vida porque a historia dessa matéria começa com um dos editores do diário do comercio, josé maria dos santos, me encomendando uma reportagem especial sobre a proclamação da república que deveria acompanhar um brinde distribuído pelo jornal nessa data - um pôster do quadro de Benedito Calixto sobre o tema. José maria me pautou, dizendo que eu deveria contar o fato, falar do quadro dado como brinde pelo jornal e entrevistar alguém como o professor Carlos Guilherme Mota, do Mackenzie, autor do livro Ideologia da cultura brasileira,que eu já tinha lido, para falar sobre o assunto. Fiz exatamente o que o editor me pediu, liguei para o carlos Guilherme mota. Ele me atendeu num aeroporto e informado do pedido de entrevista disse que estava viajando para fora do país e não
  • 3. teria tempo de dar a entrevista, mas podia indicar uma pessoa que poderia falar sobre o assunto dentro da sua linha de pesquisa e que também era sua colega de Mackenzie, a professora maria aparecida de aquino, de quem me passou o telefone e que lá no Mackenzie tinha organizado uma cadeira e dava cursos como o de arqueologia da ideologia brasileira. Lembrei da adequação de entrevistar pessoas em sintonia com o espírito da publicação que estivesse fazendo, por isso tinha entrevistado para outra elogiada matéria do diário do comercio, desta vez tratando da atuação do prefeito antonio prado em são Paulo, uma professora que era membro do conselho consultivo da associação comercial de são Paulo e viúva do historiador comunista Caio Prado Júnior. Contatei a professora maria aparecida de aquino, fiquei muito bem impressionado e obtive uma ótima entrevista, como era de se esperar dessa pessoa culta, generosa e didática, que sabe lidar com a imprensa. Também entrevistei pesquisadoras da pinacoteca de são Paulo, onde o quadro está exposto. A matéria ficou redonda, me tomou quase duas semanas de trabalho para um pagamento relativamente baixo, 500 reais. Como o tema era interessante achei que tinha valido a pena dar o melhor de mim, pois poderia render mais ofertas de trabalho no jornal. Entreguei a matéria e o editor josé maria dos santos elogiou: “Ficou muito bom, Marcão!” Gostei do resultado, a publicação da edição comemorativa da proclamação da república com brinde do pôster do quadro do Benedito Calixto e fotos de figuras do império investidas de autoridade em dois tempos: o reinado que ajudaram a derrubar e a república na qual continuaram detendo o poder.
  • 4. Atribuí a qualidade da matéria e sua adequação às expectativas o jornal à minha experiência de 40 anos na grande imprensa. Tinha tido por exemplo o cuidado de seguir a orientação do editor josé maria quanto ao especialista entrevistado, o professor o Mackenzie carlos Guilherme mota, que foi o que me indicou outra colega também do Mackenzie, a professora maria aparecida de aquino. Cerca de dez dias depois começou o meu momento Kafka no jornal Diário do Comercio. Recebi um e-mail do editor José Guilherme Ferreira com o seguinte pedido: “Marcão, você poderia me mandar o telefone da professora maria aparecida de aquino, que trabalha no mackenzie, sei lá” Estranhei o “que trabalha no mackenzie, sei lá”, mas nem comentei, e respondi ao email enviando o celular da professora. O jose Guilherme havia trabalhado comigo no jornal da usp e no jornal da tarde e uma vez fazendo um jornal de condomínios me encomendou uma matéria, que a dona do projeto tinha elogiado – mas curiosamente poupou qualquer elogio aos textos que eu estava fazendo para o diáriodo comercio. Dias antes de receber o email, falando com o josé Guilherme pelo telefone perguntei sobre o que tinha achado sobre um texto que eu havia escrito para o diário do comercio sobre o jardim do instituto de biociências da usp. Ele fez questão de não elogiar o texto: - Dei chamada de capa por causa das fotos – respondeu seco. A frieza com que o jose Guilherme do diário do comercio me tratava me intrigava, ele chegou a se referir ao fato de eu trata-lo pelo apelido com que era chamado no jornal da usp e no jornal da tarde: Zegui. “Você me trata por Zegui?”, perguntou certa vez... De novo estranhei o comentário do editor josé guilherme Ferreira,pois o conhecia havia
  • 5. vinte anos, do Jornal da USP, onde a editora maria lucia carneiro e todos os calegas o chavamava de Zegui, e do Jornal da Tarde, onde trabalhei na mesma equipe que ele, a Editoria Geral, por muitos e muitos anos. "Que falta de memória", pensei. Lembro que na ultima conversa que tive com josé guilherme ferreira pelo telefone até toquei no assunto que é o cerne deste texto. - E a matéria sobre a proclamação da república, você gostou? – perguntei. - Ih – a resposta lacônica que eu não entendi foi dada dias antes de ele me mandar o email perguntando o telefone da professora. Uma semana depois do estranho email que me pedia o telefone da professora maria aparecida de aquino, “que leciona no Mackenzie, sei lá” foi a vez de o editor josé maria me ligar: - Marcão, você não terá confundido uma coisa? Uma pessoa está dizendo que a professora maria aparecida de aquino não dá aulas no Mackenzie, essa pessoa ligou para o Mackenzie e lhe disseram que a professora maria aparecida de aquino não trabalha lá... . Sem me dizer o nome da pessoa que me estava acusando o editor josé maria me leu trechos da denúncia: “Vocês estão dando uma pagina para esse absurdo e eu liguei para o Mackenzie e a professora que o jornal está associando ao mackenzie não trabalha lá” – lembro dos parágrafos que josé maria se deu ao trabalho de me ler pelo telefone. Jósé maria até interrompeu a leitura para dizer: - Demos uma página? É, demos uma página... – ele mesmo se perguntou e respondeu...
  • 6. Eu ia dizer que não foi uma página, foram duas, e que eu já tive publicadas matérias de várias páginas, lembrei de uma sobre foz do Iguaçu no jornal da tarde que tinha doze paginas e foi elogiada pela secretaria de cultura da cidade em carta enviada ao jornal da tarde – mas me calei.Estava achando a situação kafkiana, pensei que o telefone do Mackenzie estava dando informações erradas e como eu só tinha falado com a professora maria aparecida no celular dela falei para o zé maria: - Vou ligar para o Mackenzie e te ligo em seguida. Me senti um personagem de Kafka tentando entrar no castelo do diário do comercio para rebater uma acusação absurda num processo absurdo. Com um acusador misterioso vociferando e até o editor estranhando terem dado uma pagina para uma matéria que na verdade ocupou duas paginas cheguei a achar que estava vivendo em um universo paraleloe liguei para o Mackenzie perguntando se conheciam a professora maria aparecida de aquino. Como eu esperava para equilíbrio do meu mundo, o Mackenzie respondeu que ela lecionava lá, sim. Passei o telefone do mackenzie para o editor josé maria, enumerei as matérias que ela ensinava naquela universidade e o editor josé maria anotou atentamente. Achei que o editor estava anotando o que eu dizia para publicar uma resposta à carta do leitor, como costuma acontecer nos jornais e revistas.. Mesmo assim mandei email para ele e para o jose Guilherme repudiando a denuncia contra mim e enviando em anexo o currículo cezar lattes da professora maria aparecida de aquino, onde constava que ela trabalhava no Mackenzie. Até hoje não tive resposta.
  • 7. Achei pura crueldade os ex-colegas do jornal da tarde terem me transmitido a crítica do leitor (ou sei lá quem fosse, porque não me disseram o nome da pessoa e nunca mais tocaram no assunto) porque a referência de que maria aparecida de aquino trabalhava no Mackenzie constava na internet, tanto na plataforma cezar lattes como no google acadêmico. Eles poderiam ter consultado ou ligado para o Mackenzie antes de me ler por telefone uma carta com ofensas e acusações falsas na qual deram a entender terem acreditado. Teriam dirimido a dúvida e eu nem saberia da história. Era Kafka puro, o mesmo texto que o editor josé maria tinha elogiado (“Ficou muito bom, Marcão!”) agora era um texto que incomodava o jornal (“Demos uma página? É, demos uma pagina...”)... Por um momento duvidei de mim, como se estivesse acreditando na denuncia de que eu estava usando o Mackenzie para promover uma pessoa com a mentira de que ela trabalhava lá. Não fui informado de mais detalhes do teor da denúncia contra mim nem fiquei sabendo o nome da pessoa que me fez a acusação de mentir no jornal. O fato de os editores não mais falarem sobre o assunto me ficou atravessado. Mas o estrago estava feito. A má vontade do editor josé maria para com os meus textos aumentou. Eu tinha batido as portas do Diário do Comercio porque estava (e estou) malaposentado como em geral acontece com os jornalistas... No diário do comercio da época trabalhavam várias pessoas que tinham trabalhado no Estadão e no Jornal da Tarde e que eu acreditava serem meus amigos de décadas.
  • 8. Apresentei-me ao diretor do jornal, moises rabinovici, pessoa competente e digna. - Tenho-o em muito alta conta – me disse o Rabino, com quem eu havia trabalhado durante anos no Jornal da Tarde. Fez questão de ele mesmo me levar à mesa do editor José Guilherme Ferreira,para me apresentar. O José Guilherme, com quem eu tinha trabalhado no Jornal da Usp e no jornal da tarde, não estava na mesa. Rabino pediu para dizerem que tinha estado lá e me levou a outra mesa, de outro editor, José Maria dos Santos, também ex-colega do jornal da tarde, de quem eu inclusive revisava os textos, entre minhas inúmeras obrigações. Fui apresentado, o Rabino explicou que trabalhavam com pessoa física, mas como eu provavelmente ia demorar um certo tempo para abrir a empresa o primeiro pagamento poderia ser feito sem nota fiscal. Fiquei animado com a perspectiva de constância nos pagamentos e achei que finalmente tinha achado um trabalho decente numa época de desemprego. Disseram que pagavam 500 reais por matéria e eu pensei que iria ganhar uns 2 mil reais por mês, pois poderia fazer folgadamente uma matéria por semana. Sugeri ao josé maria que eu poderia fazer coluna sobre plantas medicinais, assunto que estudo e de que sou autor de livroconsagrado, que tem sido reeditado há mais de 25 anos, As Plantas da Saúde, das Edições Paulinas. Também sugeri escrever sobre saúde ou sobre as arvores significativas da cidade de são paulo. - Nós já temos colunistas demais, o que eu precisoé de repórteres, e você é bom de história - disse, elegendo a área que queria que eu cobrisse para ele, e na qual eu me desempenhava bem, pois havia sido
  • 9. editor chefe da coleção nosso século, da abril cultural, premiada pela academia brasileira de letras, por exemplo. A vantagem de ter 40 anos de grande imprensa é essa: tinha feito matérias de todas as áreas - até pornografia para a coleção Momentos Intimos, da Abril, que nos anos 90 fazia sucesso nas bancas com a pornografia preferida das secretárias,que antecipava inclusive a atual onda dos 50 Tons de Cinza. Tinha feito até catálogos para a Bienal Internacional de Artes Plasticas de São Paulo (a décima-nona e a vigésima-primera), de mundial reconhecimento. Notei um certo desconforto comigo por parte do José Maria – percebi com estranheza que certamente eu não era a pessoa que ele escolheria para trabalhar com ele. Esse é o problema das indicações por cima. Fingi que não notei a maneira mais fria e distante como estava sendo tratado por colegas que chegaram a ser carinhosos quando precisaram de mim quando eu trabalhava com carteira assinada e tinha vínculos empregatícios mais sérios na mesma empresa que eles. No período em que colaborei no Diário do Comércio (2009/2010) estive no prédio-sede da rua Boa Vista, centro de São Paulo, umas sete vezes, no máximo. Lembro que uma vez eu estava na frente da mesa do editor jose maria, tinha conversado com ele e enquanto apareceu uma pessoa que o levou para outra mesa, interpelou-me um velho amigo do jornal da tarde, que também estava trabalhando no Diário do Comercio, o Valter, diretor de arte, que começou a falar comigo. Pediu que eu esperasse que ele voltaria logo, pois queria me perguntar um item de jardinagem. Estava sentado olhando umas pessoas fazendo piadas na mesa vizinha quando o josé maria voltou e me perguntou: - Ainda está aqui? Pode ir...
  • 10. Respondi que estava esperando o Valtinho, que queria falar comigo. Com cara de poucos amigos josé maria falou: - Eu te levo na mesa dele. Me dirigiu para um canto vazio do prédio e me pôs na frente de uma mesa. - É aqui que ele senta – disse, e foi embora, deixando-me de pé esperando o Valtinho, a quem eu tinha sugerido que plantasse uma jabuticabeira no meio do restaurante Dita Cabrita, do qual é dono, e que felizmente chegou logo. Eu trabalhava em casa, o josé maria me fazia as encomendas por telefone. Passados alguns meses percebi que em vez de ganhar uns 2 mil por mês eu estava ganhando 500 reais num mês, mil reais em outro mês, depois voltava a ganhar 500 reais e durante muitos meses não ganhava nada porque o editor não me passava trabalho e eu tinha de arcar sozinho com o religioso pagamento da contadora (Volp & Contijet, que o proprio jornal me indicou) e encargos com o governo. Depois da falsa acusação de que eu tinha inventado a professora maria aparecida de aquino a situação piorou ainda mais. Tinha trabalhado com empresas ruins, que não me pagaram como o jornal Bom Dia ABCD, e logo consegui me desvencilhar delas, mas no caso do Diário do Comercio fui obrigado a insistir porque por causa deles abrira empresa e o direitor moises rabinovici tinha me dado esperanças. Além disso lá trabalhavam amigo meus como o saudoso escritor e jornalista Renato pompeu, que todo sabado almoçava em casa e
  • 11. garantia que o jornal tinha permitido que sobrevivesse à parca aposentadoria dos jornalistas. Meu primeiro conflito com o diário do comercio ocorreu justamente por causa da falta de pagmentos. Como o Rabino tinha dito que o primeiro pagamento podia ser feito sem nota, porque a abertura da empresa poderia demorar, reclamei com o setor de pagamentos que já estava colaborndo há mais de tres meses com o diário do comercio e ainda não tinha recebido meu primeiro pagamento. Falei que estava havendo descaso comigo. Minha reclamação descontentou um cara da academia paulista de letras (segundo me contaram as secretárias) que trabalhava no setor de pagamentos e essa pessoa, cujo nome não me foi revelado, agiu de forma truculenta e foi reclamar com o zé maria, que me ligou em seguida: - Marcão, aqui no Diário do Comercio você não pode rodar a baiana, estão reclamando que você está sendo inconveniente! Resultado: só começaram a me pagar depois de quatro meses de trabalho, quando a empresa ficou pronta. Achei má vontade, mas como achar emprego não estava fácil deixei barato e não cobrei a promessa do Rabino, de que o primeiro pagamento poderia ser feito sem nota... Depois de meses sem me passar trabalho por causa da reclamação, meu melindroso editor me ligou e voltou a me pedir uma ou outra matéria, como foi o caso da reportagem especial sobre proclamação da república com a que comecei este relato.
  • 12. Quando o editor josé maria me leu a carta ou e mail arrasando com minha matéria que ele próprio tinha elogiado eu quase comento: “- Nossa, esse cara está reclamando da matéria e rodando a baiana contra mm. Você não falou que no Diário do Comercio não pode rodar a baiana? Ou só eu é que não posso reclamar, como fiz quando percebi que estava trabalhando para vocês havia quatro meses sem ver a cor dos pagamentos?” Andei procurando a matéria de anos atrás no site do jornal do comercio, que agora só tem versão digital para internet, não achei e notei que o jornal piorou muito: deixou de ser jornal e virou um panfleto da direita. Queria publicar no facebook a matéria, o meu currículo e a carta me denunciando. Inclusive queria comparar o teor e o estilo da carta vociferante com as vozes da direita de hoje, para ter uma visão arqueológica da perseguição à professora maria aparecida de aquino, da qual eu também fui vitima. Acho que o diário do comercio deve ter essa carta guardada, visto que é empresa e deve tê-la respondido e arquivado o caso em algum lugar. Queria saber se algum advogado pode me informar se não é um direito meu ter uma copia dessa carta, visto que contém denuncias contra mim e me prejudicou profissionalmente no jornal. Para entender como essa professora é vista pela direita babante é só ler artigos como o de Rodrigo Constantino falando mal dela. Acho que tem o mesmo estilo vociferante, mentiroso, caluniador e burro do denunciante que falou mal da minha matéria dizendo que seus conceitos são absurdos e que a professora entrevistada nunca tinha lecionado no Mackenzie, segundo ele próprio"comprovara" ligando
  • 13. para a universidade e obtendo a resposta de que a professora maria aparecida de aquino nunca trabalhou lá... E com isso o Mackenzie virou um fantasma na minha vida – sua sombra se estendeu para muitos anos depois do ocorrido, pois recentemente soube que uma das fofocas que correm contra mim é a de que eu teria inventado até uma falsa professora do Mackenzie... Se tivesse sido comprovada a denuncia de que eu teria mentido como jornalista ao dizer que a professora maria aparecida de aquino era professora do Mackenzie sem nunca ter sido, acho que a melhor atitude do jornal seria me demitir e publicar notinha na capa para mostrar que é um veículo de credibilidade que não aceita publicar mentiras. O problema é que eu provei que ela leciona no Mackenzie e quem estava mentindo e não tinha credibilidade era o acusador. O jornal não pôde me detratar na capa, mas me demitiu da forma mais cruel: o editor josé maria dos santos foi seguidamente recusando e não pagando as matérias que me passava até deixar de me passar trabalho completamente. José maria rejeitou, por exemplo, uma matéria que me encomendara sobre Tiradentes para a qual eu tinha comprado três livros (e gastado 280 reais na esperança de ganhar 500...) com as principais tendências historiográficas. Ele alegou que não aceitava a materia porque os leitores do Diário do Comércio não iam gostar da divulgação do fato de que Tiradentes era rico e tinha escravos,como foi exaustivamente comprovado pelo historiador André Figueiredo Rodrigues, autor do livro A fortuna dos inconfidentes (Globo Editora), que eu tinha entrevistado para a matéria. (Provavelmente os "leitores" iam dizer que ligaram para a Globo Editora e teriam recebido da
  • 14. editora a informação de que André Figueiredo Rodrigues não é o autor de A fortuna dos inconfidentes...) Outra reportagem sobre o descobrimento do brasil também foi recusada, e não paga sob a alegação de que talvez um dia ela pudesse ser publicada numa tal revista da associaçãocomercial, que nunca vi mais gorda. Em seguida, mais uma materia foi recusada, desta vez sobre os sotaques da capital paulistana. Interessado pelo tema eu tinha entrevistado linguistas e falei da lingua geral indigena, o nhengatu, que determinou o sotaque geral da cidade, e das contribuições dos imigrantes, o que me fez visitar a mooca, e outros bairros. Cinco anos depois, o diretor Moises Rabinovici, que é honesto, soube das minhas reclamações sobre o calote do jornal, que não fazia sentido num profissional com 40 anos de experiencia e beirando os 60 anos de idade, o que para mim configurava desrespeito. Ordenou que me pagassem as matérias que tinha feito, perguntou quais eram e eu citei duas de que na hora me lembrei: Tiradentes e Sotaques. A descoberta do Brasil nunca foi paga porque eu equeci de cobrar do Rabino, apesar de a matéria ter me custado várias idas ao departamento de história da usp. Se um dia encontrar o editor josé maria, vou pedir que me pague os 500 reais do seu bolso, para compensar meu esquecimento... Curiosamente, um dos melhores amigos que angariei ao longo da vida, o jornalista Renato Pompeu, que também colaborava no diário do comércio, me contou meses depois de o meu texto sobre Tiradentes ter sido recusado e não pago, que entregou a resenha do mesmo livro A fortuna dos inconfidentes para outro editor do Diário do Comercio e ela foi publicada e elogiada.
  • 15. - Amo teu editor - disse-lhe, sem saber nem perguntar o nome da pessoa. - Não tive a mesma sorte. Embora muito mais à esquerda do que eu, o Renatão era colaborador de primeira classe do Diário do Comercio. Recebia um pagamento fixo independente do número de matérias que entregasse e era muito mais respeitado. - O Diario do Comercio foi a minha salvação - comentou Renato Pompeu, que também estava malaposentado. - Tive de engolir sapos, mas só podemos dizer a verdade sobre a nossa imprensa quando não precisarmos mais dela - advertiu Renatão, enquanto eu me sentia um charco, verdadeiro sapódromo. Notei que meu status de terceirizado mudou a forma como antigos colegas de trabalho me tratavam. Cartas contra mim ou algum trabalho meu enviadas aos fascículos da Abril Cultural (onde trabalhei 17 anos), ao jornal da usp (5 anos), à revista Família Cristã (na qual colaborei por mais de dez anos com sessões de medicina popular e jardinagem) e ao jornal da tarde (17 anos em carteira assinada) eram entregues a mim e a carta e a minha resposta eram divulgadas pelas proprias publicações. Como terceirizado simplesmente me tornei incomodo e não tive mecanismo de defesa. Suspeitei de que a acusação velada era a de apoiar a esquerda ou o PT e de pertencer a seus quadros. Isso aconteceu com vários jornalistas de esquerda ou não, e é uma forma de "depurar" as redações, que hoje são currais de direita. Numa relação mais clara e honesta, poderiam ter me falado que eu desagradava a algum diretor, empresario ou figura simpatica à casa e
  • 16. por isso não queriam mais meu trabalho. O que eu achei cruel nessa relação kafkiana tocada pela ideologia foi a falta de transparência e o fato de passarem a recusar meus textos, de uma hora para outra suspeitos de inadequados. De repente me senti a barata da Metamorfose, tinha deixado de ser útil. Agora entendo que foi acionado um mecanismo que levava todos a crer, inclusive a mim, que o problema era eu, que eu devia me desligar porque era problemático. Teria sido mais honesto dizer que eu devia me desligar porque não me queriam e pronto... Pensando nos meus (agora poucos) amigos jornalistas que partilham o facebook comigo, constato que tenho relação mais carinhosa com os da Abril Cultural de 30 e 40 anos atrás do que com os do Estadão mais recentes. A crise da profissão piorou o caráter das pessoas. Nesta realidade mais mesquinha e polarizada, lembro que na mesma época em que os ex-Estadão do Diário do Comércio passaram a me evitar porque entrevistei uma professora de esquerda para um jornal de direita, outro colega do estadão que eu considerava meu amigo gratuitamente me agrediu no inbox do face: o jornalista Sergio Pompeu, que sem mais nem menos me disse: "Se mata seu lixo" e em seguida me bloqueou. Usou a mesma estratégia dos "colegas" do Diario do Comercio, a de dizer uma coisa e em seguida sumir, deixando estranhos retalhos de Gestalt aberta como o jose maria que me informou da denúncia de que a professora maria aparecida de aquino não trabalhava no mackenzie para em seguida não mais falar comigo sobre o assunto, nem me respondido o email em que eu perguntava como seria meu direito de resposta.
  • 17. "O que mais impressiona na Metamorfose é a lenta desumanização da barata", lembro das palavras do professor Antonio Candido numa das aulas que tive com ele, quando fiz letras, na USP, há mais de 40 anos. Fui acusado, não pude me defender satisfatóriamente, e, embora tenha provado minha inocência, acabei sendo punido "por inadequação" por gente que eu conhecia e que não me conhecia mais e não se fala mais nisso e inclusive isso não vem ao caso. Kafka foi o primeiro pós- moderno, sinto isso na carne. Acostumado a ser cumprimentado pelos colegas quando sai da empresa vira barata e é varrido para a lata do lixo pela empregada. Se minha memória do passado é de certa forma intensa demais, a de meus ex-companheiros mostrou-se fraca demais, como constatei pelo fato de o josé guilherme ferreira, meu colega do jornal da usp e do jornal da tarde, não se lembrar mais que eu sempre o tinha tratado pelo apelido Zegui e ter de uma certa forma comentado sua estranheza por eu tratá-lo dessa forma. Mas essa é a condição humana nas varias idades, raças e classes sociais - devido a odiosos dispositivos de exclusão, as minorias viram baratas - velhos, esquerdistas, pobres, gays, refugiados, negros, pacientes psiquiátricos, portadores de depressão, indios, autistas... APÊNDICE LITERÁRIO Trecho dos momentos finais de A metamorfose, de Franz Kafka
  • 18. "Além de merecerem essa pausa no trabalho, necessitavam absolutamente dela. Assim, sentaram-se à mesa e escreveram três cartas de justificação de ausência: o Senhor Samsa à gerência do banco, a Senhora Samsa à dona da loja para quem trabalhava e Grete ao patrão da firma onde estava empregada. Enquanto escreviam, apareceu a empregada e avisou que iria sair naquele momento, pois já tinha acabado o trabalho diário. A princípio, limitaram-se a acenar afirmativamente, sem sequer levantarem a vista, mas, como ela continuasse ali especada, olharam irritadamente para ela. - Sim? - disse o Senhor Samsa. A criada sorria no limiar da porta, como se tivesse boas notícias a dar-lhes, mas não estivesse disposta a dizer uma palavra, a menos que fosse diretamente interrogada. A pena de avestruz espetada no chapéu, com que o Senhor Samsa embirrava desde o própriodia em que a mulher tinha começado a trabalhar lá em casa, agitava-se animadamente em todas as direções. - Sim, o que há? - perguntou o Senhor Samsa, que lhe merecia mais respeito do que os outros. - Bem - replicou a criada,rindo de tal maneira que não conseguiu prosseguir imediatamente -, era só isto: não é preciso preocuparem-se com a maneira de se verem livres daquilo aqui no quarto ao lado. Eu já tratei de tudo. -O Senhor Samsa e Grete curvaram-se novamente sobre as cartas, parecendo preocupados. Percebendo que ela estava ansiosa por começar a delatar todos os pormenores, o Senhor Samsa interrompeu-a com um gesto decisivo. Não lhe sendo permitido contar a história, a mulher lembrou-se da pressa que tinha e, obviamente ressentida, atirou-lhes um - Bom dia a todos - disse e girou desabridamente nos calcanhares, afastando-se no meio de um assustador bater de portas. - Hoje à noite vamos despedi- la - disse o Senhor Samsa, mas nem a mulher nem a filha deram qualquer resposta, pois a criada parecia ter perturbado novamente a
  • 19. tranqüilidade que mal tinham recuperado. Levantaram-se ambas e foram-se postar à janela, muito agarradas uma à outra. O Senhor Samsa voltou-se na cadeira,para as observar durante uns instantes. Depois dirigiu-se a elas: - Então, então! O que lá vai, lá vai. E podiam dar-me um bocado mais de atenção. - As duas mulheres responderam imediatamente a este apelo, precipitando-se para ele e acarinhando-o, após o que acabaram rapidamente as cartas. Depois saíram juntos de casa, coisa que não sucedia havia meses, e meteram-se num trem em direção ao campo, nos arredores da cidade." APENDICE FACTUAL Materias rejeitadas, uma forma truculenta de demissão (a pessoa desiste porque acha que seus textos não estão à altura do veículo para o qual está escrevendo – só que isso não cola para quem passou quarenta anos na abril e no estadão... Tiradentes e a inconfidência Esta sobre Tiradentes e a inconfidência me foi encomendada e me deu trabalho: comprei três livros para escrevê-la e foi rejeitada e não foi paga pelo editor josé maria dos santos sob alegação de que “os leitores do diário do comércio não vão gostar disso”.... Eu me pergunto até hoje: os leitores do diáriodo comercio não vão gostar do quê? Fiz a
  • 20. matéria orientado por professores da cátedra Jaime Cortesão do depto de historia da usp e para isso resenhei os três livros mais importantes sobre o assunto que haviam sido publicados nos últimos vinte anos... Que tipo de leitor não gosta de história???? https://www.slideshare.net/MarcosGomes28/tiradentes-e- inconfidentes Sotaques da cidade de São Paulo Outra matéria rejeitada,a última, depois da qual não me procuraram e eu não mais os procurei https://www.slideshare.net/MarcosGomes28/sotaques #JornalismoIdeologico #DiarioDoComercio #DemissãoTruculenta